Helena Carreiras: alma de montanhista

Helena Carreiras é ministra da Defesa

Nasceu na planície, mas sobe montanhas. “Apesar de hoje pouco praticar, tenho alma de ‘tracker’”, diz. Nos Picos da Europa, em expedições no norte de África, na Índia ou na Turquia, encontrou armas para gerir sínteses e conciliações.

“Sou uma mulher de sínteses.” Capaz de descobrir na diversidade, por vezes nos opostos e em pertenças diametrais, um caminho. É assim, desde a adolescência, vivida em Tomar. De livre vontade, dividia-se então entre a juventude católica, o conservador Rotary e uma associação de defesa do património, onde conheceu pessoas de esquerda, horrorizadas com a ideia de conformismo, apaixonadas pela revolução. Uma síntese difícil, num momento histórico importante, que a levaria à sociologia, e ao agnosticismo. Já licenciada, conheceu o cientista político Andrés Malamud e com ele, futuro marido, novas diversidades geográficas e culturais a conciliar com as que, investigadora social, encontrou nas instituições militares, nada homogéneas, porém masculinas. Em que sendo mulher, logo estranha, era olhada com desconfiança.

Feminista, leitora precoce de Simone de Beauvoir, a causa da igualdade de género, cedo a interpelou, tomando como objeto de estudo científico o papel das mulheres nas forças armadas. Em 2019, foi nomeada diretora do Instituto de Defesa Nacional. A primeira mulher. Estreia igual em 2020, no Ministério da Defesa. “Tem uma liderança tranquila, mas muito corajosa. A Helena é muito corajosa. Porque não é fácil entrar e afirmar-se num mundo masculino, como é o das Forças Armadas”, diz Marina Costa Lobo, amiga de há mais de duas décadas. “Muito trabalhadora e dedicada, muito séria e rigorosa. Discreta, confiável”, acrescenta a politóloga. “A Helena é muito perseverante e tem os pés assentes na terra.” Helena Carreiras revê-se na descrição. “Perseverança e simplicidade talvez me definam.”

António Costa Pinto é amigo antigo. Doutoraram-se na mesma universidade, em Florença, com o mesmo orientador. “Uma socióloga muito competente, autora de belíssimas publicações, muito dedicada ao ISCTE”, diz. “Uma mulher “curiosa, competente, dialogante, com grande capacidade de colaboração, basta olhar para o trabalho académico.” E, acrescenta o politólogo, “muito equilibrada”.

Nunca quis pertencer a um partido. Porém, as circunstâncias em que cresceu indicaram-lhe o caminho da esquerda. Nascida em Portalegre, viveu a primeira infância em Alpalhão, filha de professores primários. Tinha sete anos quando a família foi para Tomar. Num texto sobre o dia 25 de Abril de 1974, tinha então oito anos, recorda a pobreza de que foi testemunha, invocando os meninos que chegam à sala de aula, a pé, “por caminhos manhosos”. Para a ministra da Defesa, “liberdade e dignidade” são palavras que devemos invocar todos os dias.

Em Tomar, viveu uma adolescência livre. “A procurar o tesouro dos templários.” Em depoimento prestado em 2011 à fundação Getúlio Vargas/Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, conta que chegou a Lisboa com 18 anos para estudar sociologia. Um pequeno quarto alugado e a ausência dos mimos foram instrumentos de autonomia. Nova síntese: a neta de um pequeno agricultor alentejano, determinado a levar os filhos à escola que nunca frequentou, faz doutoramento em Florença (com uma tese sobre políticas de integração de género nas Forças Armadas dos países da NATO), dá aulas nos EUA, com cátedra no ISCTE e obra reconhecida.

Nascida na planície, sobe montanhas. “Apesar de hoje pouco praticar, tenho alma de ‘tracker’”, diz. Nos Picos da Europa, em expedições no norte de África, na Índia ou na Turquia, encontrou armas para gerir sínteses e conciliações. Por isso, desafia os filhos, um casal, para aventuras – “das montanhas ao mergulho”, revela Costa Lobo.

Com Andrés Malamud aprendeu a gostar do Natal em clima de verão. “Sou muito protetora. O que pode não ser bom”, diz, quando fala da família. “No que diz respeito a afetos, é uma corredora de fundo”, conta quem a conhece bem. Helena Carreiras concorda e acrescenta: “Nos afetos, o caminho é tão importante quanto o destino”.

Maria Helena Chaves Carreiras
Cargo: ministra da Defesa
Nascimento: 26/09/1965 (58 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Portalegre)