NÃO GOSTO DE VOTOS e promessas e resoluções de Ano Novo. Gosto de motivos para mudar de atitude, razões para mudar de rumo, pretextos para mudar comportamentos. Mas não gosto de fazer alarido disso. E não me refiro a bradar aos quatro ventos ou a tatuar uma lista de objetivos no braço. Para fazer alarido, basta relacionar esses momentos de «Agora é que é!» com um dia marcante como o 1 de janeiro. Fazer isso numa data específica, associado a uma efeméride como a que vai ocorrer daqui a dois dias, é o equivalente a convocar a fanfarra dos bombeiros e encomendar três toneladas de fogo-de-artifício. Se envolver champanhe e passas, então, é meio caminho andado para não ter vontade de desejar nada de importante. Apenas uma boa noite de copos e uma manhã tranquila, sem ressaca.
SE TIVER DE FAZER ALTERAÇÕES daquelas que implicam pensar que «doravante vai passar a ser assim» (ou «assado»), prefiro fazê-las de mansinho. Discretamente. O dia D, o momento zero que marca a fronteira entre o antes e o depois, não pode estar associado a nada marcante. Não deve. Caso contrário, se a coisa falhar, o peso do fracasso será muito maior. Enfim, é uma mania. Cada um tem as suas. Eu tenho esta. E quer-me parecer que não devo estar sozinho nisto.
NO ENTANTO, GOSTO DE BALANÇOS. De olhar para trás e pensar nas coisas boas e más. Nas que marcaram, que deixaram mossa, que implicaram mudanças. E, nesse capítulo, 2014 foi um ano bom. Foi o ano em que fui pai pela segunda vez. E isso, caramba, parece-me um bom motivo para enaltecer as qualidades de um conjunto de 365 dias a que chamamos ano. A minha filha Madalena não me fez a vontade e resolveu esperar por janeiro para finalmente se dar a conhecer. Eu achava piada à ideia de ter uma filha de 2012 e outra de 2013. Já que tenho duas, de seguida, ao menos que fossem em anos consecutivos. Mas ela insistiu em não nos virar as festas do avesso. E fez questão de passar a ter uma data de aniversário separada do Natal em duas semanas. Convenhamos: Jesus era competição pesada.
AGORA QUE ESTE 2014 ESTÁ QUASE NO FIM, a poucos dias do primeiro aniversário dela, dou por mim a fazer o balanço desse ano de vida e das dúvidas que tinha em dezembro de 2013. Passado este tempo, já aprendi que sim, que não deixamos de gostar nem um bocadinho de uma porque passamos a gostar também da outra. Aprendi que os meus dois braços conseguem trabalhar ao mesmo tempo para dar sopa a uma e arroz a outra. Aprendi que consigo pegar nas duas ao mesmo tempo se achar que isso as vai acalmar (não acalma, não se metam nisso!). Aprendi que é possível vestir um casaco de seis meses a uma criança de ano e meio e só dar por isso quando a mãe nos chama a atenção, meio divertida, meio desapontada. Aprendi que as chupetas não têm de ser todas esterilizadas. Aprendi que o que se aplica a uma pode não se aplicar a outra, porque elas são diferentes e é no respeito por essas diferenças que está também o meu papel de pai. Aprendi que isto cresce mesmo mais a cada dia que passa.
APESAR DE NÃO GOSTAR DE DESEJOS associados ao ano novo, há um, em particular, que gostaria de satisfazer. Em 2015, o ano em que vou chegar aos 40 anos, quero especialmente… dormir mais. Parece uma coisa menor, eu sei, mas aqueles de vocês que têm crianças pequenas, sobretudo se vieram seguidas, vão perceber bem isto. Em 2015 quero mais horas de sono. Só isso. O que vier a mais já será bom.
[Publicado originalmente na edição de 28 de dezembro de 2014.]