Gustavo Carona: médico sem fronteiras

Texto de Pedro Emanuel Santos

O que leva um jovem médico a largar tudo e partir para missões humanitárias nos locais mais perigosos do planeta? “A paixão pelo privilégio de poder ajudar os outros.” A pronta resposta está na ponta da língua de Gustavo Carona, 38 anos, natural do Porto, clínico com especialidade em anestesia e cuidados intensivos, e autor do livro “O Mundo Precisa de Saber”, obra que compacta relatos impressionantes vividos na primeira pessoa em cenários delicados e que tem prefácio assinado por Jorge Sampaio, ex-presidente da República.

Gustavo Carona fala com a “Notícias Magazine” a partir do Burundi, onde participou na 11.ª missão em dez anos. Em fevereiro vai para o Iémen, em abril tem viagem marcada para a Faixa de Gaza, na Palestina. Um corrupio de destinos em que a presença de um médico é garantia de muitas vidas salvas.

“Não o trago comigo [o cachecol do F. C. Porto] por clubite, mas porque olho para ele e vejo a minha cidade. Representa a família e os amigos, o meu mundo”.

Antes do Burundi, primeiro com os “Médicos do Mundo” depois com a “Médicos Sem Fronteiras”, Gustavo passou por Moçambique, Congo, Paquistão, Afeganistão, República Centro-Africana, Síria, Iraque, de novo pela República Centro-Africana, outra vez pelo Congo. Está tudo compilado em “O Mundo Precisa de Saber”, testemunho escrito de “que todas as pessoas têm uma vida com o mesmo valor que a nossa.”

O único ponto comum nas missões do médico portuense, além dos cenários de miséria e destruição, é um… cachecol do F. C. Porto. “Não o trago comigo por clubite, mas porque olho para ele e vejo a minha cidade. Representa a família e os amigos, o meu mundo”, descreve.

Nas paragens que pisou, Gustavo Carona viu ao vivo o que muitos só conhecem daquilo que assistem pelo conforto da televisão. “Miséria, catástrofes humanitárias, guerras, bombardeamentos, sofrimento. Enfim, o contacto permanente com populações que estão a sofrer”, resume.

“Se alguma vez a ideia de desistir me passou pela cabeça foi, apenas, pela frustração de não conseguir sentir-me tão útil como gostaria.”

O medo está sempre presente, seja durante uma operação que decorre enquanto aviões sobrevoam baixo o hospital, seja numa consulta mais rotineira numa aldeia remota de África. “Só não tem medo quem não for consciente, está sempre lá.”

Nada que demova Gustavo Carona do sentido de missão que encarna com devoção, entrega e humildade. “Se alguma vez a ideia de desistir me passou pela cabeça foi, apenas, pela frustração de não conseguir sentir-me tão útil como gostaria.” A rota que abraçou em 2009, essa, continua firme: levar humanidade e esperança onde a palavra dignidade há muito deixou de fazer sentido.