Texto de Alexandra Tavares-Teles
No dia 4 de janeiro de 2019, Miguel Macedo resumiu os “dias negros” vividos numa palavra. “Canalhice” – “Esta foi a resposta às canalhices que me fizeram nos últimos quatro anos”, disse.
Acabava de deixar a sala do tribunal de primeira instância absolvido dos crimes (prevaricação de titular de cargo político e tráfico de influência) de que estava acusado, no âmbito do processo dos vistos Gold, iniciado em 2015.
“Dias negros” vividos em silêncio, testemunhados apenas por familiares e amigos próximos. “Muita tensão, muita indignação, a vida pessoal e política arruinada, um tempo muito duro com naturais dificuldades financeiras, porque o Miguel não é um homem rico”, revela Marques Mendes, amigo antigo.
Não foi fácil ao social-democrata manter o silêncio. “Houve momentos muito difíceis em que achei que estava a fazer mal”, confessa. Porém, nem a divulgação pública do interrogatório judicial nem “a despersonalização sentida diante do pelotão de execução digital” o levaram a ceder à tentação. Agora, quer abandonar a vida política e retomar a atividade profissional. Passar mais tempo com a única filha, engenheira, que vive nos Estados Unidos. “A política é um capítulo encerrado.”
“A política é um capítulo encerrado.”
A decisão tomada contraria Marques Mendes. “Tem a política entranhada, passado e futuro político. Não fosse o processo judicial e podia ter sido líder do partido.” Estatuto “fortíssimo, granjeado como secretário-geral, como líder parlamentar e como ministro da Administração Interna”.
Macedo responde: “Se alguma vez tive essa ideia [a de ser líder], perdi-a quando fui secretário-geral do PSD no tempo de Marques Mendes. Foram dos piores anos da minha vida política”, revela, numa alusão a guerrilhas internas. Algumas delas protagonizadas por Luís Filipe Meneses. “Sobre Miguel Macedo, fui falando ao longo destes últimos quatro anos. Ao contrário de outras pessoas, que só falam agora. Por isso, não vou acrescentar mais nada”, diz o sucessor de Marques Mendes na presidência do partido.
Marques Mendes conhece Macedo há mais de 40 anos. Dois anos mais velho, também frequentou a Universidade de Coimbra. Recorda esse tempo, em que o amigo era igualmente dirigente da Associação Académica: “Pensava com um pensamento muito estruturado para tão pouca idade”. Porém, “não era aborrecido nem chato”. Pelo contrário: “Humorado, com interesses muito diversificados”, do desporto à literatura e ao cinema.
A política acima de tudo: deputado com muito trabalho produzido, vereador da Câmara de Braga, líder parlamentar do PSD, ministro da Administração Interna de Passos Coelho. Fernando Alexandre, seu secretário de Estado, dá conta de um político “metódico, corajoso, um social democrata que manteve com a troika uma relação complicada”. Alguém que “não teme ninguém”.
“Se alguma vez tive essa ideia [a de ser líder], perdi-a quando fui secretário-geral do PSD no tempo de Marques Mendes. Foram dos piores anos da minha vida política”.
Nasceu em Braga, passou a infância e adolescência em Moçambique, na liberdade e informalidade próprias de África, e com o desejo precoce de seguir advocacia. Filho de um funcionário das Finanças e de uma professora, primogénito de três irmãos.
Excelente aluno liceal, capaz de arrancar 18 valores a matemática, guarda desses anos a admiração por Churchill, de quem coleciona biografias. Apreciador de cinema e de gravatas, acessório dispensado no dia em que se viu absolvido. Sem gravata e de braço ao peito, partido a jogar futebol (estava à baliza). Adepto do F. C. Porto, é apaixonado por motas e por carros. Pela velocidade. “Mas sou cumpridor”, ri.