Dedo no ar e cabeça rapada

Notícias Magazine

A partir do início deste mês todos os animais usados para investigação científica em Portugal devem viajar a pé, de autocarro ou de cacilheiro. Isto porque a organização de defesa dos animais PETA (People for the Ethical Treatment of Animal) anunciou que, «na sequência de conversações» com a TAP, a companhia aérea deixará de transportar barbatanas de tubarão, troféus de caça e animais de laboratório. É completamente absurdo meter no mesmo saco a prática proibida do finning, que consiste em cortar barbatanas de tubarão e atirar o resto ao mar (probabilidade de sobrevivência de um tubarão sem barbatanas? A mesma de Tino de Rans ganhar as presidenciais), o colecionismo de partes de leões ou crocodilos, coisa absolutamente inútil e egoísta, e o recurso a animais para obter conhecimento.

Não se trata de defender o uso supérfluo ou desnecessariamente cruel de animais. Os institutos de investigação têm habitualmente comissões de ética que avaliam propostas de investigação com animais. E o uso de modelos animais está regulado por legislação europeia e nacional que visa, entre outras coisas, reduzir o número de animais usados, melhorar o seu bem-estar e substituí-los por métodos alternativos sempre que possível. Mas em muitos casos não há alternativas à investigação com modelos animais. Por exemplo, para compreender melhor as doenças neurodegenerativas pode ser útil fazer experiências em cérebros. Vivos. Como não quero acreditar que os administradores e novos eventuais donos da TAP se estão a marimbar para os doentes de Alzheimer ou Parkinson, talvez devam apresentar-se nos laboratórios com o dedo no ar e a cabeça rapada.

A primeira vez que um novo medicamento é testado em humanos é sempre um enorme risco, mas é impensável fazê-lo sem experimentar antes em animais. Apesar de haver diferenças entre humanos e outros animais, a investigação com animais é útil, porque os organismos vivos descendem de um antepassado comum e partilham muitas características biológicas.

Fica a dúvida sobre que modelos de investigação a TAP quererá deixar em terra. Se além de mamíferos, peixes-zebra e Drosophilas (moscas) também recusará boleia à Escherichia coli, a bactéria mais popular nos laboratórios de investigação. Nesse caso, terá de ter o trabalho de a remover dos intestinos dos passageiros. Fica também aberta a porta para que as companhias aéreas se recusem a transportar contracetivos, perucas, vibradores ou outra coisa com que eventualmente não concordem.

PERISCÓPIO

CIÊNCIA NO THEATRO CIRCO, EM BRAGA

Rómulo de Carvalho, divulgador de ciência e aclamado poeta (sob o pseudónimo António Gedeão), marcou encontros singulares entre ciência e poesia. Nasceu em novembro e à volta do seu aniversário, a 24 (atualmente o Dia Nacional da Cultura Científica), a Fundação Francisco Manuel dos Santos celebra o Mês da Ciência. O encontro A Ciência em Três Atos: Sociedade, Prosperidade e Política, que contará com debates, conferências e uma emissão especial do governo-sombra na TSF, é uma das iniciativas. A 19 de novembro. Mais informações: http://www.ffms.pt/.

CÉTICOS NO PORTO

No próximo sábado, dia 21, a Comunidade Cética Portuguesa realiza no Auditório da Casa do Infante, no Porto, a sua conferência anual, ComceptCon 2015. Evolução, fixismo e pastafarianismo, negação das alterações climáticas, negação do Holocausto, movimentos antivacinas e teorias da conspiração acerca da ida do homem à Lua serão alguns dos temas abordados. Entrada livre. Inscrições: http://comcept.org/.

[Publicado originalmente na edição de 15 de novembro de 2015]