Não era a terapia delirante certa

Notícias Magazine

Um médico alemão, residente no Algarve, prometia curar a diabetes em dez dias com doses elevadas de insulina. Um tratamento inventado, potencialmente perigoso, aliado à convicção de que iria ganhar o Prémio Nobel. No mundo das terapias alternativas é um dia igual aos outros. Mas o alemão teve azar: na sequência de perícias psiquiátricas, em julho, o Tribunal da Relação de Évora deu ordem para que fosse internado compulsivamente. Decisão justificável perante o risco para os doentes e a sua recusa em aceitar ser tratado. Mas compreendo que o alemão se pergunte: porquê eu?

Afinal, as terapias alternativas também oferecem tratamentos perigosos sem qualquer fundamento. Por exemplo, os remédios homeopáticos, que são preparados a partir de qualquer coisa (desde abelhas esmagadas a leite de cadela ou cicuta) através de um grande número de diluições seguidas, de tal modo que no final não sobra nada, e que em ensaios clínicos sérios não funcionam melhor do que comprimidos de açúcar, não só se têm esquivado à camisa de forças como gozam de uma considerável respeitabilidade. O acesso à profissão de homeopata está regulamentado em Portugal desde outubro de 2014, estando prevista a emissão de cédulas profissionais pela Administração Central do Sistema de Saúde. Mas tomar remédios que se acredita terem um efeito terapêutico que não têm pode ser perigoso. Que o diga o missionário
norte-americano Tom Miller, que, em 2004, antes de viajar para a Nigéria, abdicou da profilaxia habitual para a malária e tomou um produto homeopático. Sem nenhuma proteção efetiva, acabou nos cuidados intensivos, inconsciente durante sete dias. Sobreviveu, mas não graças à homeopatia. O mesmo risco se aplica às «vacinas alternativas», que nenhuma imunidade conferem mas que são frequentemente propostas por terapeutas alternativos. Veja-se o caso trágico do menino de 6 anos que morreu com difteria em maio do ano passado em Barcelona. Foi o primeiro caso em Espanha desde 1986. Os pais, envolvidos no movimento antivacinas, tinham decidido não vacinar a criança. Ou a lamentável saga da naturopata norte-americana Heather Dexter que em outubro deixou os seus filhos sofrerem com tosse convulsa, recusando-lhes o tratamento com antibióticos. Desde Junho estão definidos por lei em Portugal os requisitos para as licenciaturas em naturopatia.

Ao alemão faltou um trabalho de fundo que lhe inventasse credibilidade. Com isso, talvez acabasse certificado em vez de internado.

Periscópio

CURTIR CIÊNCIA EM GUIMARÃES
Um robô que resolve um cubo mágico em dois minutos e outro que joga golfe são dois dos vários que podem ser encontrados no mais recente centro da rede Ciência Viva, em Guimarães. Instalado na antiga Fábrica Âncora, na zona de Couros, recebeu o nome Curtir Ciência, numa alusão à indústria dos curtumes. O visitante poderá ficar a saber mais sobre essa antiga atividade local, mas também acerca de robótica, eletrónica, realidades virtuais, engenharia e reciclagem, através de cerca de 20 módulos expositivos. Por exemplo, tem a possibilidade de experimentar as dificuldades de conduzir um veículo na Lua. E se entrar no centro com uma garrafa de água, pode sair com um porta-chaves feito de plástico reciclado de garrafas de água e a perceber como isso se faz.

[Publicado originalmente na edição de 10 de janeiro de 2016]