Rabanetes, lagartas, patins. As tradições de Natal são o que são

Um boneco que faz cocó nos presépios da Catalunha, em Espanha. Esculturas feitas com uma viçosa hortaliça no México. Decorações em forma de picles nos Estados Unidos. Vassouras escondidas na Noruega. Rodas nos pés na Venezuela. O Natal podia ser igual em todo o lado? Podia, mas não era a mesma coisa.

Cada país, suas cabeças, suas gentes, suas crenças. A festa que celebra o nascimento de Jesus para os católicos é vivida em família, com alegria, com uma série de preceitos mais antigos ou mais modernos. E estranhos costumes também. Mudam-se os tempos, mantêm-se as tradições de Natal. Mesmo as mais bizarras.

Em Espanha esconde-se o “caganer” entre as personagens mais ortodoxas do presépio

Espanha, aqui ao lado, tem alguns costumes pouco convencionais. Na Catalunha há presépios com um pequeno boneco de cócoras a fazer cocó. É o “caganer”, que normalmente assume a cara de pessoas conhecidas – políticos, jogadores de futebol, famosos espanhóis. De calças arriadas, o boneco é colocado em segundo plano, meio escondido entre as personagens principais. O desafio, para crianças e adultos, é descobrir o “caganer”, e quem é, nos presépios mais estranhos da Catalunha. A tradição não nasceu como protesto ao Governo, mas sim como um símbolo de fertilização da terra e de prosperidade, num costume que vem do século XVIII. Os catalães juntaram o agradável ao divertido e o boneco, que pode ser uma brincadeira ou um ódio de estimação, está para ficar, apesar de Barcelona ter tentado, em vão, banir o boneco que também se escondeu em decorações natalícias na cidade.

O “Caga Tió” é outra tradição espanhola. Esvazia-se um tronco de uma árvore para enchê-lo de doces, nozes e frutas cristalizadas nas duas semanas antes do Natal. Durante este tempo, o tronco é tratado com todo o carinho, há até quem o vista com roupa feita à medida. No dia 25, bate-se o tronco com um pau para esvaziá-lo do seu conteúdo, isto é, para “aliviá-lo” das iguarias.
E com comida, com uma hortaliça, neste caso, se faz uma das mais belas e inusitadas exposições natalícias em Oaxaca, no México.

O “Caga Tió”, também espanhol, é um tronco recheado de guloseimas que se esvazia no Natal

Os rabanetes mexicanos, grandes e pesados, são esculpidos com arte e mestria para criar cenários natalícios e não só. Presépios, a viagem e chegada dos reis magos, a Virgem de Guadalupe, figuras folclóricas, o que a imaginação conseguir fazer com o vegetal.

Dia 23 de dezembro é a Noite dos Rabanetes em Oaxaca, com esculturas e prémios numa tradição que remonta a 1897. Reza a história que os vendedores de legumes e frutas do mercado local, nesse dia 23, decidiram tornar as bancas mais chamativas com figuras esculpidas na raiz que estava mais à mão. Os clientes gostaram e levaram para casa as nunca antes vistas esculturas de rabanetes que se aguentam há mais de um século.

Picles são escondidos em árvores natalícias para testar a atenção das crianças em algumas zonas dos EUA

Picles, sim picles também, ou melhor, ornamentos em forma de picles camuflados na árvore de Natal de uma zona da América. A primeira criança a encontrar os picles decorativos na manhã de Natal ganha um doce. Não se sabe bem de onde veio esta tradição, pensa-se que terá sido levada da Alemanha para algumas regiões do Centro-Oeste dos Estados Unidos.

A maioria dos alemães desconhece este novo uso dado aos picles, mas famílias americanas não largam a brincadeira.

Pele de baleia crua e frango frito?

Grýla, no folclore islandês a mãe das 13 personagens que visitam as crianças nas 13 noites que antecedem o Natal

Também há brincadeira e um dilúvio de livros no Natal na Islândia. A época é sinónimo de literatura e a tradição manda oferecê-los. E, em viagem pelo país, nas 13 noites que antecedem o Natal, 13 personagens irrequietas e travessas – como o perturbador de ovelhas, o lambedor de colheres, o ladrão de velas – vestidas com trajes típicos colocam prendas nos sapatinhos das crianças que se portaram bem e batatas podres no calçado dos meninos e meninas que se portaram mal.

Na Venezuela, país a ferro e fogo, as festas de Natal começaram antes do habitual. A 1 de novembro, Nicolás Maduro abriu as hostilidades, autorizando o gasto de 11 milhões de euros para 13 500 toneladas de pernil de Natal, e mandou iluminar a cruz no monte Ávila, em Caracas, um mês antes do costume. Neste país, mergulhado numa crise política e social, patina-se no Natal, antes e depois da missa matinal do dia 24. Skate, bicicletas e patins em linha tornam-se o meio de transporte mais utilizado nesta época. Há bairros que organizam as “patinatas”, para patinar à vontade, e festivais para crianças andarem sobre rodas. As ruas são fechadas ao trânsito para que a tradição seja cumprida em segurança.

Na África do Sul deliciam-se com lagartas fritas

A ceia de Natal costuma ser farta e adaptada à gastronomia. Na Noruega, a cabeça de cordeiro assada é uma iguaria natalícia (e, já agora, neste país escondem-se as vassouras na véspera de Natal para afastar bruxas e espíritos maus). As lagartas fritas fazem parte do menu da época na África do Sul, e pele crua de baleia e carne fermentada de aves marinhas são pratos festivos na Gronelândia.

No Japão não há Natal, há sim Dia dos Namorados e a tradição de comer frango frito no dia 25 de dezembro. Não é Natal, não, mas é uma tradição que ganha raízes neste país.

Se há superstições em tantos momentos, o Natal não é exceção. Na Áustria, no Dia de Santa Bárbara, 4 de dezembro, gente solteira e não só que quer saber do futuro coloca um galho de cerejeira, apenas um, num copo com água. Se antes da noite de Natal uma flor brotar é sinal de casamento próximo e de boa sorte na vida. Na Ucrânia, a sorte pode estar numa aranha na árvore de Natal. Uma superstição associada à lenda de uma aranha que ouviu as lamentações de uma viúva sem dinheiro para decorar a sua árvore. O bicho entrou em ação e teceu as suas teias à volta do pinheiro.

Natal é festa, é família. No sábado anterior à véspera de Natal, a cidade de São Fernando, nas Filipinas, transforma-se num gigante festival de lanternas que atrai gente de todo o Mundo. Os filmes de Natal são um clássico e na Suécia, na tarde do dia 24, as famílias juntam-se frente à televisão para o especial da Disney. Às três da tarde, no mesmo canal, há 60 anos. No Natal, também há coisas que não mudam.