Andar a pé é meio caminho para ter saúde

Preferencialmente, a caminhada deva ser realizada na Natureza, especialmente para tirar o máximo proveito para a saúde mental

Serão poucas as funções, os órgãos e as partes do corpo que não são positivamente afetadas pela caminhada. Recomendada a (quase) todos e com benefícios em (quase) tudo, há regras a seguir para iniciar esta arma contra múltiplas doenças.

Melhora a circulação arterial – há estudos que comprovam que 40 minutos de caminhada são o suficiente para conseguir baixar a tensão arterial nas 24 horas que se seguem. Ter uns pulmões mais “eficientes”. Combate a osteoporose, já que é responsável por aumentar o cálcio nos ossos e, por consequência, aumenta a resistência dos mesmos. É uma das formas de combater a depressão, principalmente por levar à libertação de endorfina, que é responsável pela sensação de bem-estar. Em geral, deixa o cérebro mais saudável. Diminuiu a sensação de sonolência e leva a que o descanso seja mais reparador, uma vez que, cansando-se mais durante o dia, o corpo obtém uma qualidade do sono melhor. Ajuda na perda de peso corporal, provocando um gasto calórico significativo. Faz parte da prevenção da diabetes, pois estimula a libertação de insulina, que leva a baixar a glicose do sangue.

Esta poderia ser a lista de benefícios que complexos movimentos e tempo prolongado em exercício físico e esforço podem ter para o nosso corpo, mas não. Trata-se de algo mais simples. São os pontos positivos de praticar um dos movimentos mais simples (e ainda assim complexos, por afetarem tantas partes do corpo) que o ser humano pode fazer: a caminhada. Andar a pé é, de forma unânime para a Ciência e para a Medicina, o melhor e mais abrangente exercício. Quem começa por nos fazer a extensa apresentação ao “santo” movimento é Ricardo Bastos, ortopedista.

Mas não é o único. O especialista em medicina geral e familiar Daniel Bertoluci Brito reproduz todos os benefícios referidos. “A caminhada como exercício físico diário tem enormes benefícios e está implementado em todas as ‘guidelines’ de instituições de saúde nacionais e internacionais.” Mas quanto tempo de caminhada é considerado exercício físico? “Deve ser feito de forma regular e diária, entre 30 a 50 minutos, em intensidade moderada.”

Isto, explica Daniel Brito, “para além do exercício físico de intensidade superior, de fortalecimento muscular, que deve ser executada de forma mais esporádica”. A caminhada é, aliás, o elemento básico da redução do sedentarismo, que, assinala o médico da Clínica Espregueira, tem sido assinalada por diversos estudos como estando a aumentar em todo o Mundo.

Avaliação prévia

Mas não é por ser simples e recomendado a quase todos (já lá vamos) que deve ser feito com displicência. “Antes de praticar a atividade física, deve procurar fazer-se uma avaliação médica, especialmente aqueles que têm uma vida sedentária e querem, agora, começar a mover-se”, refere Ricardo Bastos, ortopedista na cidade do Porto. “É necessário avaliar o sistema cardiorrespiratório antes de iniciar uma rotina de exercício, bem como se deve conversar com o médico ou especialista em desporto sobre as orientações a seguir, para evitar lesões e estar atento a sinais de alarme.”

Referia-se há pouco que a caminhada é o exercício físico recomendado a (quase) todos. Esse “quase” exclui, adianta o ortopedista, pessoas com problemas osteoarticulares, por exemplo. “Essas pessoas devem procurar outro tipo de exercício, como movimento na água, bicicleta ergométrica ou elíptica, para evitar provocar trauma repetitivo (o que acontece na caminhada).” Este não será o único grupo de pessoas com limitações à deslocação a pé com maior intensidade. Também os casos de pessoas com uma saúde tendencialmente mais débil devem ser “aprovados” medicamente para estar aptos para começar com as caminhadas.

Mas, afinal, caminhar, um movimento em esforço e focado com o objetivo de praticar exercício físico, é o mesmo que andar a pé no dia a dia, nas deslocações para casa, para o trabalho ou para as compras? Os especialistas são unânimes: o tipo de caminhada praticada de forma desportiva ou em lazer são diferentes, com intensidades e benefícios diferentes, mas, no final, afirma Daniel Brito, “todos os passos que damos contam para uma vida mais saudável e longa”.

Estes dois movimentos, os mais casuais e os mais intensos, devem ser “feitos em conjunto”, devendo aliar-se uma vida “mais movimentada nas tarefas diárias” com um momento “destinado exclusivamente à caminhada de intensidade moderada”, continua o médico.

Casual ou desportiva?

“São ambas consideradas caminhadas, mas de tipos diferentes.” Daniel Brito vê com bons olhos que o máximo de deslocações diárias possível seja feito a pé, já que é “uma das principais coisas que podemos mudar no nosso dia a dia e que tem benefícios comprovados, limitando o sedentarismo dos nossos empregos e atividades”.

Ainda assim, a caminhada que se faz a ir para o trabalho ou para realizar algum recado é “mais lenta e em curtos períodos”, o que leva a que não traga os mesmos benefícios que uma caminhada desportiva. Em conclusão, andar a pé deve ser a prioridade em qualquer deslocação, adicionando a isso um período diário para uma caminhada mais intensa destinada somente ao exercício físico.

Para o médico Daniel Brito, a mistura entre uma caminhada casual e uma caminhada desportiva começa, sobretudo, na obsessão pelo considerado “número sagrado”: dez mil passos por dia. “Assoberbados com os smartwatches e todas as tecnologia disponíveis hoje em dia, ficamos presos a valores que, na verdade, dizem muito pouco sobre o exercício físico que cada um, individualmente, realiza.”

