Depois de tanto sururu nas redes sociais e nos meios de comunicação social, ainda não li nada sobre o que me parece importante no famoso vídeo das advogadas. Nada sei sobre leis internas que regulam o exercício da advocacia – embora, nos últimos tempos, da economia à Constituição, pululem por aí os especialistas de pacotilha, instantâneos, basta-juntar-wikipédia. Não me interessa saber se o vídeo é ou não publicidade – algo que, parece, queima, na advocacia em Portugal, vá lá saber-se porquê. Não faço ideia se estas profissionais merecem castigo. São assuntos estranhos, para mim, e quase que aposto para os 99,6 por cento da população que não tiraram Direito, isto apesar de muita doutrina televisiva que passa nas séries da especialidade há várias décadas.
Mas, ainda que mal pergunte – isto para usar uma expressão que me junta ainda mais ao povo ignaro que quero representar nesta crónica –, o vídeo serve para quê? Foi feito com que intuito? Sim, as advogadas são giras. Sim, pisam bem. Sim, têm bom gosto a escolher roupas, joias, acessórios, maquilhagem e estilos de cabelo… Mas… algum desses fatores é crítico na escolha de um advogado? Se o leitor tivesse um problema legal preferia uma advogada que fosse uma bênção para os olhos ou um advogado, ainda que gordo e desmazelado, mas eficiente?
Aí está a primeira coisa que me parece importante neste vídeo: é mau. Comunicacionalmente falando, não serve o seu propósito. E é mau esteticamente – exceto, claro, no que diz respeito ao assunto que o tornou falado, ter advogadas giras. De resto, tem cenas de rua despropositadas, semáforos ao desbarato, não tem história, é acompanhado por uma ladainha incompreensível carregada de lugares-comuns.
Isto irrita-me duplamente. Preferia estar a discutir a emancipação das mulheres advogadas – que é, parece, a mensagem subliminar deste filme – através de um vídeo em que se percebesse a sua força profissional, e em que os seus métodos de pisar a calçada com stiletti tivessem a medida certa de importância, e não fossem o centro das atenções. Porque, parece, do que li e do que sei, as grandes sociedades de advogados são dominadas por homens, apesar de haver um exército de advogadas. E uma das mensagens que o escritório de Maria do Rosário Matos parece ter querido passar é que também há escritórios em que as mulheres mandam e são tão boas como os homens.
Há de haver, mas não é através deste vídeo que percebemos isso. É verdade que as séries americanas, de Ally McBeal a The Good Wife, nos mostram sempre mulheres, advogadas e bonitas, bem cuidadas, de tailleurs caríssimos e sapatos altos a condizer. Mas, de uma maneira ou de outra – e para além do facto de serem todas atrizes de Hollywood –, através da trama, não é nisso que se centra a excelência destas séries judiciais. É na capacidade de, sendo mulheres, estas advogadas fazerem diferente e conseguirem ser boas profissionais. Aparecem a ter ideias, à secretária, nas barras dos tribunais, ou, até, na pior das hipóteses, a usarem o charme feminino para conseguir uma informação.
Nem me atrevo a pensar que características profissionais podem sair acentuadas pelos stiletti ou pelos cabelos bem esticados. É verdade que o mundo empresarial exige cada vez mais de quem o frequenta, mesmo na aparência, e sobretudo das mulheres. Mas é assim também que chegamos ao segundo assunto que me parece verdadeiramente importante neste vídeo: não tenho dúvidas de que a imagem que passa dele não traz nada de bom, nenhum benefício ou evolução, ao papel das mulheres no mundo. Nem no da advocacia nem no outro, o que fica fora dos tribunais.
[29-12-2013]