Jorge Manuel Lopes

A grande instituição irlandesa


Crítica de música, por Jorge Manuel Lopes.

A 12 de outubro do ano passado partiu Paddy Moloney. Aos 83 anos, era o derradeiro membro fundador de The Chieftains no ativo, e com a sua saída de cena o núcleo do coletivo irlandês resume-se agora a Kevin Conneff e Matt Molloy, que por lá andam desde 1976 e 1979, respetivamente. O grupo encontrava-se ainda a braços com um derradeiro ciclo de espetáculos, a Irish Goodbye Tour, iniciado em 2019 e interrompido devido à pandemia.

Vindo de outros artistas, o nome da digressão soaria a uma confluência desproporcionada entre a identidade de uma banda e de uma nação, mas no caso de The Chieftains isso faz amplo sentido. Num trabalho paciente iniciado em Dublin, 1962, por Moloney, Sean Potts, Michael Tubridy, David Fallon e Martin Fay, o grupo foi sistematizando e depurando uma sonoridade tradicional que, com o sucesso internacional obtido a partir dos anos 1970, transformou o seu repertório no idioma musical em que o Mundo pensa quando pensa no som que as raízes da Irlanda têm.

A discografia de The Chieftains é generosa, roçando a meia centena de títulos, com o elenco de músicos que passou pelas suas fileiras pouco superior à dezena. No final do ano passado, para assinalar mais um aniversário redondo, foi lançada a compilação “Chronicles: 60 years of The Chieftains”, uma vida traduzida em 40 canções, uma recolha que traz o selo Claddagh Records, editora reativada também em 2021 e que publicou os discos da banda nas duas primeiras décadas. “Chronicles” é um retrato forçosamente sucinto, incorporando um arco narrativo em que se vai assistindo a um refinamento – ligeiro – do repertório, à medida que o seu reconhecimento se propaga pelo Planeta. O sinal mais concreto dessa expansão está na multiplicidade de convidados com que The Chieftains se cruzam neste alinhamento, uma rede de afinidades que inclui alianças com The Rolling Stones, Diana Krall, Bon Iver, Sinéad O’Connor, Alison Krauss, Van Morrison.

“Chronicles” é um corrupio de jigs e reels generosos, entregues por uilleann pipes (da família das gaitas de foles), harpa, bodhrán (instrumento de percussão), concertina, flauta. É música irlandesa a gostar dela própria.