Todo o medo é medo do desconhecido. Todo o medo é falta de resposta a perguntas. O que será de nós? A morte é a maior pergunta que somos capazes de fazer. A própria experiência de existir é colocada em causa pela morte. Faltam palavras para nomear o que não sabemos, falta uma forma concreta para o medo.
Em espaços públicos, são infinitas as oportunidades que um suicida dispõe para assassinar inocentes. Se não nos fecharmos em bunkers, haverá sempre ocasião para qualquer pessoa assassinar qualquer pessoa.
Não podemos instalar máquinas de detetar metais nas entradas da internet. Hoje, a glória a que aspiram já não é um paraíso cheio de virgens, são likes no Facebook, visualizações no YouTube, são câmaras de televisão a repetir o seu nome e a entrevistar os amigos do bairro.
É certo que, a posteriori, os facínoras lá do deserto estão disponíveis para reivindicar qualquer atrocidade, mas parece-me que, mais do que uma ideologia, o terrorismo fundamentalista islâmico deu ao mundo uma nova forma de exprimir frustrações e desesperos diversos, não necessariamente religiosos.
Depois de acontecer, averiguamos o país de origem do criminoso ou da família do criminoso. Na cabeça, levamos uma lista vaga de países que, estamos convencidos, nos tira imediatamente as dúvidas sobre as intenções do que aconteceu. Se gritaram Allahu Akbar, se publicaram alguma frase em árabe na internet, queremos acreditar que já conhecemos a história toda, mas no íntimo sabemos mais do que apenas isso.
As respostas deixaram de ser simples.
Estamos num ponto em que nos faltam as certezas absolutas. Existe o problema, é imenso, parece cobrir tudo e, como sempre acontece nas dificuldades reais e presentes, não deixa espaço para soluções. Depois de tanto horror que ultrapassámos, guerras mundiais e genocídios, parece ser a primeira vez que não sabemos o que fazer. O inimigo não tem rosto, está em toda a parte, pode usar qualquer arma. O que será de nós? O inimigo é o medo, o seu lugar é o medo, a sua arma é o medo.
*medo, em árabe.
(Fotografia de José Luís Peixoto)
[Publicado originalmente na edição de 31 de julho de 2016]