Valter Hugo Mãe

Festivais de Verão


Como envelheci, estou atirado para festivais que se mantiveram marginais e sem ganas de crescer para lá de sua essência. Quero dizer, vale Vilar de Mouros, ou o ExtraMuralhas, que, com mais ou menos gente, lembram sua identidade e existem por sua identidade, sem procurar mais público do que aquele que ouça rock ou música gótica. É como ir aos ciclos da Gulbenkian e esperar ouvir Brahms, e não um hipoper a samplar os Beatles dizendo que se o Bach estivesse vivo ele ia ser o Jay-Z, coisa que tem tanto sentido quanto debater os gambozinos.

Entristece-me que se inventem as coisas e se passe a vida a subvertê-las para que evoluam nos tempos, acolhendo as novas gerações com suas linguagens. Sinto que as novas gerações também precisam de ser confrontadas com outras estéticas e convicções, nem que para isso os festivais, ao invés de aumentarem aparatosamente, diminuam ao tamanho de sua genuinidade. Se corrêssemos todos atrás da multidão, não se tocaria mais um madrigal, não teria vindo Andreas Scholl à Póvoa de Varzim, os Criatura não teriam tido tempo de mostrar que são a melhor banda portuguesa do momento. Prefiro que corramos por aquilo que nos é inevitável, aquilo que nos arrebata, independentemente de haver consensos ou fortunas para ganhar.

Vejo em cada canto, aqui ao menos nas autarquias nortenhas, a folia pelos concertos grátis com os cantores ligeiros da nação. Um sem-fim de baladeiros e curtidos com bailarinas pouco vestidas que animam o povo como o povo parece gostar. Se deixarmos que seja esse o critério para a construção de um evento, então a fórmula está mais do que revelada. A maioria teria sempre razão, nem que uma razão sem muito gosto nem muita arte.

Não quero deixar de saber quem são as novas bandas, o que há de interessante a acontecer nos mais novos, porque essa foi sempre a minha natureza. Importa-me a música, importa-me mais música. O que me desilude é o jeito de rasurar por completo a presença de grandes músicos no cenário dominante porque eventualmente os jovens de 18 anos não sabem quem são. Lembra-me a deprimente declaração de James Blake quando afirmou não conhecer Nick Cave, encabeçando um cartaz com ele. A solução perante esta ignorância não pode ser tirar o Nick Cave dos cartazes, até porque ele, sim, granjeia uma verdadeira multidão, coisa que o Blake talvez não consiga por mais de uns poucos anos. A solução tem de ser manter com dignidade o espaço dos que acreditaram que um determinado festival foi feito para eles, ao invés de lhes ser roubado para se tornar um evento pop com ligeiros arrufos de rebeldia bacoca, sem causa e sem efeito.