Texto de Ana Patrícia Cardoso | Fotografias de Sara Matos/Global Imagens
O concerto de quinta‑feira, final de agosto, é em Coimbra. A viagem é curta desde Lisboa, mas é o tempo de adiantar a edição de músicas no computador. Na noite anterior estiveram em estúdio a gravar um tema novo e os ajustes são feitos autoestrada acima. Falam sobre canções, dos filhos pequenos, das melhores fraldas, das festas de aniversário. E dos ténis do Frederico. A conversa vai mudando até que todos passam pelas brasas.
Héber Marques (vocalista), Joel Silva (baterista), Joel X.(guitarrista), Daniel Lima (teclista) e Frederico Martinho (guitarrista) estão habituados à estrada, são muitos quilómetros desde que os HMB começaram, já lá vai uma década. Se os anos da Héber Marques Band se contam pelos dedos, o caminho que fizerem juntos também dá uma mão-cheia de histórias e reviravoltas.
Por ser a força criativa, pareceu‑lhes natural que o grupo se chamasse Héber Marques Band (HMB). «Começámos muito novos, eu, o Joel S. e o Daniel. Tínhamos 20 e poucos anos e só queríamos fazer música.»
Antes de fazerem o soundcheck, uma paragem na tenda de apoio. Pausa para um lanche rápido e a oportunidade perfeita para um regresso ao passado. Entre gargalhadas, voltam a 2007. Além da música, partilham a mesma fé e foi nesse ano que tudo começou. Filho de pais cristãos evangélicos, Héber cresceu na igreja e começou a cantar ainda adolescente.
Apesar da inclinação para o futebol, a música foi ganhando espaço e, por intermédio do pianista Ruben Alves, gravou o primeiro CD de música evangélica. «Na altura, em 2007, o Héber mostrou‑nos algumas letras que tinha escrito que não eram tão ligadas à religião e daí surgiu a ideia de criarmos uma banda», diz Joel S.
Por ser a força criativa, pareceu‑lhes natural que o grupo se chamasse Héber Marques Band (HMB). «Começámos muito novos, eu, o Joel S. e o Daniel. Tínhamos 20 e poucos anos e só queríamos fazer música.» O outro Joel, o X. [de Xavier] veio depois e houve outros guitarristas antes de Fred.
«Hoje é o dia D», «o amor é assim, pelo menos p’ra mim» ou «não me leves a mal, mas não vais estragar o que está bom para mim», são versos de canções dos HMB que praticamente toda a gente já ouviu na rádio, na publicidade ou em novelas.
«Não foi um percurso simples. Tivemos algumas dores de crescimento e foi preciso perceber que a estrutura que tínhamos não era a que precisávamos para crescer.» O primeiro álbum, HMB, foi lançado cinco anos depois, em 2012. Estava dado o passo definitivo para o grupo. Ao misturar estilos diferentes como gospel, jazz, hiphop, R&B ou soul, a banda criou uma sonoridade própria, marcada por letras que ficam no ouvido e ritmos que dão vontade de dançar.
A fórmula não foi planeada mas acabou por resultar e Prince teve um papel importante nesse processo. «Ele fazia músicas que nós quase instantaneamente decorámos. Manteve o mesmo estilo ao longo de toda a carreira e sempre buscou a sonoridade que quis», diz Héber.
«Hoje é o dia D», «o amor é assim, pelo menos p’ra mim» ou «não me leves a mal, mas não vais estragar o que está bom para mim», são versos de canções dos HMB que praticamente toda a gente já ouviu na rádio, na publicidade ou em novelas. O Amor É Assim, dueto com Carminho, é o maior sucesso até hoje e valeu‑lhes o Globo de Ouro para Melhor Canção, atribuído pela SIC em maio deste ano. «Quando gravámos a música e ouvimos a versão final, as opiniões dividiram‑se.
O ano de 2014 foi difícil. Com poucos concertos e divergências com o manager da altura, o grupo fez um interregno que «acabou por ser absolutamente essencial».
Uns não acreditavam que era um som que nos representasse. Mas a verdade é que sabemos que esta é uma música que vamos cantar daqui a dez anos. E não há problema, todos os cantores têm estes sucessos e é sinal que marcou um momento», justifica Fred. Héber brinca que «muitas vezes as pessoas conhecem a música antes de nos conhecer. Eu já me apresentei como o cantor d’O Amor É Assim.» Joel S. dispensa a falsa modéstia. «Eu sabia que íamos ganhar. Tinha de ser, foi o ano dessa música.»
A verdade é que, se recuarmos três anos, os cinco estavam longe de imaginar subir ao palco para receber o galardão. O ano de 2014 foi difícil. Com poucos concertos e divergências com o manager da altura, o grupo fez um interregno que «acabou por ser absolutamente essencial».
«Vivíamos esse momento em que não sabíamos bem qual o nosso caminho e o Fred – que é o mais otimista – convenceu‑nos a voltar aos bares, às origens, e tocámos no mês de agosto no Tokio, uma discoteca no Cais do Sodré. Foi incrível e deu‑nos uma perspetiva renovada», lembra o vocalista.
Foi este o ponto de viragem que os levou a mudar de manager e a consolidar a estrutura que se mantém até hoje. Desde então, não têm parado e tornou‑se cada vez mais difícil conciliar as ocupações paralelas que sempre tiveram. Joel S. é gestor de projetos na Nova base mas teve de reduzir o horário para part‑time.
