Paula Santos: o partido no sangue

Paula Santos é a próxima líder parlamentar do PCP

“Tenaz” e “batalhadora”, leva à liderança do grupo parlamentar comunista “a boa disposição e a tranquilidade comprovadas mesmo nas situações de maior aperto e tumulto”. É a primeira mulher nessas funções.

Filha de operários têxteis, militantes comunistas, e neta de alentejanos de Aljustrel, de quem herda testemunho da pobreza a que a ditadura de Salazar condenou o povo, tem o partido no sangue. “Nunca me passou pela cabeça ser outra coisa que não comunista”, diz a próxima líder da bancada parlamentar do PCP, a primeira mulher a ocupar a cadeira.

A intervenção política inicia-se na Manuel Cargaleiro, escola secundária da terra onde cresce, o Seixal, “envolvimento aprofundado”, já aluna do curso de Química Tecnológica, na Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Tinha então o desejo de trabalhar num laboratório. “Recordo uma jovem bastante madura e responsável para a idade”, conta Ana Sesudo, colega de faculdade. “Muito focada e muito trabalhadora, sempre capaz de conciliar o estudo com a participação muito ativa na vida associativa.” Deve à amiga “alegre e de sorriso rasgado”, gestos largos de empatia e solidariedade. “A Paula é sempre muito atenta ao que a rodeia e, sobretudo, aos outros.”

No início do milénio, a carreira no partido não é um destino traçado. “Uma coisa é ter atividade política, outra é assumir cargos de execução. E essa era uma possibilidade que não colocava”, confessa Paula Santos. Porém, a partir do momento em que aceita integrar as listas à Câmara Municipal do Seixal, corria 2005, ficou fácil prever-lhe o futuro – eleição para a Assembleia da República (desde 2009) e assento no Comité Central, órgão máximo do partido (2016). “Sou discreta e reservada”, diz de si. Que esperar dela, num cenário de maioria absoluta do PS? “Deixe-me colocar a questão desta maneira”, “deixe-me dizer-lhe desta forma” – as respostas começam geralmente assim. Depois, o esperado: “Há uma forma coletiva na nossa intervenção. Essa é uma característica do nosso trabalho, aliada à ligação com a vida e o dia a dia dos trabalhadores, sempre com grande disponibilidade para os ouvir e encontrar soluções para os seus problemas.”

Sucede a João Oliveira, de quem tem sido vice-presidente. O dirigente António Filipe traça as diferenças: “Ao contrário da situação anterior, em que podia acontecer tudo, até cair o Governo, a maioria absoluta traz maior previsibilidade. Por isso, será mais uma intervenção e afirmação próprias”. Reconhecendo em João Oliveira “um estilo mais aguerrido”, o ex-deputado avalia os meses em que a nova líder parlamentar tomou o lugar do anterior, então em licença de parentalidade. “Quando teve de se chegar à frente, fê-lo com eficácia e discrição.” João Oliveira salienta “a enorme capacidade para ouvir os outros e enquadrar no coletivo os contributos individuais”. “Dedicação, competência e empenho. Firmeza e tenacidade.” E uma característica distintiva: “A boa disposição e a tranquilidade comprovadas mesmo nas situações de maior aperto e tumulto”. Contem, vinca a própria, “com uma oposição combativa, na denúncia dos problemas, disponível para encontrar respostas e soluções”.

Camarada de Odete Santos e de Ilda Figueiredo, figuras fortíssimas da história parlamentar do PCP, é a primeira mulher na liderança da bancada. “Num grupo paritário não valorizo essa questão. Parece-me natural”, diz António Filipe. A deputada socialista Isabel Moreira pensa de modo diferente: “É um sinal fortíssimo. Imagino que não é um discurso que ela própria reivindique, mas vê-la ocupar o lugar enche-me de alegria”. Paula Santos mantém o discurso habitual: “Já no primeiro congresso do PCP, em 1923, o partido salientava importância da participação das mulheres, mas quantas mulheres votaram contra os direitos das mulheres na AR? O que importa não é o sexo. O importante é ser comunista”.

Isabel Moreira e Paula Santos integraram o Grupo de Trabalho – Procriação Medicamente Assistida. “A Paula foi de uma lealdade total, num processo lento, cauteloso, muito conversado. É uma parlamentar competente e inteirada, muito cerebral, altamente focada e de fácil trato.” Inês Sousa Real, do PAN, trabalhou com a comunista na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território. “Pareceu-me tímida e reservada, batalhadora e resiliente.” Resiliência, palavra de que a nova líder da bancada do PCP não gosta. Prefere resistência, nome próprio dos comunistas portugueses.

Regressar a casa e ao filho de 9 anos, é o melhor momento do dia. Relaxa em passeios junto ao mar. A ouvir música popular brasileira e de intervenção. A cantar Jorge Palma, sobretudo a preferida “Terra dos sonhos”, onde “toda a gente trata a gente toda por igual”.

Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Cargo:
próxima líder parlamentar do PCP
Nascimento: 29/09/1980 (41 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Lisboa)