A depressão é uma doença e o diagnóstico não é subjetivo

Convém estar atento a vários sinais

Não é um sinal de fraqueza emocional, nem de debilidade psicológica. É um dos problemas de saúde mental mais comuns e as queixas têm de ser ouvidas e valorizadas. António Raminhos é o embaixador de uma campanha sobre o assunto.

Não há uma só causa, não há um único sintoma, não é fácil entender as razões. A perturbação depressiva é um dos problemas de saúde mental mais comuns. Segundo o relatório “Saúde mental em tempos de pandemia”, divulgado em janeiro deste ano, 27% dos inquiridos indicaram ter sintomas moderados a graves de ansiedade e 26% sintomas de depressão. Portugal é o segundo país da Europa com as taxas de prevalência mais elevadas em doenças psiquiátricas.

“Trata-se de uma doença de etiologia multifatorial e, portanto, não é conhecida uma causa única que a desencadeie. Pensa-se que diferentes fatores influenciem de maneira variável o seu aparecimento e a sua evolução, como acontece com outras doenças”, adianta Dulce Maia, médica psiquiatra, diretora do Serviço de Psiquiatria do Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro.

Há fatores genéticos. É uma patologia mental que aparece mais vezes nas mesmas famílias e com transmissibilidade genética que ainda não é completamente conhecida. Há fatores ambientais. “Destaque para o meio familiar, social e laboral e para a existência de determinados acontecimentos de vida negativos que em muitas situações funcionam como trigger [gatilho] para o espoletar da sintomatologia depressiva.”

Em termos biológicos, verificam-se “alterações cerebrais e bioquímicas com desregulação neuroquímica e consequente alteração da funcionalidade de vários neurotransmissores cerebrais, com destaque para a serotonina.” Para Dulce Maia, é importante que as pessoas tenham consciência de que a depressão pode afetar qualquer pessoa de qualquer faixa etária, em qualquer fase da vida, e que se deve falar desta doença sem rodeios.

Em Portugal, estima-se que cerca de 700 mil pessoas vivem com sintomas depressivos

A campanha “Depressão sem rodeios” está no terreno para reduzir o estigma e a desvalorização da doença, alertando para a necessidade de procurar ajuda médica atempadamente. Todos os que sofrem desta doença podem recuperar a sua vida normal e voltar a ser quem eram. O humorista António Raminhos é o embaixador desta iniciativa com o mote “A depressão é mais do que um estado de humor”, promovida pela Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental, Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, a FamiliarMente, Federação Portuguesa das Associações das Famílias de Pessoas Com Experiência de Doença Mental, a associação para a promoção da saúde mental Manifestamente. Uma campanha feita com ações de divulgação, um website, um Vox Pop, spots de vídeo nos cinemas e na televisão, um ciclo semanal de podcasts, mini curtas-metragens, muppis e distribuição de flyers em locais públicos.

Tristeza, ansiedade, desespero, perda de interesse, culpa, apatia, pessimismo, são alguns sinais de alarme

Convém estar atento a vários sinais. Cansaço, falta de energia, alterações do sono, desconforto gastrointestinal, alterações de apetite, dores de cabeça, disfunção sexual. Falta de concentração, dificuldade em planear, indecisão, lapsos de memória, raciocínio lento. Tristeza, ansiedade, apatia, pessimismo.

“Os sintomas mais relevantes incluem a tristeza (permanente ou quase permanente), choro fácil, a anedonia (perda do interesse e da vontade em realizar atividades que anteriormente eram consideradas agradáveis), variação do ritmo habitual de sono (com insónia ou hipersónia), variação do apetite e do peso, falta de energia, fadiga, dificuldade de concentração e de tomar decisões e até ideias de morte”, refere Dulce Maia.

Ao contrário do que se possa pensar, o diagnóstico não é subjetivo, mas clínico. “O que significa que se fundamenta na avaliação correta dos sinais e sintomas apresentados pelo paciente, da forma como se iniciaram e da sua evolução, da sua repercussão na funcionalidade do doente e de vários outros aspetos que os psiquiatras têm em conta. Existem vários exames auxiliares do diagnóstico, sobretudo analíticos, que podem ser necessários para exclusão de outros diagnósticos diferenciais.”

A depressão tem tratamento. O primeiro passo é procurar ajuda especializada. O tratamento passará pela prescrição de um fármaco antidepressivo aliado ao acompanhamento psicoterapêutico. Portanto, é muito importante a deteção precoce de sintomas, a procura de ajuda e o início de tratamento adequado, o mais rápido possível.

“Relativamente ao tratamento, uma das principais mensagens a transmitir é que atualmente os antidepressivos têm muito menos efeitos secundários e que os efeitos que têm, são mitigáveis; explicar ainda que não causam habituação e que não têm necessariamente de ser tomados para o resto da vida.” A médica psiquiatra insiste em vários pontos que fazem a diferença. “A depressão deve ser encarada como uma doença, para a qual existe tratamento e que não deve ser desvalorizada nem estigmatizada pela sociedade.”