Est. Manuel da Silva Torrado & C.ª: de saloio a representante de Portugal

(Foto: Sérgio Conceição/Global Imagens)

A Est. Manuel da Silva Torrado & C.ª (Irmãos) nasceu há 145 anos. A produção e a localização mudaram, mas a essência familiar mantém-se. Bem como os azeites de qualidade superior.

Comecemos esta história folheando um dicionário. Quase no fim, na letra “s”, encontramos a palavra “saloio” que, por si só, podia contar a história desta marca centenária. Adjetivo e nome masculino, refere-se ao “que ou quem é dos arredores de Lisboa, a norte do rio Tejo” e ao “que ou quem trabalha ou vive no campo”. Juntando as duas definições, temos a ideia popular de saloio, ou seja, os camponeses de fora da capital que a esta se dirigiam para vender produtos agrícolas. Um desses tantos saloios, que existiram principalmente até ao século XIX, era Manuel da Silva Torrado. Ia a Lisboa fazer negócio com o azeite que produzia. Mas a história cresceu, escreveu-se e, hoje, a sua origem “saloia” dá nome a um dos azeites portugueses mais conhecidos além-fronteiras: o Saloio.

Antes de falar das prateleiras internacionais nas quais se pode encontrar uma lata (sim, uma lata) de Saloio, falemos de Manuel Torrado. A comercialização acontecia em Lisboa, como já explicado, mas a produção era feita mais a norte, em Castelo Branco. Quando a venda aqui e ali foi crescendo, o albicastrense, na altura com apenas 20 anos, e os irmãos decidiram formalizar o comércio que faziam criando uma empresa. Em 1878 nascia a Est. Manuel da Silva Torrado & C.ª (Irmãos), atualmente abreviada como EMST.

A história do já referido Saloio é tão antiga quanto a empresa que o criou. E, apesar de a qualidade do produto ser indispensável para a conquista feita posteriormente, foi também o exterior que marcou a diferença. Quem o destaca é Manuel Santo, o neto, um dos atuais representantes da marca. “O fundador pensou em exportar e na embalagem em que poderia fazer melhor esta logística. Foi aí criada a lata, nomeadamente a de um litro de azeite, uma inovação que otimizava o espaço e facilitava a utilização.” O metal protege do calor e da luz, portanto, “foi realmente um sucesso”.

O início lá fora

A exportação teve início pelas mãos de quem melhor representa e “vende” Portugal lá fora: os emigrantes. “Eram as comunidades portuguesas que procuravam produtos nacionais que receberam a marca Saloio e a expandiram. Por isso, costumo dizer que foram eles os nossos primeiros comerciais.”

Nos dias de hoje, esses mercados portugueses continuam a ter peso nas exportações, mas houve também expansão para outras longitudes, como a Ásia. A ideia a reter é que desde o início da exportação, em meados da existência da EMST, a venda além-fronteiras sempre foi o foco, estando atualmente “sempre acima dos 90% do volume de vendas”, realça Manuel Santo.

Atentemos agora aos pormenores. Já falamos do fundador, Manuel Torrado, e à conversa connosco está um dos atuais responsáveis, Manuel Santo. O apelido não é o mesmo. Porquê? Explica o próprio: “A EMST foi adquirida na viragem do século pela SICA, empresa criada em 1947 e que, ainda nos primeiros anos, foi comprada e depois desenvolvida pelo meu avô, que também se chama Manuel Santo, como eu”. A centenária produtora de azeite fundada por Manuel Torrado, apesar de estar agora “na segunda família, uma família adotiva”, como carinhosamente apelida, continua a ser familiar. SICA é a abreviatura para Sociedade Industrial e Comercial de Azeites, atualmente gerida por Rui Norte dos Santos, pai de Manuel Santo. Com a fusão das duas empresas familiares, “neste momento é um só grupo que lida desde a produção até à exportação e comercialização da marca”.

Da esquerda para a direita: Adriano Marques, Fernando Marques, Manuel Norte Santo, Rui Norte dos Santos, Alberto Lopes e Pedro Lopes
(Foto: DR)

Tal como Manuel Torrado alterou a localização da EMST de Castelo Branco, de onde era original, para o Alentejo, também Manuel Santo tomou a mesma decisão com a SICA.

Natural da zona de Coimbra, já negociava com azeite localmente, percebendo o potencial da produção e do mercado alentejano, mudou-se para Estremoz. Manuel Santo afirma que o tempo deu razão ao avô e ao fundador da EMST: “Foi a aposta certa, porque, atualmente, 80% do azeite nacional está localizado no Alentejo”. Foram visionários.

As outras marcas

Voltemos à centenária, “tradicional e portuguesa” EMST. Além do Saloio, há ainda duas outras marcas. A Santa Maria, voltada para o mercado da América Latina, principalmente para o Brasil. Há ainda a Triunfo, “mais regional, a marca de azeite de garrafão, vendida aos locais na zona do Alentejo e também um pouco para a União Europeia, para mercados como o alemão”.

A exportação foi a trajetória natural da EMST. O foco para o exterior mantém-se tanto pelo significado que as marcas já ganharam junto desses mesmos mercados como pela difícil penetração no nacional. “O investimento já foi pensado para o mercado nacional, mas este é conservador e dominado por duas grandes marcas que têm quase hegemonia das vendas”. Ainda assim, a aposta em Portugal tem sido numa linha de excelência, uma “gama premium”, vendida em lojas especializadas, “que tem tido um crescimento e sucesso moderados”.

Apesar da EMST ter sido absorvida pela SICA, a história manteve-se. Manuel Santo assinala o trabalho e vontade de continuar a promover o legado criado por Manuel Torrado e os irmãos, que continuam a ser lembrados e referidos pela marca. Sobre a fórmula de sucesso para manter o tradicionalismo e familiaridade de uma empresa com perto de 150 anos, mesmo após uma restruturação, o representante acredita que a chave está num líder forte. “Temos tido sempre uma pessoa com um caráter forte e um líder claramente definido que nos encaminha e que faz com que não haja rivalidades. Isto aconteceu com o meu avô, com os meus tios e agora com o meu pai”, sublinha Manuel Santo.

Cronologia

1878. A Est. Manuel da Silva Torrado & C.ª (Irmãos), S.A., nasceu em Monforte, Castelo Branco.

1911. Manuel da Silva Torrado constituiu em conjunto com os seus irmãos a empresa que, em 1946, se tornaria numa sociedade anónima.

1925. Primeiro logótipo da marca Saloio, fundada por Manuel da Silva Torrado.

1925. Criou-se a embalagem de lata que permite a conservação e proteção de todas as características do azeite.