Jorge Manuel Lopes

Nestes arquivos ouve-se o futuro


Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.

A terceira remessa das caixas que desvendam os tesouros arquivados de Joni Mitchell abarca o período, entre 1972 e 1975, em que a compositora e intérprete canadiana-americana obteve os maiores sucessos nas tabelas de vendas. Esses anos de início de ligação com a editora Asylum renderam, num crescendo de liberdade sonora, os álbuns “For the roses” (72), “Court and spark” (74) e o translúcido e transcendente “The hissing of summer lawns” (75). É com as maquetas, gravações de estúdio e espetáculos na génese deste trio que se preenche “Joni Mitchell archives – Volume 3: The Asylum years (1972-1975)” (Rhino/Warner).

A marcha dos cinco CD inicia-se com um concerto-recital no Carnegie Hall, Nova Iorque, a sós com guitarra ou piano, intervalando material familiar (“Blue”, “A case of you”) com canções a meses da aparição em “For the roses” (“You turn me on, I’m a radio”, “Banquet”). Os esboços deste período também dominam o segundo disco – o mundo da escrita de Joni Mitchell num desabrochar permanente, a malha instrumental, as palavras e os caminhos das melodias a depararem-se com outras possibilidades. Há um assomo jazzístico numa versão madrugadora de “Twisted”, de Annie Ross e Wardell Gray, que teria lugar lá à frente, em “Court and spark”. É a esta obra que a rodela número 3 se dedica, com pontos altos numa suite de 12 minutos para piano; no inédito “Bonderia”, que lança um feitiço; e na atuação no Dorothy Chandler Pavilion, Los Angeles, a 3 de março de 1974, acompanhada por Tom Scott & The L.A. Express, abeirando-se de um soft rock com mar e areia e céu límpido. Um concerto que também toma conta do quarto CD, uma peça central desta caixa, na sua visão ampla do estado da arte de Joni Mitchell naquele ponto no tempo, a folk e a economia de meios a ceder caminho a algo mais desafiador. Tudo consubstanciado no quinto disco, o magistral “The hissing of summer lawns” no horizonte, uma linguagem nova notória nos esboços, um mundo único, um ritmo interno próprio.

Tal como os “Archives” anteriores, o volume 3 capricha no design da caixa, na curiosidade das fotos no livreto e na conversa da autora com Cameron Crowe. Um objeto precioso para fãs de Joni Mitchell.