Texto de Sara Dias Oliveira | Fotografia Catarina Ferreira da Silva
O que parece uma grande colher com uma concha em forma de oito é encostada ao crânio. Os doentes podem ler, ver televisão, até dormir, durante as sessões que duram entre 30 a 40 minutos, cinco vezes por semana, durante um mês ou mês e meio.
A máquina que trata doentes com aquela depressão que não tolera ou não se verga ao poder dos antidepressivos induz um campo magnético à sua volta devido à passagem de corrente elétrica por uma bobina. Quando essa bobina está próxima do cérebro, esse campo magnético gera correntes elétricas no tecido nervoso que podem produzir alterações funcionais nesse tecido e, desta forma, ter um efeito terapêutico. O tecido nervoso é estimulado sem eletricidade direta. Não é um eletrochoque, não é preciso anestesia. É uma técnica não invasiva, que não dói, com programas terapêuticos adequados e estruturados. E está em Portugal.
Estima-se que 20 a 30% dos doentes com depressão não respondam ou não suportem os tratamentos com medicação antidepressiva.
Há mais máquinas semelhantes em Portugal. A inovação do aparelho que está no Centro Champalimaud, em Lisboa, não está propriamente na maquinaria. «A diferenciação não é o equipamento. Do ponto de vista clínico, o que procuramos, em termos de diferenciação, é a existência de um programa organizado de tratamento da depressão utilizando a estimulação magnética transcraniana», explica à NM Albino Oliveira-Maia, psiquiatra do Centro Champalimaud.
Um programa estruturado que até agora não havia em Portugal para tratamento de doenças psiquiátricas. «Temos um espaço, temos uma equipa preparada para aplicar o tratamento, tentaremos estabelecer protocolos com as agências que custeiam os tratamentos das pessoas, as seguradoras públicas ou privadas de saúde, para facilitar o acesso», sublinha o médico.
As indicações estão estabelecidas. Segundo Oliveira-Maia, a máquina pode ser utilizada em doentes que tenham manifestado «um episódio de depressão moderado a severo, em termos de gravidade, que não tenham respondido a pelo menos dois tratamentos com antidepressivos.»
A máquina pode ainda ser usada em doentes oncológicos que se sintam deprimidos, com a vantagem de evitar interações indesejáveis com a medicação para tratar o cancro e os antidepressivos, e ainda para a investigação pré-clínica, como, por exemplo, perceber como a técnica de estimulação altera alguns marcadores comportamentais da síndrome obsessiva-compulsiva.
A estimulação produzida pela máquina diminuiu a atividade de uma parte do cérebro e os sintomas da depressão melhoram. É uma área que fica na parte da frente da cabeça, córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo, que é estimulada. Os médicos não veem exatamente a zona do cérebro que será estimulada, mas sabem qual o ponto específico do crânio que deve ser tratado.
«Começamos por testar uma área do córtex motor no lado esquerdo da cabeça, que nos permite determinar, por tentativa e erro, o ponto de maior estimulação do movimento da mão direita», refere o médico. É esse ponto que é marcado na touca que cobre a cabeça do doente. E é debaixo desse ponto que a estimulação magnética deverá produzir um maior efeito antidepressivo.
A estimulação diminui a atividade de uma parte do cérebro e os sintomas da depressão melhoram. É uma área que fica na parte da frente da cabeça que é estimulada pela máquina.
Estima-se que 20 a 30% dos doentes com depressão não respondam ou não suportem os tratamentos com medicação antidepressiva. Mas quando estes doentes são submetidos à técnica de estimulação magnética transcraniana repetitiva, há indicadores que demonstram que o estado clínico de 41,5 a 56,4% desses doentes melhora substancialmente e entre 26,5 e 28,7% deixam de estar deprimidos.
A utilização desta técnica foi aprovada em 2008 pelas autoridades de saúde norte-americanas e o seu uso tem vindo a aumentar em todo o mundo. A tecnologia tem mais de 30 anos, nasceu pela mão do engenheiro britânico Anthony Barker, mas só na década de 1990 é que começou a ser utilizada por médicos pioneiros, entre eles o neurologista espanhol Álvaro Pascual-Leone, da Escola de Medicina de Havard, com o qual Oliveira-Maia trabalhou.