Estenose aórtica, o problema do coração dos avós

A estenose aórtica é uma das doenças mais comuns das válvulas do coração

A válvula aórtica fica cada vez mais estreita e impede o fluxo normal do sangue. Afeta principalmente os mais velhos, quem tem idade superior a 70 anos.

Imagine-se uma bomba de água que irriga um campo e que está a funcionar há 80 anos, sem nunca parar, nem por um milésimo de segundo que seja. À saída da bomba existe uma válvula, na mangueira principal, que abre e fecha 70 vezes por minuto, durante esses 80 anos. Feitas as contas, são cerca de três biliões de aberturas e fechos. “A válvula aórtica tem esta capacidade e duração. No entanto, para 10% da população, passados muitos anos, 70 ou 80, a válvula começa a ficar mais rígida, espessa e calcificada”, adianta Lino Patrício, cardiologista de intervenção no Centro de Responsabilidade Cérebro-cardiovascular do Hospital do Espírito Santo, em Évora.

A estenose aórtica, uma das doenças mais comuns das válvulas do coração, pode ser explicada e visualizada dessa forma para que se tenha uma ideia do que acontece. Afeta cerca de 32 mil portugueses, é considerada uma doença de avós, uma vez que afeta principalmente pessoas acima dos 70 anos. “Quando há uma estenose, a válvula aórtica não abre completamente e vai ficando cada vez mais estreita, impedindo o fluxo normal do sangue”, explica o especialista. O orifício de saída do sangue no coração fica mais pequeno e a válvula acaba por sofrer um processo de obstrução e estenose. Por outro lado, Lino Patrício lembra que a estenose aórtica pode manifestar-se em doentes que nascem com uma válvula defeituosa. “Essas válvulas acabam por se desgastar mais cedo.”

É uma doença silenciosa que tem sintomas difusos como dor no peito, desmaios e cansaço acentuado e que, muitas vezes, os doentes acreditam estar associado à idade

O impacto é visível, limita capacidades, interfere na qualidade de vida. É normal começarem a surgir sintomas como fadiga, cansaço, síncope ou perda de consciência e dor no peito, uma vez que a quantidade de sangue bombeado pelo coração em cada minuto, e que consegue chegar às restantes partes do corpo, é reduzida. Lino Patrício avisa que se trata de doença muitas vezes silenciosa e que os sintomas acabam por ser confundidos com problemas associados à idade. “Perante sintomas invulgares para a pessoa em questão é importante procurar um cardiologista para proceder a um diagnóstico atempado e um tratamento adequado, evitando consequências mais graves”, aconselha.

A estenose aórtica degenerativa é, portanto, uma doença que se verifica em idades mais avançadas, acabando por ser considerada uma doença de avós e bisavós. “Infelizmente, esses avós e bisavós têm concomitantemente outras patologias, como diabetes e insuficiência respiratória ou renal. Isto poderá dificultar a substituição cirúrgica da válvula, que seria a única opção de tratamento, que deve ser realizado o mais precocemente possível, sendo que esta pode ser uma doença fatal caso não seja devidamente detetada e tratada”, sublinha.

O tratamento passa pelo implante de uma nova válvula cardíaca, que pode ser feito através de uma cirurgia convencional ou de tratamento percutâneo

Para os mais idosos, acima dos 80 anos, há já uma forma de substituição da válvula minimamente invasiva, “uma opção segura e com resultados iguais à opção cirúrgica disponível anteriormente”, segundo o médico. É realizada através de um cateter que transporta uma válvula biológica e que é introduzido numa artéria da virilha.

“É crucial reforçar que, tal como todos se juntaram para proteger os avós durante a pandemia, é necessário manter esta atitude em relação à estenose aórtica e aos tratamentos minimamente invasivos. Devemos olhar para os avós como cidadãos de pleno direito de serem tratados e não deixar que fiquem a aguardar em listas de espera de cirurgia ou de intervenção minimamente invasiva por incapacidade do SNS”, remata o cardiologista.