Novos recomeços

Notícias Magazine

Em vésperas de tornar um novo álbum público, as borboletas no estômago e os bichos-carpinteiros unem esforços para se assegurarem de que não coma, durma ou sossegue com jeito.

Pode parecer tolice. Afinal, não passa de música. Não irá inventar as viagens no tempo ou curar uma doença grave. Não dá de comer a quem tem fome, não resolve os problemas do dia-a-dia, entre a chave que se perde e o patrão mal-educado a chatear. Não tem, portanto, uma finalidade prática, ou mesmo teórica. Não resolve as grandes questões filosóficas e espirituais da Humanidade.

Parece que a música só serve mesmo para entreter, entre um pôr do Sol num bar de praia e mais uma viagem até ao trabalho. Até podia ser que tudo isto fosse verdade, mas não é.

As viagens que eu fiz no tempo ao ouvir algumas canções, os inícios de depressão que curei ao som de uma voz, guitarras, piano e bateria. A fome de mundo e de vida que eu tinha quando miúda e que apaziguei ao ouvir as histórias que me cantavam as colunas do rádio. As vezes que eu não insultei um patrão imbecil cuspindo a letra de uma canção certeira ou me acalmei quando tudo parecia correr a meu desfavor ao ouvir aqueles acordes mágicos.

A música abriu-me o coração ao mundo e a cabeça ao pensamento e fez que um e outra trabalhassem em parceria, coisa que acontece raramente e de forma muito contrariada. Posso não ter resolvido as grandes questões filosófico-espirituais da Humanidade, mas fui resolvendo as minhas e isso já não é pouco.

Talvez assim possam compreender o que me tira o sono, em vésperas de lançamento de novo trabalho. Está ali não apenas um conjunto de notas musicais ligadas a palavras ditas. Está ali uma parte de mim, a melhor parte de mim.

Está ali um convite que é feito a quem ouve as canções para pegar nelas e andar pela vida com elas. Vivê-las, retirar-lhes o sumo, deixar que elas possam ajudar a vencer desafios, ultrapassar dificuldades, mitigar dores e quantos mais verbos e complementos quiserem e puderem imaginar.

A música faz-me feliz e por isso sofro tanto quando a mostro ao mundo. Na esperança (vã?) de que possa fazer a diferença no mundo de alguém, como fez no meu.

[Publicado originalmente na edição de 7 de fevereiro de 2016]