Valter Hugo Mãe

Fernando Alvim


Rubrica "Cidadania Impura", de Valter Hugo Mãe.

A rádio portuguesa é marcada pela presença desse épico chamado “Prova Oral”. Aos 22 anos de existência, traduz a identidade de uma certa nação de ouvintes, um povo de gente que se propõe à boa-disposição com pertinência e franca simpatia. A longevidade da “Prova Oral” justifica-se pela energia sem par de Fernando Alvim, um dos homens mais benignos do humor nacional. O Alvim é naturalmente ávido de riso tanto quanto é naturalmente propenso à graça sem agressão. Uma graça com o atrevido necessário, e até bastante bravo, mas que jamais pretende vingar, destruir, julgar sem piedade o jeito dos outros.

Tenho regressado várias vezes à “Prova Oral” e conforta-me que persista na sua demanda de alegria numa tragédia contínua que é a vida. Conforta-me que persista debatendo sem preconceitos, misturando a importância dos assuntos com convidados de todos os quadrantes e todos os talentos, sem ter de preferir mais do que a decência e a vontade de criar bem-estar.

A rádio guarda vários exemplos destas longas relações que nos acompanham por vidas inteiras, vozes que inscrevemos nos nossos hábitos de pura intimidade, porque nos pontuam os dias, sabemos que contamos com aquela hora para um encontro que é feito de distância mas que o hábito torna amigo e necessário. Julgo que a vitória de Alvim passa pela amizade que nos inventa a todos. A amizade de que todos necessitamos.

Em Maio, o Alvim fará 50 anos de idade. Era bem tempo de ser condecorado pelo Presidente da República ou tornado capitão da equipa do Porto, talvez pudesse passar a dirigir um grande jornal, mandar num Ministério ou na Orquestra da Gulbenkian. O seu aniversário é festa para tanta gente que acede a bastante mais alegria e dignidade através da alegria e da dignidade com que apresenta a “Prova Oral” dia depois de dia, sem jamais se esgotar. Sem jamais nos esgotar.

Estamos de verdade perante um épico. Um projecto cuja aventura já incluiu tanta gente que se afirma indubitavelmente com o sentido de praça. Lugar de multidão por onde a pólis, a imensa cidade, passa. Ao centro, o Alvim em pose de fontanário, onde apetece mandar vir um café e ficar. Ficar para a tarde. Ficar para a conversa.

(O autor escreve de acordo com a anterior ortografia)