Dez mitos sobre o HPV

Em Portugal, a vacina contra o HPV está incluída no Programa Nacional de Vacinação

É a doença sexualmente transmissível mais prevalente no mundo e, ao contrário do tendemos a crer, não são só às mulheres que correm o risco de ter patologias graves à conta dele. A vacina é “um pilar fundamental”, mas há outros cuidados importantes.

Eis alguns equívocos que é fundamental desconstruir.

  1. O HPV só se transmite por via vaginal ou anal.

É verdade que o HPV (vírus papiloma humano) se transmite maioritariamente por via sexual, mas não só por via vaginal ou anal. O sexo oral representa também uma relevante forma de transmissão da doença.

2. O HPV só se transmite quando as lesões estão visíveis.

O contágio ocorre pelo contacto próximo com a pele ou as mucosas, mesmo que não haja lesões visíveis ou quaisquer sintomas. “Passa-se com muita facilidade e é difícil perceber que ela lá está”, alerta Cátia Caldas, médica infeciologista da Unidade Local de Saúde do São João, no Porto.

3. Se tenho HPV, vou ter cancro.

Um equívoco total. Muitas vezes, o nosso sistema imunitário resolve o assunto, debelando a infeção sem levantar problemas. Mas vale a pena sublinhar que noutros casos esta persiste e pode de facto levar a doenças graves, como o cancro.

4. A probabilidade de contrair infeção por HPV não é assim tão alta.

Os números são claros. Estima-se que cerca de 80% dos homens e mulheres sexualmente ativos vão adquirir a infeção por HPV em algum momento, mesmo que na maioria dos casos a infeção não evolua para doença sintomática. As estimativas do CDC (Centers for disease control and prevention), dos EUA, chegam aos 90%.

5. Os diferentes tipos de HPV são igualmente perigosos.

Há cerca de 200 tipos diferentes de HPV, dos quais 40 afetam os órgãos genitais. Dentro destes, há os de baixo e alto risco. Os tipos 6 e 11, por exemplo, são considerados de baixo risco, sendo responsáveis pelas verrugas ou condilomas genitais. “Mas atenção que mesmo esses, que não são tão ‘mauzinhos’, são altamente estigmatizantes”, ressalva Cátia Caldas. Os tipos 16 e 18 são de alto risco, uma vez que podem causar lesões pré-cancerosas e mesmo cancro.

6. Os homens são mais imunes à infeção por HPV.

Outra vez os números a falarem por si. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, um em cada três homens em todo o mundo está infetado com HPV.

7. O cancro do colo do útero não tem uma preponderância particularmente grande.

É “só” o segundo cancro mais comum (a seguir ao cancro da mama) em mulheres entre os 15 e os 44 anos, na União Europeia. Só nos países que a integram, todos os anos, há cerca de 33 mil casos de cancro do colo do útero e 15 mil mortes.

8. O HPV só provoca cancro do colo do útero, pelo que os homens estão “a salvo”.

Nada mais errado. É certo que o HPV é responsável por 100% dos cancros do colo do útero, mas também é o causador de 84% dos cancros anais, de 47% dos cancros do pénis, de 70% dos cancros vaginais. E ate já há correspondência estabelecida entre este vírus e uma parte dos cancros da cabeça e do pescoço (36%). Pelo que os homens estão longe de estar “a salvo”. Vale ainda a pena assinalar os grupos de risco. A saber: pessoas com imunodeficiências, homens que têm sexo com homens, mulheres com doença anogenital por HPV, trabalhadores do sexo, indivíduos transgénero e não binários.

9. Se tomar a vacina, nunca mais preciso de me preocupar.

A vacinação cobre nove tipos de HPV, entre os quais os que são potencialmente mais graves, sendo por isso um “pilar absolutamente fundamental” no combate à infeção resultante deste vírus. Em Portugal, a vacina contra o HPV está incluída no Programa Nacional de Vacinação para as raparigas de dez anos e, desde 2020, também para os rapazes nascidos a partir de 2009. Mas esta não é “um garante absoluto de que não se vai ter HPV”, pelo que, reforça Cátia Caldas, continua a ser “fundamental haver precaução nas relações sexuais”, através do uso do preservativo. Acresce que nenhum destes cuidados dispensa a realização periódica de rastreios. E ainda há que ter em conta os fatores de risco para a infeção por HPV: número elevado de parceiros sexuais, início precoce da atividade sexual, outras infeções sexualmente transmissíveis.

10. Se já sou sexualmente ativa/o e até já tive HPV, não vale a pena pensar em vacinar-me.

A infeciologista do São João desconstrói esta ideia errada: “É verdade que se retira maior eficácia da vacina quando esta é tomada antes de se iniciar a atividade sexual. Mas isto não invalida que ela não possa ou não deva ser tomada mais tarde. Mesmo depois de se ter HPV, pode não se ter tido contacto com todos os tipos cobertos pela vacina. E também há reinfeções. Além de já haver evidência de que a vacina pode ter um papel benéfico na presença de lesões causadas pelo vírus. Cada vez mais tem de ser um assunto discutido e abordado, caso a caso.” Ou seja, mesmo que não seja abrangida (ou, igualmente importante, abrangido) pelo plano de vacinação, deve consultar o seu médico sobre a possibilidade de tomar a vacina.