1975: O dia em que a opressão feminina não ardeu

A 13 de janeiro de 1975, as feministas do Movimento de Libertação da Mulher manifestaram-se no Parque Eduardo VII contra os símbolos da opressão feminina. Queriam queimá-los. Mas os ditos não arderam. E muitos continuam por arder.

Revistas pornográficas, panos do pó, fraldas, brinquedos perpetuantes dos estereótipos de género, o Código Civil, o Código Penal, a legislação do trabalho e tudo o que representasse a opressão da mulher na sociedade portuguesa (soutiens não, ao contrário do que noticiaram os jornais da época) seria queimado numa grande fogueira no topo do Parque Eduardo VII, em Lisboa. Era essa a intenção do Movimento de Libertação da Mulher (MLM), naquela que seria a primeira manifestação feminista em Portugal. Havia uma noiva, uma dona de casa e uma vamp, Isabel Télinhos (na imagem, a dar uma entrevista ao jornalista Adelino Gomes, do Rádio Clube Português). Havia mulheres. Muitas. Mas a manifestação foi impedida por uma multidão de homens (e de outras mulheres) e vaias e insultos e violência e apalpões e tentativas de despir as manifestantes, que acabaram por desmobilizar, derrotadas.

O dia em que o machismo saiu à rua contra a emancipação da mulher ocupou, no dia seguinte, o canto inferior direito da primeira página do Diário de Notícias. «Foram salvos da fogueira os símbolos da opressão feminina» era o título da notícia. Dois meses depois, o disco virava mas não tocava o mesmo. «As mulheres portuguesas podem e devem ser uma força política», titulava o mesmo jornal, no dia 9 de março, que se seguiu ao Dia Internacional da Mulher, para dar conta de que as ruas de Lisboa se tinham enchido de milhares de pessoas, numa manifestação convocada pelo Movimento Democrático de Mulheres (MDM), «na primeira vez que tal data se comemorou livremente, e que só se tornou possível depois do Movimento do 25 de Abril».

DIA DE LUTO
Para o 8 de março de 1975, o MLM previra uma conferência de imprensa e uma manifestação, em sinal de luto pela situação da mulher e pela discriminação que constituía ser-lhe consagrado um dia. Segundo o DN de 9 de março, foram ambas canceladas.