Redes Sociais: cuidado com as comparações

Texto de Sofia Teixeira | Ilustração Shutterstock

Acabámos de almoçar uma sandes de queijo, abrimos o Instagram e vemos uma foto de um amigo num novo restaurante xpto. Fizemos quatro dias de férias no Algarve, abrimos o Facebook, e damos de caras com as fotos da viagem de três semanas a Bali dos vizinhos do lado. Temos o nosso emprego estável há oito anos, entramos no LinkedIn e lá está um destaque da megapromoção de uma antiga colega de faculdade. E nós, que estávamos satisfeitos com a nossa vida, de repente, não estaremos um pouco menos felizes?

«A maioria das pessoas não têm perceção do quanto as redes sociais e os media influenciam o seu humor», diz a psicóloga Daniela Esteves. Quando faz a avaliação inicial de um doente cujo diálogo é negativo, triste, crítico e de medo e tenta perceber quais as influências externas que lhe estão na origem, percebe que, frequentemente, as comparações com a vida dos amigos ou de ídolos, que chegam através das redes sociais, têm um papel importante. «A maneira de percecionar estas “realidades” muitas vezes não tem um filtro mental.»

Põe realidades entre aspas porque, como bem sabemos, as redes sociais nem sempre são representativas da realidade. Toda a gente é excelente editor da sua própria vida: mostra-se o brilho, a glória, o divertimento e a alegria, deixando de parte o banal e o problemático. É uma realidade filtrada, e, por isso, é importante ter a noção de que é apenas uma parte do todo.

Raquel Costa, jornalista e autora da página A Gaja, admite que conseguir desligar-se emocionalmente do que vê nas redes sociais, sem que isso a afete, passou por racionalizar as emoções mais primárias. «Há cinco anos olhava, por exemplo, para fotografias de amigas ou desconhecidas em biquíni e pensava: “Caramba! Porque é que não sou assim?” Mas houve um caminho de aceitação e esse género de coisas já deixou de me causar sofrimento. É um caminho que cada um tem de fazer», diz.

«Tudo isso são estímulos negativos. Geram emoções más em relação a uma coisa que nem sequer é tangível: está dentro de um telemóvel.»

Conhecida pela abordagem provocadora, Raquel explora também o menos cor-de-rosa da vida – partilha momentos menos bons, desaires amorosos, a luta contra a ansiedade – e faz uma distinção grande entre Instagram e as outras redes sociais. «O mecanismo do Instagram funciona pela inveja. Quem publica está a dizer: “Vejam como a minha vida é feliz.” E do lado de quem vê há desejo de também ter, ser e fazer aquilo, para ser feliz.»

Ainda que com esta noção – e com o tal filtro ativado – garante que por vezes o seu humor muda com base no que vai vendo, seja por esbarrar em notícias chocantes seja por ver fotos de alguém que detesta a beber uma água de coco na República Dominicana. «Tudo isso são estímulos negativos. Geram emoções más em relação a uma coisa que nem sequer é tangível: está dentro de um telemóvel.»

A explicação é que o nosso cérebro, para estes efeitos, não distingue mundo real e virtual. «A pesquisa nesta área revela que as recompensas e as punições sociais são válidas online: se alguém interage connosco de forma positiva online, obtemos as mesmas recompensas neuroquímicas no cérebro que obtemos pessoalmente. E quando somos rejeitados ou ignorados online, sentimos também essa rejeição ou punição como se fosse presencial», explica Daniela Esteves.

As comparações são essenciais e, na verdade, é também através delas que definimos quem somos. A teoria da comparação social postula que as pessoas avaliam o seu progresso e a sua posição em vários aspetos por comparação. E haverá sempre, claro, alguém mais bonito, mais rico, mais bem sucedido e mais viajado do que nós. Haverá sempre alguém com uma vida que nos parece mais fácil, mais divertida e mais interessante. Isso não começou com as redes sociais, mas elas acabam por nos dar acesso à vida de mais pessoas e esse acesso acontece com muita frequência e intensidade.