O especialista em medicina geral e familiar esclarece que o valor dos dez mil passos, amplamente divulgado há uns anos através das redes sociais, “tem sido questionado, já que existem diversas variáveis”. Tipo de passada, distância, esforço físico, velocidade, inclinação do piso são alguns dos parâmetros que as tecnologias não têm em conta quando, ao fim do dia, apresentam ao utilizador um determinado número.

Tempo e não distância

“O valor fixo de passos tem sido muito discutido e muitas organizações já não recomendam esta forma de medição, sendo preferível ter em atenção a duração da caminhada.” Portanto, não esquecer: entre 30 a 50 minutos diários de caminhada de intensidade moderada.

Para a personal trainer Marta Silva, a caminhada é uma das recomendações “mais latas”. “Recomendo-o a todos os meus clientes.” Especialmente àquelas pessoas que “não adoram praticar exercício físico de forma isolada, como treinos no ginásio ou até em casa”. A caminhada, explica a treinadora, é a forma de praticar exercício físico “quase sem notá-lo”. Também Marta Silva salienta que, nas deslocações diárias, é possível “compensar com andar a pé”, mas dedicar tempo a uma caminhada é igualmente importante.

Quanto aos benefícios, a história repete-se sempre que se questiona algum profissional. “A caminhada diária é um exercício que pode ser benéfico para quase todas as pessoas, independentemente da idade ou do nível de condicionamento físico”, diz Marta. “No entanto, é especialmente recomendada para pessoas que estão a iniciar uma vida mais ativa, a iniciar a prática de exercício físico ou para pessoas idosas ou que têm problemas de saúde crónicos ou lesões.” Com orientação e intensidade controlada, a caminhada é adaptável a qualquer circunstância.

A saúde da natureza

Já percebemos que deslocar-se a pé em lazer ou caminhar por desporto tem diferentes impactos na saúde (ainda que ambos tenham importância), mas e o local onde o fazemos, também importa? Ricardo Bastos afirma que sim. Ainda que haja sempre benefício, “caminhar na Natureza é melhor”. “Na cidade temos, em primeiro lugar, o problema da poluição, pois vamos respirar um ar menos puro devido ao fumo dos carros, das fábricas ou outros e, além disso, a azáfama à nossa volta irá levar a que a caminhada seja feita num contexto de stresse, com diversos ruídos, por exemplo.”

Por isso, é inegável que, preferencialmente, a caminhada deva ser realizada na Natureza, especialmente para tirar o máximo proveito para a saúde mental.

Já sabemos onde fazer e quem pode fazer. Mas é também preciso saber os riscos e os cuidados a ter. O ortopedista evidencia que, geralmente, “as lesões associadas ao movimento de andar a pé são as lesões musculoesqueléticas, como inflamações, tendinites, mialgias, lesões musculares, entre outras”. E há que anotar: “qualquer tipo de dor deve ser motivo para procurar o atendimento médico”, frisa Ricardo Bastos.

A treinadora Marta Silva reforça a necessidade de “estudar” os cuidados a ter, antes e após a caminhada, “de forma a evitar lesões e garantir que o nosso corpo obtém todos os benefícios para a saúde”. Além da já referida consulta prévia com o médico, a personal trainer aconselha a que se inicie devagar, “com sessões curtas e aumentando gradualmente a duração e a intensidade”.

Outro elemento a ter em conta é o calçado, que deve ser apropriado, confortável e que ofereça o suporte adequado. “Escolha sapatilhas com um bom amortecimento e uma sola antiderrapante para evitar quedas.” Há ainda que ter em atenção a postura adequada a manter durante a caminhada, “uma postura neutra com ombros para trás, peito para fora e olhar em frente”.

O papel do médico

A hidratação é também referida por Marta Silva como preponderante. Por fim, “aquecer e alongar”: “Deve fazer-se alguns minutos de aquecimento e alongamento antes e depois da caminhada, pois ajudará a evitar lesões e a preparar o corpo”.

Como especialista em medicina geral e familiar, Daniel Brito salienta a importância dos cuidados de saúde primários na vida ativa da sociedade. “Temos um papel importante na promoção de saúde, principalmente a nível da atividade física.” O médico sublinha tentar abordar com mais frequência o tema do movimento ativo e dos benefícios a “nível físico, psicológico e social”.

E ainda refere programas e projetos desenvolvidos pela sua área de especialidade, como o “Walk With a Doc”, em que, em vários pontos do Mundo, “existe, em determinados dias, uma caminhada com um médico, uma sessão de educação para a saúde e espaço para dúvidas”. Em Portugal, a atividade está disponível em Lisboa.

Como resumo da “matéria dada”, Daniel Brito considera fundamental reforçar os benefícios a longo prazo. “É certo que uma população ativa é sinónimo de uma população saudável, por isso, se incutirmos a ideia de movimento agora, iremos colher, no futuro, benefícios, como uma sociedade com menos doenças e mais qualidade de vida.” E, numa população em envelhecimento, exercitar agora é preparar o amanhã.

Precauções e cuidados com a caminhada:

  • Fazer uma consulta prévia com um médico para avaliar o estado de saúde;
  • Procurar aconselhamento, com um personal trainer ou especialista, sobre o tipo de caminhada, intensidade e tempo a realizar;
  • Começar devagar, aumentando as métricas e definindo objetivos;
  • Ter calçado adequado;
  • Manter uma postura adequada;
  • Hidratar-se constantemente;
  • Aquecer e alongar, antes e depois do exercício.