Aquela dor no peito? O músculo cardíaco pode estar a morrer

O enfarte do miocárdio resulta da interrupção do fluxo de sangue para o coração com consequente morte do tecido não irrigado. Todos os anos, morrem cerca de 31 mil pessoas por doenças cardiovasculares, a principal causa de morte no nosso país.

Enfarte significa morte de células e o miocárdio é o músculo cardíaco. Um enfarte do miocárdio é uma situação clínica caracterizada pela morte de músculo cardíaco. “Como o miocárdio é responsável pela contratilidade do coração, e é essa contratilidade que permite a circulação do sangue que leva a todos os órgãos do corpo oxigénio e nutrientes essenciais para o seu funcionamento, depreende-se que um enfarte que atinja uma grande porção do músculo cardíaco pode ter consequências gravíssimas como a morte ou a insuficiência cardíaca”, adianta o presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, Victor Gil.

A morte de células cardíacas ocorre em consequência de obstrução das artérias coronárias que levam sangue, com oxigénio e nutrientes, ao músculo cardíaco. E a causa mais comum para esse bloqueio chama-se aterosclerose, ou seja, a acumulação de gordura sanguínea nas paredes das artérias, que impedem a passagem do sangue e a irrigação do coração e do cérebro.

“A aterosclerose é uma situação em que há uma inflamação crónica com deposição de colesterol na parede das artérias, criando obstrução progressiva que chegando a determinado ponto pode dar sintomas que inicialmente surgem após esforços (dor vulgarmente designada por angina de peito). As placas ateroscleróticas presentes na parede das artérias coronárias podem romper-se, o que provoca a formação de um coágulo (a que se chama ‘trombo’) que vai ocluir a artéria, provocando então o enfarte do miocárdio”, refere o especialista. E o que gera a aterosclerose? A hipertensão arterial, o colesterol elevado, o tabaco, a diabetes, o sedentarismo, a obesidade e o stresse.

A hipertensão arterial, o tabaco, a diabetes e a inflamação crónica estão na origem da aterosclerose

O enfarte do miocárdio é uma situação aguda, geralmente caracterizada por uma dor opressiva no meio do peito ou à esquerda do esterno. Uma opressão ou um peso que duram mais de 20 minutos e que, por vezes, espalham-se pelo pescoço, maxilares, ombro, braço (geralmente do lado esquerdo) ou dorso. Essa opressão pode ser acompanhada por náuseas, suores frios, sensação de desmaio ou falta de ar.

Segundo Victor Gil, os doentes descrevem frequentemente o enfarte como uma dor “diferente de todas as outras.” “Os sintomas podem não ser constantes e progressivos mas intermitentes, o que leva, muitas vezes, o doente a protelar o pedido de ajuda e que pode ter consequências graves, pois, à medida que o tempo passa, a zona afetada aumenta, aumentando correspondentemente a área de músculo que se perde”, avisa.

O excesso de peso e a falta de exercício físico são alguns dos principais fatores de risco para o enfarte do miocárdio

Qualquer sintoma e não há tempo a perder. Em caso de suspeita, nada de ir a conduzir para o hospital, nem sequer pedir boleia, chamar um táxi ou ir ao centro de saúde. Nada disso. Deve ligar-se de imediato o 112, que ativa o sistema “via verde coronária”. Convém não esquecer que na fase inicial do enfarte podem existir arritmias potencialmente malignas e que podem provocar a morte se não forem imediatamente tratadas.

O 112 ativa a ajuda especializada e articulada com as unidades de cardiologia de intervenção, onde será possível fazer a desobstrução mecânica da artéria coronária. E como isso é feito? Através de um cateter, um tubo pequeno, que é introduzido por uma artéria no punho ou na virilha, pelo qual passa um fio muito fino que atravessa a obstrução e dá suporte a um balão que abre a artéria, e onde depois se coloca um pequeno cilindro de malha metálica que impede a artéria de voltar a fechar.

“Após enfarte os doentes não ficam curados e é necessário cuidar da artéria tratada (tomando fármacos que impedem a formação de novos trombos), bem como tratar agressivamente os fatores de risco que estiveram na origem do enfarte. E a verdade é que, embora pareça estranho, os doentes esquecem-se com o tempo e, como tudo correu bem daquela vez, não pensam que pode não ser assim numa próxima. E, assim, há uma elevada taxa de abandono de terapêuticas essenciais, muitos doentes voltam a fumar e, mesmo quando tratados, não são cumpridos os alvos terapêuticos recomendados pelas organizações científicas”, sublinha o presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.

Nestes casos, o que se recomenda está escrito e devidamente validado cientificamente. Ter o colesterol regulado, tensão e diabetes controladas, praticar exercício físico moderado todos os dias, manter o peso dentro dos limites recomendados, controlar a ansiedade e o stresse. Tudo isso para evitar que o músculo cardíaco morra sem aviso.