Margarida Rebelo Pinto

A Geração X falhou?


Rubrica "A vida como ela é", de Margarida Rebelo Pinto.

Se ainda se lembra do barulho do disco do telefone fixo a contrariar o sentido dos ponteiros do relógio, das reuniões de mães em volta de jogos completos de Tupperware, se assistiu às séries “Bonanza”, “Os Anjos de Charlie”, “Dallas” e “Casa na Pradaria”, se foi ao Império maravilhar-se com as façanhas da Pipi, a sueca sardenta das meias altas, então faz parte da Geração X. A minha preferida era “Casei Com uma Feiticeira” porque a protagonista conseguia tudo o que queria quando torcia o nariz, mania que ganhei desde miúda, embora nem sempre consiga tudo o que quero, o que nunca me impediu de tentar sempre, sempre, até conseguir quase sempre.

Na Geração X existiu um otimismo, uma vontade de vencer, uma capacidade de sonhar, uma resistência à frustração e uma determinação em realizar os sonhos que não voltei a testemunhar nas gerações seguintes. Nós acreditávamos que íamos conseguir tudo, que o Mundo iria sempre evoluir para melhor, que a medicina podia curar todas as doenças, que a paz no Mundo seria conquistada pelo diálogo e pela tolerância. Assistimos aos esforços incansáveis de Shimon Peres para alcançar o entendimento possível no Médio Oriente, vimos Arafat apertar a mão a Yitzhak Rabin nos Acordos de Paz de Oslo. Foi em 1993. Trinta anos depois, o que aconteceu ao Mundo?

A Geração X assistiu à transição em Portugal de uma ditadura para uma democracia, à queda do Muro de Berlim, à construção da Comunidade Europeia, à chegada da televisão a cores e da internet. No início, pensámos que a mágica web seria uma infinita ferramenta de aprendizagem que iria expandir o nosso conhecimento. Trocámos a máquina de escrever pelo computador e o fax pelo email. Mas ainda tirávamos fotografias que mandávamos revelar na loja de fotografia do bairro. Tínhamos de esperar vários dias pela revelação, tínhamos de esperar para quase tudo: para participar nas conversas à mesa, para ir beber um café com um rapaz, para sair à noite com os amigos. A idade era um estatuto e as senhoras de 40 anos usavam roupas clássicas, penteados armados e curtos e pareciam-nos velhas, ou pelo menos maduras. Colecionávamos os nossos filmes preferidos em VHS e depois em DVD. À noite ouvíamos o Oceano Pacifico e colecionávamos CD. Hoje olho para a minha coleção de CD e penso, o que vou fazer a estas relíquias? Quando ligo o Spotify, não resisto ao charme barato das Playlists, até que amigo melómano me questionou: porque não respeitar a vontade do artista que fez um álbum pensado da primeira à última música? Ou será que eu também gostava que as pessoas lessem parágrafos avulso da obra, misturados por um algoritmo que se está nas tintas para a minha vontade? Parágrafos misturados, a ideia ficou a pairar como uma nuvem.

O Mundo está muito misturado. As pessoas confundem ver com ler, verdade com ficção e factos com opiniões. A lealdade tribal proliferada através das redes sociais é uma das grandes ameaças à democracia decorrente da alteração de um paradigma fundamental: a discussão não ocorre com base num facto que gera opiniões divergentes, cada fação cria os seus factos. O caos reina nas ideias, na política, na economia, na família e na sociedade. Pergunto-me como e quando a Geração X, idealista e tolerante, que acreditou ser invencível, falhou em criar um Mundo melhor.