O meu objeto: o crucifixo de Victor Espadinha

Victor Espadinha lançou o álbum “60 anos de palco”, em setembro. Neste momento, integra o elenco da peça “A Noite”, de José Saramago, encenada por Celso Cleto, em cena no Auditório Eunice Muñoz, Oeiras, até 18 de dezembro. Prepara-se para gravar um filme de Rui Goulart

O objeto escolhido pelo cantor, músico e ator Victor Espadinha.

“Não sou religioso. Nem católico, nem apostólico, nem romano. Não acredito em nenhuma religião. Seja a que tem uma vaca como deus, seja a que rezam a deus de cu para o ar (uma falta de respeito!), e que apedrejam mulheres por adultério. Não aceito ‘intermediários’ para nos ‘perdoarem’ os pecados, nem negociantes que se aproveitam da fé das pessoas. Uso um crucifixo ao meu pescoço há mais de 50 anos! Aqui vai a explicação: tive um problema grave durante a guerra em África, no tempo dos assassinos de Salazar. Não vou explicar o que aconteceu porque, ainda hoje, me sinto mal quando o recordo. Estava num hospital, quando um médico e uma enfermeira me espetavam um tubo no meu pulmão para o encher de ar. Lembro-me da enfermeira a gritar para o médico: ‘Doutor, doutor, ele está-se a ir!’. E eu sentia-me a desfalecer e não conseguia respirar. A enfermeira, debruçada sobre mim, deixa cair sobre a minha cara, um fio com um crucifixo que lhe vinha por entre os seios. Agarro o crucifixo com a minha mão e, de repente, sinto que começo a respirar e a sobreviver. Passado uns dias, a enfermeira veio ao meu quarto e ofereceu-me o seu crucifixo. Uso-o ao meu pescoço há mais de 50 anos! Nunca mais soube dela. Gostava tanto de lhe ter dado um abraço e beijado as mãos. Mas nunca mais a vi!”.

Cantor, músico, ator
83 anos