Jorge Manuel Lopes

O fabuloso destino de Sy Smith


Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.

O r&b da era moderna, que ganhou forma sobretudo na década de 1990, continua por aí, um corpo em pequenas e contínuas mutações, de mão dada com a neo soul, o jazz, a eletrónica, o psicadelismo. Nele viaja Sy Smith, cantora-compositora-produtora-atriz que trocou Washington por Los Angeles, fazendo há um quarto de século um caminho sobretudo num segundo mas sólido plano na indústria musical: coros para Usher, Meshell Ndegeocello e Macy Gray; digressões com Whitney Houston, Sheila E e o trompetista Chris Botti; e colaborações regulares com o duo (e etiqueta) The Foreign Exchange.

É através do braço editorial desta última, a +FE Music, que chega o sexto álbum de Sy Smith. “Until we meet again” apresenta uma autora de uma segurança indestrutível, que revela o seu virtuosismo em generosas camadas de nuances, elevando o tom apenas se e quando a narrativa das composições o sugere (em “Remember how to fly”, ela galga oitavas com a mestria de uma Mariah Carey) – um equilíbrio precioso que se estende aos instrumentistas que a rodeiam, da fluida secção rítmica aos teclados e cordas cremosos, mais a discretíssima frescura da guitarra acústica. Há canções de uma impossível leveza, como “Photograph”, na qual é sempre primavera. O trompete de Botti durante “Remember how to fly” é companhia em dueto com Smith mas também fonte de breves, muito breves, solos que encarnam o voo prometido no título. O baixo borbulhante, os laivos de disco nos violinos e uma bateria alimentada a breaks dão corpo a “Slide”. Sheila E reforça a massa de percussões da doçura dançante, latina q.b., de “MasterClass” (uma de várias faixas em que Sy Smith resgata a gentileza vocal de Janet Jackson). A arrepiante “Summer of ‘93” traz o funk asfaltado da época titular e, inevitável, a sombra de Mary J. Blige.

“Until we meet again” entrega dez canções com a delicadeza da porcelana. A finura e a ilusória simplicidade dos arranjos e da produção, de Tall Black Guy e Lorenzo Ferguson (aliás Zo!), são obra de mestres pintores. Aqui coexistem r&b, jazz, uma superlativa mão para a pop, o modernismo no olhar. Fabuloso.