Não existia, teve de ser inventado. Sonhadorismo nasce da junção de duas palavras: sonhar e empreendedorismo. Rui Loureiro, professor de Educação Física, de Coimbra, criou o conceito quando percebeu que quase nada motivava os seus alunos e que poucos acreditavam que os sonhos podem, de facto, tornar-se realidade. A partir daí, decidiu ir às escolas agitar consciências, falar de paixões, explicar que há ovelhas amarelas que podem sobressair num mundo cinzento.
Qual é o teu sonho? Esta é a pergunta que faz a alunos do 3.º ciclo e do secundário. A baixa expetativa e a falta de motivação dos jovens foram o motor de arranque do Sonhadorismo.
«A ideia nasceu em 2013 quando constatei que os meus alunos demonstravam uma enorme apatia por qualquer assunto ou atividade», conta Rui Loureiro.
A constatação estava mesmo à frente dos seus olhos. Pediu aos alunos das cinco turmas que tinha no horário que escrevessem numa folha qual o maior sonho e qual a expetativa de o concretizar numa escala de 0 a 10. Rui ficou preocupado. Cerca de 90 por cento dos jovens relacionavam o sonho a um emprego e a média de expetativa não chegava aos 6.
«Numa altura em que tanto se falava de empreendedorismo no meio escolar, estes dados eram a prova de que algo tinha de ser feito de maneira diferente.»
E assim nasceu Sonhadorismo para que o potencial de cada um se manifeste. «Desenvolver projetos diretamente ligados com as nossas paixões, com os nossos interesses, tornar-nos-á pessoas interessantes e com valor acrescentado, aquilo que costumo designar ovelhas amarelas num mundo cinza», diz.
E como funciona o Sonhadorismo? A intervenção começa com uma conversa, uma espécie de shot para agitar cabeças, despertar interesses, motivações, sonhos. Segue-se o laboratório, para acelerar a mudança, como uma viagem para trazer ao de cima o potencial de cada um. É uma atividade a pares em que alternadamente cada um dos alunos interpreta o papel de sonhador e de observador. A ideia é explorar incertezas e vulnerabilidades.
O sonhador tem cinco questões para responder, falar sobre elas. Qual é o meu sonho? Como é que os que me rodeiam me apoiam ou entendem o meu sonho? Como gostaria de me ver no futuro? O que preciso mudar, fazer ou aprender? Onde é que preciso de ajuda para concretizar o sonho? Sonhador e observador falam sobre o assunto, partilham ideias, exploram oportunidades para concretizar esse sonho.
No último ano, o Sonhadorismo realizou duas conferências e mais de 20 workshops, visitou 10 escolas, teve impacto direto em cerca de 1200 alunos. Continua em estabelecimentos de ensino e já tem workshops agendados para grupos informais. O radialista Fernando Alvim, o artista plástico Bordalo II, o ator Miguel Costa, o judoca Nuno Delgado, a surfista Joana Rocha, a empreendedora social Marta Baeta, e a atriz Cleia Almeida, já deram a cara pelo projeto.
Sonhadorismo não é empreendedorismo, tal como a sociedade o entende. Empreendedorismo não é Sonhadorismo. O sonho vem sempre antes do negócio. Rui expõe a sua ideia. «Os modelos clássicos de empreendedorismo visam o desenvolvimento de capacidades empreendedoras com o objetivo de criar um negócio próprio, confundindo abusivamente o termo empreendedor com empresário. Promove uma visão e abordagem individualistas e competitivas com intuito de obter sucesso económico».
Sonhadorismo é outra coisa. «Tem como objetivo desenvolver capacidades empreendedoras, segundo uma metodologia inovadora, que promovam a auto-superação e a realização das pessoas através da conexão com os seus interesses e paixões. Acreditamos que, dessa forma, muito naturalmente acabarão por gerar valor económico para si próprias e para a comunidade em que estão inseridos», diz.
As experiências de Rui Loureiro foram determinantes para o nascimento do projeto de inovação social. «Durante cinco anos, fui formatado para dar aulas». Acabou o curso de Educação Física em 2004 e as perguntas não lhe davam sossego. «Não conseguia colocação e as pessoas olhavam para mim como se tivesse uma doença quase terminal». Acabou por entrar como professor num colégio de freiras. Não correu bem.
«Assumi que não gostava de dar aulas». Envolveu-se numa empresa de organização de eventos. Decidiu partir, ir para a Austrália tirar um mestrado em Gestão de Empresas. Chamaram-lhe maluco, perguntavam-lhe como ia viver. Rui fez as malas, foi, voltou dois anos depois, e percebeu que nas entrevistas de emprego a sua estadia na Austrália era bastante valorizada. «Era um fator diferenciador». Voltou a dar aulas e sentiu outras coisas. «Fora do contexto de um colégio de freiras, era uma paixão dar aulas». E, no ano letivo 2012/2013, verificou que os seus alunos andavam apáticos.
«Senti uma incapacidade brutal de os motivar para o que quer que fosse, não havia temas que lhes despertassem atenção», recorda.
Sentiu que as escolas não tinham capacidade para envolver alunos, paixões, sonhos. Que essas ligações não eram feitas. «Era preciso mostrar aos miúdos que num mundo de tanta incerteza é altura ideal para sonhar». Criou o Sonhadorismo para mostrar que os rebanhos também podem ter ovelhas amarelas. E que essas ovelhas de outra cor, mais tarde ou mais cedo, atraem oportunidades.