Texto Ana Pago | Fotografia Arquivo DN
Aquela passagem de ano de 1982 é bem capaz de ter sido a mais emocionante para Sérgio Godinho. Havia amigos por perto. Felicitações. Uma alegria contagiante a esperá-lo no aeroporto de Lisboa, ao acabar de aterrar vindo do Rio de Janeiro, após ter estado 33 dias preso numa espécie de segundo round do processo de 1971 – altura em que o Brasil o encarcerou pela primeira vez, durante dois meses, por atuar na companhia revolucionária Living Theatre.
Ao que parece, uma década depois, a ditadura ainda não lhe tinha perdoado ser um espírito livre. Nem ele estava preparado para entregar os pontos sem luta.
«O cantor regressou ontem disposto a solicitar a anulação da medida de expulsão que lhe foi imposta pelas autoridades brasileiras, caso a sentença do julgamento – que prossegue os seus trâmites no Rio de Janeiro – seja a absolvição que espera», noticiava o Diário de Notícias de 1 de janeiro de 1983.
Tão grande como a vontade de entrar de novo em estúdio para gravar era a esperança que Sérgio Godinho trazia na revogação daquela medida administrativa para quando o acusaram de posse de droga e o prenderam, apesar dos esforços da diplomacia portuguesa e da comunidade artística brasileira.
«Só a absolvição pode representar, em princípio, uma reparação para a injustiça de que foi vítima», escrevia ainda o DN, solidário com o tempo «perturbador e traumatizante» que Sérgio Godinho passou atrás das grades. Ainda assim, nem tudo foi espinhoso no cativeiro: «O artista pensa que representou simultaneamente uma “experiência muito enriquecedora”, pois conheceu gente de todos os géneros e pôde compor alguns novos temas.»