Alimentação: a genética determina que dieta devemos seguir

Texto de Sara Dias Oliveira | Fotografia de Shutterstock

De que falamos quando falamos sobre os últimos avanços na área da nutrição? Pedro Bastos, mestre em Nutrição Humana, professor convidado do mestrado de Medicina Funcional da Universidade de Western States, nos Estados Unidos, revela o que anda a acontecer à nossa volta.

Desde logo os avanços na área da genética e epigenética mostram que não existe uma dieta igual para todos. A dieta tem de ser personalizada. Até porque já sabemos que a reação aos nutrientes varia de pessoa para pessoa, de acordo com o seu genótipo.

«Sabe-se que algumas pessoas parecem responder melhor a uma dieta com mais hidratos de carbono e menos gordura e outras a mais gordura e menos hidratos de carbono. Do mesmo modo, algumas pessoas necessitam de maior quantidade de uma determinada vitamina ou mineral e outras deverão ingerir uma quantidade menor», diz o professor.

A alimentação e o estilo de vida da mulher antes e durante a gravidez podem condicionar a saúde dos filhos durante a vida.

A dieta e o estilo de vida da mulher antes e durante a gravidez afetam a saúde da criança ao longo de toda a sua vida, porque podem causar alterações epigenéticas que perduram no tempo.

«Por exemplo, durante a ocupação nazi na Holanda, no inverno e primavera de 1944, várias pessoas (incluindo mulheres grávidas) foram forçadas a ingerir apenas 400-800 calorias por dia, o que é manifestamente insuficiente para a mãe e para o bebé. Anos mais tarde observou-se que essas crianças tinham maior prevalência de obesidade, dislipidemia, intolerância à glucose, doenças cardiovasculares e até esquizofrenia», adianta o especialista que, neste momento, está a fazer doutoramento em Nutrição Clínica na Universidade de Lund, na Suécia, onde está filiado como investigador.

Há outros estudos com conclusões semelhantes e hoje há várias linhas de investigação em modelos animais para tentar perceber de que forma a dieta da mãe e também a do pai, antes da fecundação, interferem na saúde da prole.

Prescrever um suplemento de cálcio a uma mulher na menopausa, ácido fólico a uma grávida ou suplemento de vitaminas C e E para quem pratica exercício físico? Esta visão está a mudar.

Há 10 anos, os nutrientes eram pensados e analisados de forma isolada. Agora já não. Não há muito tempo prescrevia-se suplemento de cálcio a uma mulher na menopausa, ácido fólico a uma grávida e recomendava-se suplemento de vitaminas C e E a quem pratica exercício físico.

«Essa visão reducionista está a mudar radicalmente. Hoje, o foco é a inter-relação entre nutrientes, pois estes não atuam isoladamente, mas sim em sinergia (ou até em antagonismo) e, nesse sentido, passou-se dos suplementos para os alimentos, pois sabe-se que estes são bem mais complexos do que a soma de nutrientes e compostos bioativos que contêm», sublinha.

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E se houve um tempo em que o papel dos vários microrganismos existentes no nosso trato gastrointestinal, a microbiota intestinal, na saúde se confinava ao intestino, agora olha-se mais além, ou seja, para todo o organismo.

A dieta influencia a flora intestinal que pode afetar o sistema imunológico, o metabolismo, as hormonas e até mesmo o funcionamento do sistema nervoso. «Existe há evidências de que a microbiota pode afetar o risco e progressão de doenças autoimunes, alergias, diabetes tipo II, doenças cardiovasculares e até de alguns tipos de cancro».

A dieta influencia o trato gastrointestinal que pode afetar o sistema imunológico, o metabolismo, as hormonas e até o sistema nervoso.

«Hoje já não é possível pensar nos efeitos dos alimentos na nossa saúde sem pensar primeiro no impacto que os mesmos têm na nossa microbiota e no efeito que esta tem na absorção e metabolização dos nutrientes existentes nesses alimentos.»

Dieta inadequada, sedentarismo, alteração dos padrões de sono e de exposição solar, stress crónico, isolamento social e exposição a vários poluentes, são alterações do estilo de vida moderna que, segundo a ciência, aumentam a incidência e prevalência de doenças degenerativas crónicas como diabetes tipo II, doenças cardiovasculares, doenças autoimunes e neuropsiquiátricas, e vários tipos de cancro.

«Assim, a sua prevenção (e possível reversão) deveria focar-se sobretudo em alterações comportamentais profundas e não (apenas) na inibição ou ativação da via molecular X ou Y, através de uma determinada molécula (leia-se fármaco ou nutriente), até porque se trata de um fenómeno demasiado complexo para ser alvo de soluções reducionistas», diz Pedro Bastos.