Fred fundou a Musical Partners, uma empresa de trabalho freelancer para músicos que gere a partir de casa. Héber tem escrito e colaborado com outros artistas como David Carreira, Rita Guerra ou Matias Damásio – quem não ouviu Loucos, a música deste verão, com a colaboração de Héber?
Em Coimbra, entre uma afinação de guitarra e um ajuste no som, o grupo discute o alinhamento para o concerto dessa noite. Este é um concerto mais pequeno e começa mais cedo do que aquilo a que estão habituados. «Tocar às 21h30 é raro. Já chegámos a tocar às três da manhã. É muito duro.»
Na mesa do jantar, a equipa de 14 pessoas que acompanha o grupo bebe vinho tinto, coca‑cola ou água. Entre uma piada e uma garfada no lombo de porco, a conversa recai na família Carreira. Héber produziu algumas músicas para David, o filho mais novo de Tony Carreira. «Foi a primeira vez que fui para Paris e que entrei num estúdio com aquela dimensão.»
Com idades entre os 30 e os 35 anos, os cinco estão casados e apenas Daniel – ainda – não tem filhos. Se não têm trabalho no fim de semana, é garantido que podemos encontra‑los, ao domingo, no Centro da Comunidade Cristã, no Cacém.
Acabou por conviver com o pai também, de quem guarda boas lições profissionais. «O Tony é das pessoas que entendem melhor este mercado. Ele sabe perfeitamente como gerir a imagem e a carreira, é incrível. Pudemos conversar sobre família, religião, trabalho e eu percebi porque ele é quem é há tanto tempo.» Tal como acontece antes de qualquer espetáculo, o grupo junta‑se em oração. «Este momento é muito importante, a nossa fé está presente em tudo o que fazemos», diz Joel S.
O facto de quatro membros (excluindo Fred) estarem ligados à igreja acabou por moldar a postura do grupo. «Somos uma banda familiar, valorizamos muito esse lado. Quando os concertos acabam, queremos voltar para casa. Não somos um grupo com “maus hábitos”.»
Com idades entre os 30 e os 35 anos, os cinco estão casados e apenas Daniel – ainda – não tem filhos. Se não têm trabalho no fim de semana, é garantido que podemos encontra‑los, ao domingo, no Centro da Comunidade Cristã, no Cacém. O grupo é muito acarinhado por todos e há quem tenha T‑shirts dos HMB. Para Héber, a questão da fé «já é vista de outra forma, as pessoas já não escondem a crença. E quem vai à igreja percebe que é um ambiente descontraído, de união».
Quem chega pela primeira vez ao espaço na Rua da Bela Vista, em São Marcos, no Cacém, pode ficar surpreendido. Não é a imagem de igreja a que estamos habituados. Uma estante de livros na entrada, junto de uns sofás, lembra a sala de casa. E é esse o espírito que ali se vive. Na cozinha, algumas mulheres vão organizando toda a comida trazida. «Começámos com chá e bolachas e hoje temos este banquete. Organizamo‑nos por turnos e cada família fica responsável.»
Com mais de sessenta espetáculos até ao final do verão, estão prestes a terminar a tour do álbum Mais, o terceiro disco, lançado em fevereiro.
O pequeno Lucas, o filho mais novo de Héber, com 5 meses (a irmã tem 3 anos), vai mudando de colo e fazendo as delícias de quem o vê enquanto as outras crianças correm entre os sofás. No primeiro andar está a sala das crianças. «Criámos Esta sala quando estão cansadas ou com birra durante a oração.» Héber acompanhou todo o processo de reconstrução do espaço, onde antes era um armazém. «Era um barracão abandonado que nos foi doado.» Hoje, é um espaço de encontro onde a fé é cantada e celebrada.
Vozes e instrumentos afinados, os cinco sobem ao palco. Os mais novos que conseguiram chegar à fila da frente sabem todas os temas, repetem os refrães com entusiasmo. Os pais sabem as letras, também dançam e aplaudem. A plateia tem idades para todos os gostos, há casais abraçados e carrinhos de bebés. Com passos de dança repetidos em várias músicas, a banda diverte‑se em palco. E fora dele também.
Momentos antes de entrarem, estavam a ouvir música e a ensaiar no camarim. Com mais de sessenta espetáculos até ao final do verão, estão prestes a terminar a tour do álbum Mais, o terceiro disco, lançado em fevereiro. «Antes, tocávamos à terça‑feira no Tokio, agora é o dia que temos para descansar», diz Daniel.
Depois do concerto, assinam autógrafos e tiram fotografias com os fãs. Já é tarde e o grupo divide‑se. Daniel e Joel X. resistem ao cansaço e regressam a Lisboa para estar com a família. Afinal, «o amor é assim», não é?
ROCK IN RIO
No ano em que os HMB comemoram uma década, surgiu o convite para representar Portugal no Rock In Rio, no Rio de Janeiro. A 17 de setembro sobem ao palco com Carlão e Virgul, ex‑membros dos Da Weasel, agora com carreiras a solo. Além dos sucessos que já conhecemos, os três portugueses estão a preparar um tema em conjunto para o público brasileiro. Por cá, a comemoração dos dez anos estende‑se aos grandes palcos, com espetáculos no Coliseu do Porto a 17 de novembro e no Campo Pequeno, em Lisboa, a 24 de fevereiro.