Do mar à mesa. Cuidados a ter com o marisco

Uma regra importante é manter a cadeia de frio entre a compra e a preparação

Sabia que um lavagante ou uma sapateira se compram vivos? E que as ostras não devem estar à mesa à temperatura ambiente? Mais: será que podemos guardar as sobras para o dia seguinte? Os frutos do mar requerem muita atenção.

É sabido que os portugueses são amantes de marisco e o verão é a época áurea das mariscadas em casa, das mesas postas com amigos e família, que se prolongam por horas intermináveis. Só que os frutos do mar são produtos muito perecíveis, com muitos riscos. Por isso, e antes de irmos aos detalhes, vamos às regras básicas e genéricas. Há uma de ouro na hora de comprar qualquer marisco: a frescura. E quando se fala em frescura fala-se dos locais de compra. “Por exemplo, se vou comprar amêijoas ou mexilhões é mesmo importante que sejam de fornecedores certificados, para garantir que foram depurados, que todos os procedimentos da apanha até à venda foram cumpridos. O facto de ter aquele ar muito fresco, quando se compra na praia, por ter sido apanhado na hora, nem sempre significa que é seguro. Pode ter sido apanhado em águas contaminadas (daí, muitas vezes, a proibição temporária da apanha), não ter sido devidamente tratado.” Aliás, há pessoas que gostam de apanhar o mexilhão e isso “é uma prática de risco”.

O alerta é de Paula Teixeira, docente da Escola Superior de Biotecnologia e investigadora do Centro de Biotecnologia e Química Fina da Universidade Católica no Porto, que faz investigação sobre segurança alimentar nas casas dos portugueses. Na verdade, um local de confiança, aponta Alexandre Silva, chef e dono do restaurante Loco (detentor de uma estrela Michelin desde o ano de abertura), “normalmente é a peixaria que encontramos nos mercados que compra o produto certificado”.

Outra regra importante é manter a cadeia de frio entre a compra e a preparação. E, atenção, o marisco deve ser cozinhado logo no próprio dia. Uma vez à mesa, o ideal é não deixar estender muito para lá das duas horas à temperatura ambiente. Sim, uma tarde inteira é demasiado. Então e como saber se o marisco está estragado? Pela textura e pelo cheiro. “Os percebes começam a ficar com aquela resina, aquela langonha ao toque e aí mais vale nem olhar mais para eles. Tudo o que é crustáceo fica com um cheiro fétido e isso pode acontecer muito rápido, em 24 horas. É preciso muita atenção e cuidado. A textura e o aroma são bons indicadores”, avisa Alexandre Silva.

Do lavagante à sapateira

Vamos, então, ao pormenor. Comecemos por tudo o que são caranguejos, desde o lavagante à sapateira. “No marisco vivo, o importante é que esteja realmente vivo na hora da compra. Um marisco entra em decomposição muito rapidamente, não é à toa que as grandes marisqueiras têm todas tanques com o marisco vivo, de onde vão tirando conforme precisam de cozinhar. É muito importante cozinhar um lavagante ou uma sapateira vivos. Aconselho a comprar e a cozinhar no imediato. A cada hora que passa perde qualidade”, explica o chef. E como saber se está vivo? Nos caranguejos é fácil. “Mesmo que não se mexam, entre os olhos e a boca têm dois pelinhos que estão sempre a mexer, eles respiram por aí. Depois, vê-se pela firmeza. No lavagante, basta agarrá-lo pelo dorso e levantá-lo, se pendurar as patas para baixo está morto. Se assanhar as pinças para cima, está vivo.”

Depois de cozinhado e havendo sobras, Alexandre Silva não é adepto de congelar, a não ser que se queira aproveitar mais tarde para “um fundo de uma sopa, de um arroz, de um estufado ou de uma caldeirada”. “A congelação faz com que as coisas percam textura, principalmente as que já estão cozinhadas. E as casas não têm condições para congelar como deveria de ser. O melhor é todo o marisco cozinhado que não for consumido hoje, guardar no frigorífico e consumir logo amanhã.”

Das ostras aos camarões

Para saber se as ostras estão vivas basta abrir e espremer limão ou tocá-las com uma faca, estando vivas vão contrair. Mas, neste caso, isso nem sempre quer dizer alguma coisa. Podem estar vivas e ter algum microrganismo absorvido nas águas que pode dar origem a uma intoxicação grave. Como são comidas vivas, refere Alexandre Silva, é “muito difícil controlar”. O único caminho é comprar sempre em sítios certificados. A par disso, por não serem cozinhadas, não é aconselhável ficarem à mesa, ao calor, o melhor é estarem num local fresco, com gelo – as grandes intoxicações de marisco vêm quase sempre das ostras.

Quanto aos camarões, normalmente o que compramos é congelado, vem de Moçambique ou da Ásia. A não ser que tenhamos a sorte de comprar camarão português vivo. Aí, “ou agarramos neles e fazemos uma ultracongelação ou então temos de cozinhar e consumir logo”. Nos congelados, a preferência deve ir para o camarão selvagem que é, segundo o chef, “muito mais rico do que um camarão que venha do Vietname ou do Taiwan, onde são criados, muitas vezes, em tanques com sujidade e depois levam banhos de produtos à base de lixívia”. “Não aconselho a comer qualquer camarão que seja criado em água de cultura.”

Da amêijoa ao berbigão

Na amêijoa, a crença popular está certa: deve estar fechada. A amêijoa só abre para depurar, mas se estiver aberta num saco de rede é porque está morta e não convém comer, até porque “aí as bactérias começam a consumir tudo”. O berbigão, o bivalve favorito do chef estrelado, segue a mesma lógica. Assim como o mexilhão. “Além disso, nos bivalves, se conseguirmos mantê-los em água do mar no frigorífico, em que estejam ali vivos e a depurar é o melhor. Quando comemos e têm areia é porque não depuraram o suficiente.” Depois, a regra é sempre a mesma: cozinhar rapidamente e o que sobrar comer, no máximo, no dia seguinte.