Aqui há uns sete anos, fomos tocar a um clube de jazz nos arredores de Berna. Chama-se Mühle Hunziken e é um dos clubes históricos que ainda subsistem na Europa, tendo por lá passado praticamente todos os músicos de referência do jazz contemporâneo e da chamada «música do mundo».
Quem lá chega é acolhido pela excentricidade da casa que parece tipicamente suíça, mas que vai apresentando as suas inúmeras idiossincrasias à medida que se avança pelo jardim e se entra directamente para a sala-de-estar, onde está o palco. Na curta viagem até ao palco, encontramos fontes de pedra que decoram o jardim cheio de plantas, uma estátua do Bart Simpson que nos saúda à entrada, bonecos em tamanho real dos Blues Brothers e do Shrek, vitrais art deco, um homem-aranha entrincheirado numa trepadeira que se agarra à parede e tantos outros objectos que parecem coabitar de forma harmoniosa entre os dois pisos da casa.
Olhamos para os muitos relógios espalhados pela casa e todos marcam cinco minutos para as 12 horas. Conhecemos o dono da peculiar casa-clube, que se autodenomina de «Rei do Burgo», com a sua barba e cabelo branco farto, a fazer lembrar Hermeto Pascoal.
Entre brincadeiras mais ou menos sérias, começamos a urdir uma teoria da conspiração acerca dos relógios parados, que passa por um ritual daqueles esquisitos e potencialmente fatais que irá realizar-se naquela casa às 12 horas menos cinco minutos e concordamos que convém que estejamos de volta ao hotel sãos e salvos antes da hora fatídica.
A certa altura, achamos que é melhor ganhar coragem e juízo e fazer a única coisa sensata neste caso: perguntar ao Rei do Burgo a razão para os relógios parados àquela singular hora.
O Rei responde prontamente: «São cinco para a meia-noite. Restam-nos cinco minutos para o fim de tudo. O que fazemos nesses cinco minutos dita a forma como acabamos ou se conseguimos ultrapassar a hora do fim.»
Parece-me uma filosofia de vida bastante sábia e nada excêntrica. O Rei do Burgo sabe do que fala. Agora que estreamos um ano novo, talvez fosse melhor que aplicássemos esta forma de vida a todas as decisões que tomamos. Se assim for, poderá ser que 2017 nos possa ajudar a passar a meia-noite eterna que nos aguarda se não invertermos a marcha.