Psiquiatria

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O defeito será meu, que os tenho em barda, mas não encontro nenhuma diferença substancial entre o sujeito que mata gritando um patético «Alá é grande» e o indivíduo que, após cometer um homicídio, profere uma frase tão ridícula quanto «O meu nome é morte aos traidores e liberdade para a Grã-Bretanha», conforme sucedeu com o patriótico assassino da deputada britânica Jo Cox.

Nada que seja essencial distingue o norte-americano recalcado que atacou um bar em Orlando, o norueguês paranóico autor da matança num acampamento de jovens na ilha de Utoya, o japonês que planeava asfixiar os utentes do metropolitano com gás sarin e o francês que participou no massacre do Bataclan. O ex-soldado norte-americano Timothy McVeigh, responsável por 168 mortos e 850 feridos no atentado de 1995 em Oklahoma City, não é melhor nem pior terrorista do que os dois belgas que se fizeram explodir no aeroporto de Bruxelas – McVeigh foi apenas mais mortífero; e não tinha raízes muçulmanas nem usava o Corão para se justificar.

Manuel Jorge MarmeloS_Os assassinos do Charlie Hebdo e os assassinos do metro de Maelbeek partilham duas características fundamentais com os anteriores: viram-se privados do traço racional de humanidade que impede os homens de se matarem uns aos outros; e não foram internados a tempo num manicómio. Como o Hamlet de Shakespeare ou o lavrador que abre a cabeça do vizinho à sacholada, o desvairado indivíduo que comete um ato terrorista é acima de tudo um louco que, em vez de receber os cuidados da psiquiatria, passou a contar nos últimos anos com o enquadramento institucional do ideal retorcido e doentio, de horror e morte, proclamado pelo chamado Estado Islâmico.

É um pouco inquietante, por isso, que os terroristas islâmicos partilhem com o assassino de Jo Cox a mesma ideologia de ódio, intolerância, isolamento e xenofobia que a maioria dos ingleses expressou no recente referendo sobre a União Europeia. Entre o grupúsculo celerado que se propõe reconstituir o Al-Andalus, o Reino Unido orgulhosamente só, a Europa defendida por cercas de arame farpado e os EUA presididos por uma cabeça extravagante e misógina que reclama não haver ninguém melhor do que ele a construir muros – venha o diabo e escolha. A estupidez e a doença mental alastram como os fogos florestais nas tardes de verão.

(Fotografia por Manuel Jorge Marmelo)

[Publicado originalmente na edição de 10 de julho de 2016]