Querida filha,
Obrigado pelo teu e‑mail e pelas tuas preciosas dicas de relacionamentos sociais no século XXI. Devo dizer‑te, porém, que o teu velho pai – apesar de me chamares cota enxuto – não ficou propriamente parado na Revolução Industrial. E ainda consegue perceber algumas coisas destes tempos.
Eu posso estar destreinado de engates e conquistas, mas acho que ainda consigo distinguir uma mulher que veja em mim a última hipótese para casar para a vida e um one night stand. Não só porque a maior parte das mulheres que eu conheço não quer um homem para a vida, mas também porque o teu pai ainda sabe ter one night stands.
Não tos vou contar, está descansada. Presumo que seja informação que dispenses bem. Quando ocorrerem – e desde que me separei da tua mãe e saí de casa já ocorreram – tu não vais saber. E não, não corres o risco de te cruzares com alguém cá em casa.
Quando conheceres uma namorada do pai, terá esse título: namorada. Com tudo o que isso implica. Até lá chegar, talvez conheças uma ou outra amiga, mas não são coisas sérias. Boas amizades, sim. Talvez coloridas. Mas só saberás o essencial.
Decidi que não quero o Instagram para nada. Pode ser uma ferramenta simpática para partilhar fotografias de pratos de comida ou os ténis novos que levo para o ginásio, mas para a utilização que eu dou a uma rede social o Facebook é que me serve. Encontro os amigos antigos do liceu, faço grupos com a malta do futebol, procuro antigas namoradas e vejo se estão giras e desdentadas ou casadas com gajos gordos e com mau aspeto. E tento perceber pela atividade delas se estão separadas ou não.
O Instagram é mais difícil para entender essas nuances. E olha, quanto às definições de privacidade, podes respirar fundo. Eu ainda consigo perceber quando estou a mandar uma mensagem privada para alguém ou a fazer um post público de uma foto todo nu (apanhei‑te! Era só para captar a tua atenção. Nunca se envia fotos de nudez para ninguém, seja quem for. Tu não fazes isso, pois não? Garante‑me que não fazes ou vamos ter chatices!).
Quero ver é se percebo melhor aquilo do Tinder. Uma data de amigos meus têm, uns com perfis falsos para as mulheres não os apanharem, outros – os separados – com fotografias que os favorecem. Já descarreguei a aplicação, já a apaguei porque precisava de espaço, já voltei a descarregar porque o tio tem e farta‑se de arranjar encontros e cafés e jantares com amigas, alguns dos quais resultam em noites tórridas. Não sei, não estou convencido.
Há, porém, uma coisa em que preciso da tua ajuda. Preciso de ir comprar roupa e quero uma opinião feminina isenta. Há dias fui comprar umas calças de ganga e o vendedor convenceu‑me a levar uns skinny jeans. Aos 52 anos, pela primeira vez na vida, comprei umas calças que parecem uns collants.
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É o que sinto com aquilo. Cola‑se às pernas, ao rabo, às virilhas, a todo o lado. E aperta‑me uma zona do corpo que eu quero à vontade. Tenho sempre a sensação de que pareço um bailarino quando ando na rua com aquilo. Não sei se consigo ser tão moderno, filha.
Agora que sou um homem divorciado, não vou ter uma crise de meia-idade e comprar um descapotável (não há dinheiro para isso) nem deixar crescer o cabelo (ficaria apenas ridículo) ou começar a praticar um desporto para o qual não tenho cabedal nem condição física. Mas gostava de umas roupas menos formais. Sem parecer um velho a vestir‑se como um miúdo de 16 anos.
Ah, mais uma coisa: quando me vires mais cabisbaixo ou menos falador, mais introspetivo ou metido com os meus botões, não te preocupes: faz parte desta fase. Estou contente com o passo que eu e a tua mãe demos, mas 25 anos de casamento levam o seu tempo a arrumar. Faz tudo parte, filha. Está tudo bem.