A líder do CDS apareceu de joelhos à mostra num vestido com kiwis. E então? Se calhar é disso mesmo que estamos a precisar.
Assunção Cristas tem joelhos e mostrou-os numa foto recente, encostada ao corrimão do miradouro de São Pedro de Alcântara, em Lisboa. A líder do CDS-PP tinha as mãos levantadas, agarrando o corrimão, e o vestido era curto. Da mesma série do de peras, da estilista Katty Xiomara com que a então ministra da Agricultura já dera nas vistas numa festa do Pontal no verão do ano passado.
Nos joelhos de Cristas, e nesse mostrar, todo um programa. A fotografia correu a internet – houve quem dissesse que esse seria o objetivo de quem lhe deu indicações para vestir assim, uma agência de comunicação qualquer. Assim dizia o embaixador Francisco Seixas da Costa, que, no blogue Duas ou Três Coisas, aventava também ser esta «uma fotografia reveladora de uma certa imagem que Cristas procura fazer passar: ousada, firme, insinuante, conservadora moderna.»
Seria? Será? Assunção Cristas dizia num depoimento sobre Hillary Clinton, na NOTÍCIAS MAGAZINE, que não a incomodava nada que as pessoas se focassem nas questões de visual. «Esses comentários são os expetáveis na nossa sociedade, que é muito mais exigente em relação às mulheres – as meninas querem-se bonitas, vaidosas, arranjadas.»
A versão benigna desta história será essa, a de Cristas conhecedora dos meandros e do poder da imagem usando a sua, de joelhos nus num vestido estiloso, para modernizar a do partido – contrapondo o momento de cinzentismo amargo em que o PSD se afundou. Na mesma entrevista, aliás, a líder do CDS anunciava que pode ser candidata à Câmara Municipal de Lisboa. Na altura, ninguém quis saber, mas Marques Mendes, que parece estar atento sobretudo ao que houver à disposição para bater em Passos Coelho, fez dessa frase notícia na SIC, uma semana depois.
A face negra está na forma desbragada como, por esse ciberespaço fora, foram feitas as críticas e piadas, numa linguagem que ia um pouco mais além, como se não houvesse aquela dose de controlo social usada quando as críticas se dirigem a um político, a um homem, por muito exposto que esteja.
Quando vi os joelhos e a pose de Cristas, na foto, pensei: «Estás tramada», e este tratamento coloquial não tem nada de desrespeitoso. A verdade é que, nestas circunstâncias públicas, uma mulher está sempre tramada – já dizia Hillary Clinton a propósito da obsessão do público americano com o seu cabelo ou as cores dos seus fatos. Uma mulher é criticada por mostrar os joelhos, como Cristas, ou por não os mostrar, como Ferreira Leite. Ou é desleixada, se não pinta as unhas, ou é vaidosa, se as pinta de cores garridas.
As piadas, na altura, fizeram-me levantar o sobrolho. A confirmação chegou esta semana, com a notícia de que a liderança de Cristas estaria a ser questionada no partido. Entre os argumentos para o questionamento vinha ele, o vestido dos kiwis, e os joelhos à mostra. Disse o deputado do CDS Raul Almeida ao jornal Público que «há uma gestão da imagem pública da presidente que tem mostrado uma frivolidade que não corresponde à substância que tem».
Talvez para sairmos deste círculo vicioso seja preciso que muitas mais líderes vistam o que lhes apetecer e se apresentem como lhes apetecer. Os joelhos de Cristas? Olhem, amanhem-se!
[Publicado originalmente na edição de 4 de setembro de 2016]