Texto Sara Dias Oliveira | Fotografia de Miguel Pereira/Global Imagens
Nas horas vagas do liceu, enquanto tirava um curso técnico-profissional de Contabilidade e Gestão, andava pela empresa têxtil dos pais a ajudar no que fosse preciso. Terminou o secundário e deixou Guimarães para estudar Direito no Porto. Queria ser juiz. Antes de entrar na faculdade, ainda trabalhou um ano numa empresa ligada ao ambiente que fazia recolha e análises de água. Mas a vida, entretanto, deu muitas voltas.
Jorge Veloso não chegou a acabar o curso. Aos 19 anos fundou a AudioVeloso, que organizava espetáculos musicais, e durante 15 anos andou por todo o lado com o Trio Elétrico, o nome (nascido no Brasil) para os camiões equipados com sistema de som e colunas potentes, preparado para festas de grande dimensão. Foi o primeiro no país. Daniela Mercury, Ivete Sangalo ou Seu Jorge são alguns dos músicos brasileiros que trouxe nesses anos a Portugal e a mais sete países da Europa.
Há cerca de um ano, Jorge criou a sua própria produtora, a Vibes & Beats. Queria provar que é possível surpreender neste meio. Fazer coisas diferentes e com qualidade, que atraem público e merecem aplauso da crítica. Por isso não se considera um agente. «Sou um produtor. Não copio conceitos, crio conceitos. Faço os meus próprios espetáculos. Só faço aquilo que crio, não faço projetos de outros.» Vinte anos de produção deram-lhe tarimba e a experiência mostra-lhe que, por vezes, vale a pena arriscar. «Estava como peixe na água nos espetáculos, mas queria mais.»
Abriu a empresa para organizar eventos musicais e desportivos. Gravou o primeiro DVD da história dos GNR, trouxe Caetano Veloso a Portugal, encerrou uma tournée de David Carreira, juntou Zélia Duncan e Zeca Baleiro em Lisboa, no Porto e em Londres, levou Anselmo Ralph a Gondomar, trouxe Djavan a várias salas do país, organizou concertos de Rita Guerra e dos Moonspell. E, em setembro do ano passado, produziu o MTV Back to School no Campo Pequeno, em Lisboa, uma festa com bandas e DJ para celebrar o regresso às aulas. Dez horas de música e animação para ganhar pedalada para um ano letivo.
«Usei o conceito de espetáculo e conciliei-o com o desporto. Fiz um evento à minha maneira com animação para criar um momento de convívio. Nunca vi uma coisa assim em lado algum.»
As ideias surgem onde menos se espera. Uma delas nasceu quando estava a correr. «O trail no Douro estava muito triste, monótono, pouco colorido.» Não tinha de ser assim. Aquela prova de quinze quilómetros pelos socalcos merecia mais. E que tal juntar música e desporto? Em outubro do ano passado, colocou em prática a ideia: organizou em Guimarães o Penha Music Trail, com cerca de cinco mil atletas de camisolas iguais e cores diferentes, consoante os quilómetros a percorrer, a aquecer o corpo com zumba e a andar pela serra da Penha com música a cargo de vários DJ pelo caminho e postos de abastecimento de comida no percurso.
«Usei o conceito de espetáculo e conciliei-o com o desporto. Fiz um evento à minha maneira com animação para criar um momento de convívio. Nunca vi uma coisa assim em lado algum.» Não tardou a registar o nome como propriedade intelectual. «Vi que era uma oportunidade e juntei o útil ao agradável.» Agora vai trazer e levar a ideia para sul e já está a preparar o Cascais Music Trail, na zona do Guincho, a 23 de setembro. A segunda edição do Penha Music Trail está marcada para 14 de outubro.
No início de junho, o North Music Festival viu a luz do dia. Foram dois dias de música no Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, com um cartaz onde estava Salvador Sobral, Amor Electro, Skunk Anansie, Jorge Palma & Sérgio Godinho, Pedro Abrunhosa, Sean Riley and Slowriders, entre outros. Cerca de seis mil pessoas no primeiro dia, mais de oito mil no segundo, um estádio transformado em palco, com barbearia, make-up, filmes e documentários sobre bandas. «Não foi só uma festa, foi também uma experiência», diz Jorge Veloso, que durante quatro dias não pregou o olho.
