Luís Ferreira: um aldeão do mundo

Rui Miguel Pedrosa/Global Imagens

Texto de Sara Dias Oliveira

Em 2006, Luís Ferreira tinha 22 anos, estava a terminar o curso de Design nas Caldas da Rainha e fazia parte, como ainda hoje, do Sport Club Operário de Cem Soldos, que então celebrava 25 anos. As bodas de prata foram o pretexto para a associação apresentar novas ideias.

A cabeça de Luís começou a fervilhar e o Bons Sons nascia em três palcos da aldeia. No início de dois em dois anos, desde 2014 todos os anos. A nona edição está à porta. De 9 a 12 de agosto, a aldeia de Tomar, com cerca de 600 habitantes, recebe cerca de 50 projetos musicais distribuídos por oito palcos.

Há 12 anos, os jovens de Cem Soldos sabiam que as aldeias estavam a morrer e não queriam perder as suas festas de arraial.

“Lançámos um olhar crítico sobre o que éramos, o que queríamos fazer. Decidimos trazer a contemporaneidade ao campo, mas sem o cliché para a fotografia das ovelhas e da senhora de lenço na cabeça.”

Desde a primeira hora, assumiu a direção artística do Bons Sons, que hoje envolve mais de 400 voluntários e um orçamento de quase 500 mil euros. E são os habitantes mais velhos que fazem, com as próprias mãos, o material de promoção, como as “tixas”, as lagartixas que são a imagem do festival.

O Bons Sons cresceu, ganhou visibilidade, consolidou um cartaz com músicos consagrados e projetos emergentes. “É um festival popular e eclético e a proposta é viver a aldeia.” Nas ruas, praças, largos, na igreja. Com estilos musicais diversos e várias propostas: música para crianças, sessões de cinema, exposições, feiras, passeios com burros de Miranda.

“O Bons Sons é a lança que mobiliza outros projetos.” Que traz à aldeia cerca de 30 mil visitantes, que mobiliza o turismo, que faz olhar de outra forma para o urbanismo.

Há um sentido de pertença que se agarra à pele e um espírito de comunidade que não desaparece. A ligação à aldeia é visceral e o regresso é sempre uma certeza, nem que seja, como gosta de dizer, “para secar os ossos” ao sol.

Para Luís, a cultura é feita de desafios. “Não há cultura com conforto, é do desequilíbrio que vem o próximo passo. A cultura é encontro, é ir para a rua, é procurar, é desafiar, é ter curiosidade pelo outro.”

Agora Luís divide-se entre Ílhavo, onde é diretor do 23 Milhas, projeto cultural do município, Lisboa, como comissário dos Caminhos do Médio Tejo, projeto turístico e cultural que coloca em rede 13 municípios da região, e Cem Soldos, onde está em casa.