Jacques Rodrigues: simplesmente Maria

Jacques Rodrigues é empresário

Houve quem abandonasse as reuniões “em lágrimas”, porém, perante as humilhações, “ouvia-se e calava-se”. Poucos foram os diretores que bateram com a porta. Com a quarta classe tirada na Casa Pia, “cresceu a pulso, e há nele, de facto, um certo dom de Midas”. Convencido de que é um visionário, sobretudo na chamada imprensa cor-de-rosa.

“Nunca desilude. É sempre igual a si próprio.” Descrevem um homem de trato difícil, bruto, de gesto impetuoso e fúria fácil. Recordam o dono do grupo Impala “a rebaixar” os diretores editoriais, na reunião semanal. Lembram o embaraço sentido quando o viram arremessar um molho de revistas em direção de um dos diretores sentados à mesa – “você anda a brincar com o meu dinheiro”. E a caricata semana em que reprovou “mais de 20 capas” da “Focus”, newsmagazine fundada em 1990, descontente com o grafismo. Sempre puxando dos galões, os anos em que fora tipógrafo, em Lisboa, e paginador, em Angola. No mais, “o autoritarismo correspondia à ignorância”.

Houve quem abandonasse as reuniões “em lágrimas”, porém, perante as humilhações, “ouvia-se e calava-se”. Poucos foram os diretores que bateram com a porta. De resto, na “Focus”, para 13 anos de revista sobram chefias. Despedidos não por divergências quanto ao conteúdo editorial, “pressão que nunca fez”, apesar de alguns ódios de estimação (“Marcelo Rebelo de Sousa, por exemplo, figura que não queria nem na capa da ‘Nova Gente’”), mas por questões comerciais.

Essa é matéria em que até os detratores, dispostos a falar, mas sob anonimato, lhe reconhecem algum talento. Com a quarta classe tirada na Casa Pia, “cresceu a pulso, e há nele, de facto, um certo dom de Midas”. Convencido de que é um visionário, sobretudo na chamada imprensa cor-de-rosa, mandou afixar em cartaz uma frase muitas vezes repetida: “Somos tão bons que até as imitações são boas”. Principal filão, sobretudo devido às cartas dos leitores, a revista “Maria” (1978) chegou a ultrapassar os 300 mil exemplares vendidos por semana. “Pusemos as donas de casa a falar de sexo”, gabava-se. A “TV 7dias”, com números muito próximos, e a “Nova Gente”, a rondar vendas semanais de 100 mil exemplares, ajudavam a lucros que lhe permitiram o luxo de ser um dos fundadores da SIC, com 6,75% do canal.

O ego “enorme” está refletido na opulenta decoração “africana” da casa da Quinta da Marinha, e em duas impalas douradas, perto do tamanho natural, que ladeiam a porta do gabinete nas instalações de Ranholas (Sintra). “É duro e autoritário”, diz o fotógrafo Abel Dias, “mas também é capaz de passar da fúria à lágrima em pouco tempo”. E, sobretudo, “é um pinga-amor. E a prova está aí”. Nove filhos de quatro relacionamentos. Três deles – Paula Rodrigues, de 57 anos, braço-direito a quem sempre tratou por dona Paula, Jacques Júnior, de 38 anos, o suposto sucessor, e Cláudio, filho da atual namorada, Maria José, de 47 anos, gerente, acionista e diretora de marketing – são arguidos, tal como o pai, detido por suspeitas de corrupção, insolvência danosa agravada, burla qualificada e falsificação de documentos. Desvios de milhares de euros para contas no estrangeiro.

Saiu em liberdade, depois de pagar uma caução de meio milhão de euros, o homem que promoveu vários despedimentos coletivos, e deve milhares de euros a jornalistas e funcionários da Impala em salários e indemnizações. Que em reuniões afirmou “eu agora só como sopa” e “cozinho para toda a semana para poupar gás”.

Dele, em jovem, há quem recorde “um miúdo muito trabalhador, um bom operário”. “Um pai de família jovem e esforçado.” Sempre muito discreto. “Só muito a custo conseguia que fosse a jantares que eu organizava, nos primeiros anos da ‘Nova Gente’, eventos que rendiam prestígio e leitores.” Não dá entrevistas. Nos últimos anos começou a deixar-se fotografar nos prémios anuais de televisão que organiza. “É só para fazer a vontade à namorada”, diz quem o conhece. Zeza é uma das poucas pessoas que ouve.

Jacques da Conceição Rodrigues
Cargo:
empresário
Nascimento:
02/04/1940 (83 anos)
Nacionalidade:
Portuguesa (Pombal)