As notícias da análise feita pela Cision, empresa que monitorizou meios de imprensa, canais de televisão, estações de rádio, blogues e redes sociais, são animadoras: 42% da população portuguesa esteve exposta à mensagem do festival, num total de 4,4 milhões de pessoas. Foram publicadas 229 notícias nos media e 972 publicações nas redes sociais. O retorno mediático da marca valeu cerca de 616 mil euros. Jorge Veloso conta que fez um investimento de cerca de 500 mil euros e está satisfeito com os indicadores para uma primeira edição. A próxima já não será em Guimarães, que foi «uma boa semente», e mudará para o Porto.
Jorge Veloso sempre foi ambicioso mas, quando começou, não sabia que chegaria aqui. Nos primeiros anos, o principal negócio da produtora que tinha com o irmão, era a gestão do maior trio elétrico da Europa, esse camião de 40 toneladas, 18 metros de comprimento e cem mil watts de som.
Guimarães é, de facto, o berço. É onde Jorge Veloso nasceu e onde instalou a Vibes & Beats num edifício perto do complexo de treinos do clube da cidade. O quartel-general fica no rés-do-chão de um edifício moderno, em 150 metros quadrados de paredes forradas com planos de espetáculos, agendas, escalas de produção, fotografias de artistas e datas de pagamento. É onde gere uma equipa de cinco pessoas que tratam da gestão de redes sociais, marketing, economia, fiscalidade e contabilidade. Uma equipa que estica em cada espetáculo – por vezes precisa de 300 ou 700 pessoas nos bastidores, consoante o evento que tem nas mãos.
Sempre foi ambicioso mas, quando começou, não sabia que chegaria aqui. Nesses primeiros anos, o principal negócio da produtora AudioVeloso, que tinha com o irmão, era a gestão do maior trio elétrico da Europa, esse camião de 40 toneladas, 18 metros de comprimento e cem mil watts de som. Foram muitos quilómetros de estrada e histórias felizes, e outras mais tristes, para recordar. Vários carnavais pela Europa, eventos desportivos que nunca mais se esquecem. A equipa do Barcelona andou no trio quando foi campeã da Europa em 2006, com Ronaldinho Gaúcho, Deco e Messi aos saltos em cima da estrutura. Dois anos antes, o camião com som a 360 graus transportou os jogadores do Futebol Clube do Porto nas festas da conquista da Liga dos Campeões, quando a equipa treinada por José Mourinho venceu o Mónaco.
Nesse mesmo ano de 2004, o camião estava preparado para a festa depois da final do Campeonato da Europa, com o percurso escolhido entre o Estádio da Luz e o Parque das Nações. Mas os gregos – e aquele golo de Charisteas – trocaram as voltas a um país inteiro. «Tínhamos tudo preparado, foi uma grande tristeza.» O mesmo filme com o Sporting no ano seguinte, quando perdeu a final da Taça UEFA para o CSKA de Moscovo. O trio elétrico, mais uma vez, não saiu à rua.
O coração andou aos pulos mais do que uma vez. Daniela Mercury ia atuar em Valência, Espanha, e o sistema de som numa das laterais do camião queimou. Um funcionário da produtora fez a viagem entre Lisboa e Valência em nove horas para levar os altifalantes que teve de ir comprar de urgência a Santarém para que a festa da cantora brasileira não fosse por água abaixo. Não foi.
A relação de Jorge Veloso com o camião de som acabou no ano passado. «Foi a menina dos meus olhos durante 15 anos. Vendi-o e acabou a minha história com o trio elétrico.» Jorge Veloso seguiu entretanto outra estrada E o negócio parece andar sobre rodas.
O QUE AÍ VEM
Na agenda de Jorge Veloso para este ano estão previstos alguns espetáculos. Simone e Zélia Duncan no Casino do Estoril, Casa da Música e Coliseu de Lisboa, em outubro. Ou os 25 anos dos Resistência – com Tim, Miguel Ângelo, Olavo Bilac e companhia a convidarem António Zambujo e Raquel Tavares – no Meo Arena e no Multiusos de Guimarães, no mesmo mês. E os cinquenta anos de carreira de Gal Costa no Campo Pequeno e no Coliseu do Porto, em novembro. Antes disso, em setembro, o produtor organiza o Cascais Music Trail, uma corrida com DJ e músicos ao longo do percurso, no Guincho.