Valter Hugo Mãe

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Rubrica "Cidadania Impura", de Valter Hugo Mãe.

Gosto de ser livre, como uma consciência livre que pondera sobre pessoas mais do que sobre regimes e ideologias que se procuram impor.

Muito me enerva que as pessoas julguem que um escritor não deve mencionar a política, como se esta fosse uma sujidade não admitida na nossa torre de marfim. E muito me frustra porque significa que se desencantaram com a política e a julgam como toda igual, a mesma coisa invariavelmente, sem decência em parte alguma ou salvação. Pois ela é uma contingência e, no que me respeita, procurarei sempre contribuir para que seja nobre. Prefiro desiludir-me mil vezes, a agir como alguém sem interesse nessa que é uma missão e uma arte de cuidar e criar paz para todos.

Dito isto, sou sem partido. Gosto pouco do jogo dos partidos, da disciplina que impõem aos seus militantes, que os formata e retira a espontânea convicção. Gosto de ser livre, como uma consciência livre que pondera sobre pessoas mais do que sobre regimes e ideologias que se procuram impor.

Chegam as autárquicas e alguns políticos que admiro estão na corrida, em posições, lugares e partidos distintos. Pessoas que a sorte me deu o privilégio de acompanhar como amigas e que admiro profundamente, confiando nelas como confio nos íntimos, aqueles que amo e escolho para toda a vida.

O Vítor Paulo Pereira, em Coura, é das almas mais bonitas que Deus inventou. Conheço-o há vinte anos e se alguma vez lhe encontrei um erro foi só o de esperar dos outros a mesma boa-fé e beleza, quando nos outros existe tanto quem desistiu e optou pela simples ganância. O Vítor Paulo é assunto para a NASA, para a Associação dos OVNIS, para a cúpula do Vaticano ou, no mínimo, para a Netflix. Apenas estruturas de pensamento sofisticadas e cheias de recursos poderão explicar como há alguém como ele na contemporaneidade nada santa em que vivemos.

O Alexandre Mano corre a uma junta de freguesia em Braga. Quando publiquei o livro “O remorso de Baltazar Serapião”, em 2006, dediquei-o aos meus irmãos e junto está o Alexandre. Casou, é pai de filhos, professor exemplar, era desde sempre inteligência pura. Entendia a pior fórmula de matemática só de olhar, deixava-nos a léguas, burros e em desamparo. A lisura do Alexandre é inquestionável. Uma transparência de sentidos, uma vontade sem peneiras, uma família que não perderei por nenhum tempo nem nenhuma distância. Meu irmão Alexandre, filho de outros pais, é mesmo um luxo maior que há em Braga.

A Ilda Figueiredo, no Porto, incansável, histórica, entusiasmada. Que privilégio tê-la como amiga e saber, em inúmeros jantares, inúmeros encontros, como influi a sua vereação sem pelouro na vida dos mais vulneráveis. A história de vida da Ilda é exemplo de esforço e rara conquista e comove-me que ela não abandone quem está hoje na mesma deriva em que tantos de nós estivemos. Ao longo dos anos tenho visto como cuidou dos direitos mais elementares de tanta gente no Porto, discretamente, conseguindo que tenham casa, emprego, indemnizações devidas, escola para os filhos. Não sei como vos dizer, mas aquilo que vou vendo e sabendo é da máxima importância, uma humanidade em acção, a mais límpida acção sagrada.

Dito isto, votarei este ano, ainda, em Vila do Conde. Sonho para Vila do Conde o melhor. Desejo para toda a parte muita sorte. E dignidade política. Porque quero esplendor político, sim, nem que apenas para cuidar de meus políticos de eleição, aqueles que sei não se haverem corrompido de modo algum.

(O autor escreve de acordo com a anterior ortografia)