Histórias de Natal para nos aquecer a alma

Notícias Magazine

Na semana passada escrevi que Portugal era um país frágil, cuja lon­ga história, talvez precisamente por ser tão distante, não chega para alimen­tar o ego. Pelo menos um à altura das nossas memórias. Somos hoje muito de­pendentes do elogio vindo de fora, do que dizem de nós, esponjas do alheio. So­mos também ciclotímicos ao ponto de sermos, em momentos, os maiores do mundo – o bolo de chocolate é só mais uma excelente metáfora disto – e nos seguintes instantes, na cauda da fila, envergonhados. E somos, sobretudo, al­tamente introspetivos, uma caraterística de que este início de texto é um bom exemplo, e isso talvez nos venha simplesmente do facto de termos esta histó­ria toda atrás de nós.

Agora estamos, como diz o povo, na mó de baixo. Nas lonas, mesmo. À economia fragilizada juntou-se um ataque à nossa moral – e ao nosso moral – que terá consequências graves qualquer que seja o resultado. Neste Natal de reuniões familiares haverá discussões pela certa, opiniões divergentes e, apos­to, vários encolher de ombros. A estes não devemos sucumbir. E é para que não o façamos que serve também a edição de hoje da Notícias Magazine. «Ora lá es­tá ela outra vez a fazer jus ao nome da crónica: força anímica», dirá o leitor mais atento. É verdade, o título foi criado noutros tempos mais animados. Mas se não é força anímica o que temos nas páginas desta revista, então declaro já aqui que não sei o que é força anímica.

Para começar, o tema de capa: o renascer da joalharia portuguesa. So­mos joalheiros de tradição, mas nos últimos tempos soubemos adaptar-nos aos tempos. Desafiámos as convenções e tornámo-nos criadores modernos, desig­ners surpreendentes, ao mesmo tempo que aproveitámos os novos mercados, os que nos chegam naturalmente – angolanos, brasileiros – e os que vamos conquistando – os russos, os chineses. Com marcas próprias que assumimos, e de nomes difíceis como Anselmo ou mesmo Eleutério, agarrámos o que de melhor tinha a tradição conquistando o mundo do ouro e da prata.

Esta última marca anda desde 1925 a reinventar a filigrana, arte bem na­cional que já esteve representada no British Museum, em Londres, e no cora­ção de ouro oferecido ao Para João Paulo II, na sua visita a Portugal, em 1982. Para os mais céticos, resta dizer que são precisamente as peças com mais tra­dição – com a filigrana bem visível – aquelas que a marca melhor vende.

Mas, como bem conta a jornalista Ana Pago, também nesta área os pequenos negócios florescem, fruto do trabalho, da imaginação e da paixão que move os criadores individuais e lhes traz a recompensa – a joalheira Lilia­na Guerreiro, por exemplo, teve uma exposição no Museu de Arte e Design de Nova Iorque e já tem as suas peças espalhadas pelo mundo. Gabriela Styliano, uma ourives de 55 anos, viaja pelo mundo para conquistá-lo e já espalhou as suas peças da Áustria ao Canadá, passando por Moçambique ou Nova Zelândia.

Se fosse há uns tempos chamaríamos a tudo isto empreendedoris­mo. Hoje o termo passou de moda, embora continuemos a precisar dele, não só para sair desta crise como para nos modificarmos para sempre. Para ser­mos um país vivo e resistente. Mais forte e menos dependente. No ano passa­do contámos como era ter um Natal 100% português da árvore aos presentes. Este ano recuperámos a ideia, apenas nos presentes, sugerindo vários produ­tos nacionais cujas histórias merecem ser contadas. Tudo em prol da vossa for­ça anímica. Aproveitem. E tenham um bom Natal.

[Publicado originalmente na edição de 7 de dezembro de 2014]