As marcas de acne na idade adulta

Prevenir a acne é prevenir cicatrizes (Foto: AdobeStock)

São pequenas ou grandes cicatrizes e as alterações hormonais não explicam tudo. Loções e alimentos demasiado gordurosos são de evitar. E, atenção, nada de apertar borbulhas. Há implicações estéticas e emocionais. Há tratamentos e formas de prevenir.

Primeiro, falemos de acne, aquele problema cutâneo, aborrecido, aquela doença vulgar a que quase ninguém escapa em algum momento da sua vida. Mais frequente na adolescência, é certo, mas que, por vezes, não se fica por aí e estica-se por mais anos. Depois, abordemos as marcas que deixa na pele, em várias partes do corpo, no rosto sobretudo. As cicatrizes que a acne deixa para lembrar que com ela não se brinca. Convém levá-la a sério porque o rasto tem consequências, causa desconforto físico e mesmo emocional. Não é coisa pouca.

A descrição que se segue é bastante gráfica. “Acne é uma condição de pele que ocorre quando os folículos pilosos (regiões em que nascem pelos) ficam obstruídos por sebo e células mortas, sendo colonizados por bactérias que geram inflamação”, descreve Sofia Carvalho, cirurgiã plástica e estética da Clínica Lisbon Plastic Surgery. Rosto, ombros, dorso e peito, regiões seborreicas por natureza, são as áreas mais afetadas. Marta Ribeiro Teixeira, dermatologista da Clínica Espregueira, no Porto, vai às origens (e são várias). “É uma patologia multifatorial, para a qual contribuem fatores genéticos, hormonais, ambientais, a toma de determinados medicamentos, a alimentação (alimentos com elevado índice glicémico, entre outros), a proliferação de algumas bactérias, a utilização de cosméticos não adequados ao tipo de pele, assim como fatores mecânicos, nomeadamente o traumatismo repetido causado por vestuário justo ou o uso de máscaras durante a pandemia de covid-19.” O stress também não ajuda.

O resto já se sabe, espinhas, os vulgares comedões de cabeça branca ou negra, pápulas, pústulas, nódulos, quistos. “Estas alterações são o resultado da obstrução e inflamação dos folículos pilosos através da produção exagerada de gordura, acumulação de células cutâneas mortas e proliferação bacteriana”, refere a dermatologista.

“As marcas de acne na idade adulta são o resultado da acne já curada da adolescência ou da acne tardia ainda ativa”, reconhece Marta Ribeiro Teixeira, dermatologista
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Se na adolescência afeta mais o sexo masculino, o paradigma muda a partir dos 25 anos de idade. A acne tardia consome principalmente mulheres e “ataca” essencialmente a região do queixo e pescoço. Marta Ribeiro Teixeira tem números. “Entre os 25 e os 40 anos de idade, cerca de 50% das mulheres sofrem de acne e a partir dos 40 a prevalência é de 15%.” Uma em cada duas mulheres sofre da patologia. É um problema bastante frequente, portanto. E por que razão também se manifesta na idade adulta? As alterações hormonais explicam tudo? “Fatores genéticos, hormonais, a alimentação, o tabagismo, o stress emocional, a privação de sono, a poluição atmosférica, climas quentes e húmidos, assim como a utilização de produtos cosméticos inadequados, parecem ter especial relevância”, responde a dermatologista. São mais do que uma mão cheia. Dá que pensar.

A acne afeta mais uns do que outros, o grande problema é quando não desaparece e deixa aquelas cicatrizes que não são bonitas de ver ao espelho. Marta Ribeiro Teixeira fala dessas marcas que ficam na pele, das cicatrizes e das alterações de pigmentação (sim, também há esta questão). A componente inflamatória não facilita. “As marcas de acne na idade adulta são o resultado da acne já curada da adolescência ou da acne tardia ainda ativa. Existem diversos tipos de marcas desde a hiperpigmentação pós-inflamatória, até pequenas ou grandes cicatrizes, que podem ser elevadas (hipertróficas e queloides) ou atróficas com perda de tecidos (por exemplo, em ‘picador de gelo’)”, revela a dermatologista. Os casos mais complicados resultam da acne cística.

“A verdadeira beleza não reside apenas à superfície, mas na autenticidade das qualidades únicas”, garante Paulo Dias, neuropsicólogo e hipnoterapeuta
(Foto: DR)

Seja na adolescência, seja na idade adulta, a acne é um problema com o qual não é assim tão fácil lidar. É que, por vezes, não passa, fica na pele. Paulo Dias, neuropsicólogo e hipnoterapeuta das clínicas Dr. Alberto Lopes, lembra vários fatores que preocupam e condicionam desde cedo. “A pressão social para satisfazer os padrões de beleza, geralmente irreais, e este problema físico levam a que o adolescente construa um reflexo distorcido da sua imagem, fazendo com que a hora de enfrentar um espelho se transforme num momento de stress emocional gerador de ansiedade, preocupações e isolamento social, podendo resultar num quadro depressivo”, frisa. A confiança e a autoestima tremem, ficam abaladas.