Dez ou quinze minutos de Facebook ou Instagram são fogo-de-artifício para o cérebro: há centenas de novos estímulos com informações sobre pessoas que conhecemos (ou não) a passarem-nos diante dos olhos e fazerem-nos sentir tristeza, alegria, espanto, inveja ou raiva.

Certo é que, depois de alguns estudos terem referido que os utilizadores mais viciados em redes sociais são menos felizes

«É muito a nível emocional. Nenhum de nós está preparado para aceitar esse conteúdo emocional todo ao mesmo tempo sem reagir ou sem alguma consequência», resume Daniela Esteves. Por essa razão, há clientes mais ansiosos ou tristes aos quais a psicóloga aconselha que filtrem conteúdos, não procurem informação que sabem que vai fazê-los sentir mal, eliminem páginas ou mesmo pessoas. Alguns optam até por encerrar as contas nas redes sociais.

Raquel Costa nunca pensou em nada tão radical, mas há uns meses fez uma experiência de uma semana sem redes sociais, depois de ter ficado enervada com comentários deixados no Instagram de uma blogger portuguesa em relação ao filho. «O ato de acordar, pegar no telemóvel e abrir Facebook, Instagram, a minha página, faz parte da minha rotina diária. Também é o principal motivo por que desperto já enervada. Uma das razões que me levaram a fazer este desafio foi o desconforto que isso estava a causar-me», conta num dos posts em que faz o relato dessa experiência. Diz que não viu a luz com a semana de ausência, mas que esta lhe aumentou a consciência das emoções que essa consulta diária lhe provoca.

E é este reconhecimento do impacto que tudo isto tem sobre nós que parece ser a chave para não sermos infelizes com o que vemos. Daniela Esteves recomenda a alguns dos seus clientes o exercício de mindful social media de Christopher Willard, psicólogo especializado em mindfulness, autor de vários livros nesta área e professor na Harvard Medical School and Lesley University.

Poucas coisas são intrinsecamente boas ou más, mas poucas também são verdadeiramente inócuas. Certo é que, depois de alguns estudos terem referido que os utilizadores mais viciados em redes sociais são menos felizes, um outro estudo publicado pelo Personality and Social Psychology Bulletin mostra também que os casais mais felizes não expõem a vida a dois na internet. Os investigadores concluem que os que gostam de publicar cada passo do que é feito a dois, serão mais ansiosos e inseguros, a precisar da validação dos outros.

É preciso pensar porque gostamos de ser voyeurs da vida dos outros e como isso nos faz sentir, mas também fazer-se esse exercício quando se está no papel de «exibicionista». E isso passa por responder a esta pergunta: «Porque é que eu tenho vontade de partilhar o que estou a ver, comer, fazer ou sentir com as 742 pessoas da minha rede social?»

EXERCÍCIO DE MINDFUL SOCIAL MEDIA DE CHRISTOPHER WILLARD (adaptado)

ENCONTRE UMA POSTURA CONFORTÁVEL, feche os olhos por uns momentos, faça algumas respirações pausadas e perceba qual o seu estado físico e emocional no momento.

ABRA O COMPUTADOR OU PEGUE NO TELEMÓVEL e volte a parar um pouco antes de clicar no ícone da rede social que usa com mais frequência. Sinta o que esse tempo de espera lhe está a provocar e tente perceber quais são as suas intenções e expetativas.

• VEJA A PRIMEIRA ATUALIZAÇÃO DE ESTADO OU FOTO e feche os olhos novamente: que emoção sente com o que viu ou leu? Tédio? Ciúmes? Arrependimento? Medo? Qual é o desejo que sente ao ler?

• VOLTE A FECHAR OS OLHOS E A RESPIRAR PAUSADAMENTE e sinta como essas sensações e emoções desaparecem, ao mesmo tempo que tem de novo noção de si e do que o rodeia.

• REPITA A ÚLTIMA PARTE DO EXERCÍCIO com vários posts ou fotos de forma a ter uma noção mais apurada do que realmente sente com os conteúdos que vê.