Fernanda Montenegro: 90 anos de uma apaixonada pela representação

Fernanda Montenegro

Por Bruna Sousa

Forte, comprometida à dignidade e com uma capacidade de adaptação que faz dela um camaleão. No palco e na vida. Assim é Fernanda Montenegro, a mais reconhecida atriz brasileira, que completa 90 anos nesta quarta-feira.

É a mais velha de três irmãs. Embora tenha raízes açorianas e italianas, Arlette Pinheiro da Silva, o nome com que os pais a batizaram, nasceu em Campinhos, nos subúrbios do Rio de Janeiro. O primeiro emprego foi como locutora da Rádio MEC, quando tinha 15 anos. Na mesma altura, integrou um grupo de teatro, iniciando aí um percurso na representação que acabaria por se tornar inigualável. Mais tarde, com 23 anos, casou com o ator e produtor Fernando Torres. Da união nasceram o cineasta Cláudio Torres e a atriz Fernanda Torres.

Fernanda fez teatro, rádio, cinema e televisão. Entre as novelas em que integrou o elenco destacam-se “Guerra dos Sexos” (1983), “Rainha da Sucata” (1990), “As Filhas da Mãe” (2001), “Babilónia” (2015) e “O Outro Lado do Paraíso” (2017). A interpretação de Dora Teixeira no filme “Central do Brasil” (1998) fez com que fosse a primeira brasileira a ser nomeada para o Oscar de Melhor Atriz, em 1999, e valeu-lhe a conquista do Urso de Prata no Festival Internacional de Cinema de Berlim, no ano em que o filme estreou. Com o papel de Dona Picucha, protagonista da série “Doce de Mãe” (2013), a artista venceu o Emmy Internacional de Melhor Atriz.

Entre muitos outros galardões internacionais e prémios conquistados no Brasil, Fernanda foi condecorada com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito, em 1999, venceu cinco vezes o Prémio Molière e arrecadou três vezes o Prémio Governador do Estado de São Paulo.

Polémica antes da festa

Ao longo da carreira, Fernanda Montenegro sempre pensou pela sua cabeça. E foi agora, quando se preparava para completar 90 anos, que mais uma tomada de posição pública da atriz acabou por conquistar contornos controversos e ultrapassar as fronteiras brasileiras.

Tudo começou com uma imagem veiculada na edição deste mês da revista literária “Quatro Cinco Um”, na qual Fernanda ousou ser fotografada a interpretar uma bruxa. Amarrada, prestes a ser queimada numa fogueira de livros. A imagem tem, claramente, caráter metafórico. Alude à censura e simboliza o manifesto contra o rumo da produção cultural no Brasil, que tem vindo a conquistar apoiantes. Ao aceitar o desafio, a atriz comprometeu-se com uma luta: a da contestação das políticas do governo de Jair Bolsonaro.

Houve quem reprovasse a atitude. Roberto Alvim, diretor do Centro de Artes Cénicas da Fundação Nacional de Artes (Funarte), apoiante do presidente brasileiro, chamou Fernanda de “sórdida” e classificou a revista como “esquerdista”. As declarações ofensivas valeram-lhe muitas críticas entre a comunidade artística, nomeadamente da Associação dos Produtores de Teatro (APTR), que repudiou as palavras do dramaturgo, tal como outros grandes nomes da representação brasileira, que fizeram questão de reforçar o apreço pela intérprete.

Mas não há polémica que derrube uma carreira recheada de sucessos. E, como forma de assinalar nove décadas de vida, foi recentemente editado o livro de memórias “Prólogo, ato, epílogo”. A obra, lançada a 20 de setembro, agrega várias entrevistas feitas pela jornalista Marta Góes e relata o percurso da brasileira que em Portugal possui inúmeros fãs. Entre julho de 2016 e novembro de 2017, a jornalista entrevistou Fernanda 18 vezes. Com base no conteúdo recolhido, entre novembro de 2017 e agosto deste ano, a atriz escreveu o livro.

A “Notícias Magazine” convidou nomes da Cultura para, no dia do 90.º aniversário de Fernanda Montenegro, partilharem uma mensagem com a atriz. Percorra a galeria de imagens para as conhecer.