Cremes, medicação, laser

Prevenir a acne é prevenir cicatrizes. A lógica é fácil de entender. O que fazer então? “Habitualmente estão indicadas loções que reduzem a produção de gordura, que conseguem destruir as bactérias e promovem a eliminação das células cutâneas mortas”, adianta Sofia Carvalho. A cirurgiã plástica dá vários conselhos. “A pele deverá ser sempre limpa antes de deitar, removendo sempre a maquilhagem. A esfoliação deverá ser feita regularmente. Em muitas situações, está indicada a utilização de medicamentos como antibióticos ou formulações derivadas da vitamina A.”

Prevenir é também tratar. Neste caso, terapia atempada das lesões. Marta Ribeiro Teixeira explica o que fazer e como o processo funciona. “Os pacientes afetados devem recorrer, sem demora, a um dermatologista, que vai estabelecer um plano terapêutico individualizado, que pode passar por medidas de aconselhamento dietético, e por recomendação de produtos cosméticos (para limpeza, fotoproteção, entre outros) adequados ao tipo de pele dos pacientes. Em muitos casos, está indicada a prescrição de medicamentos tópicos e orais e pode ser indicado o uso de aparelhos médicos.” O tratamento varia com o tipo de cicatriz. Há medicação, peelings em ambiente médico, laser ou microagulhas, radiofrequência, preenchimento de cicatrizes com ácido hialurónico, bioestimuladores, infiltração de corticoides, subcisão ou excisão cirúrgica. “Em casos mais graves, os tratamentos podem ter de ser combinados e repetidos várias vezes até um resultado satisfatório”, avisa a dermatologista.

“Os tratamentos das cicatrizes de acne exigem a realização de múltiplas sessões. No caso de cicatrizes muito profundas, é sempre mais difícil eliminá-las na totalidade”, afiança Sofia Carvalho, cirurgiã plástica e estética
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E, atenção, máximo cuidado, a proteção solar é fundamental em qualquer caso, em qualquer tratamento, uma vez que há o risco de aparecimento de manchas. Marta Ribeiro Teixeira acrescenta dados importantes sobre o que não se deve fazer. “Alguns tratamentos não devem ser efetuados quando existem lesões inflamatórias ativas (devido ao risco de formação de novas cicatrizes), em caso de gravidez ou em caso de doenças cutâneas ou hormonais concomitantes ainda não estudadas.” Por isso, uma consulta de dermatologia é fundamental. “E sim, é verdade, apertar borbulhas pode levar ao aparecimento de cicatrizes”, garante.

Há casos mais complexos do que outros. Há situações mais demoradas do que outras. Sofia Carvalho sabe do que fala. “Os tratamentos das cicatrizes de acne são tratamentos que exigem a realização de múltiplas sessões. No caso de cicatrizes muito profundas, é sempre mais difícil eliminá-las na totalidade. As menos profundas conseguem ser tratadas ao fim de alguns meses com a repetição de sessões, normalmente entre quatro e seis.” A cirurgiã estética fala do endolift como, sustenta, “o único procedimento que permite tratar a cicatriz desde o interior da pele através de uma fibra ótica de laser da espessura de um fio de cabelo”. “A fibra ótica do endolift permite atravessar a pele sem cortes ‘descolando’ a cicatriz desde a profundidade, processo conhecido por subcisão”, detalha. “A biorremodelação que a luz laser promove, permite uma melhoria visível da qualidade da pele, sendo por isso um dos procedimentos de primeira linha para resultados mais eficazes”, adiciona.

Voltemos à autoestima, aos danos emocionais da acne e das marcas que deixa. Esta não é apenas uma questão física e estética, como se percebe. “Vários estudos e a prática clínica mostram que pacientes com acne ou marcas de acne apresentam elevada prevalência de depressão e baixa autoestima”, salienta a dermatologista Marta Ribeiro Teixeira. A cirurgiã plástica Sofia Carvalho sabe que assim é, as marcas causam um impacto profundo na autoestima. E a valorização da imagem é transversal a várias fases da vida e idades. A acne é um problema, de facto. Seja precoce ou tardiamente. Seja como for, Paulo Dias, neuropsicólogo, alerta para outros aspetos: a autoestima é mais do que a aparência física, a acne não define a beleza ou o valor de uma pessoa. Com ou sem cicatrizes. “A verdadeira beleza não reside apenas à superfície, mas na autenticidade das suas qualidades únicas”, realça o neuropsicólogo.