Diz que as plantas medicinais podem ser usadas para perder peso e tratar a maioria das doenças e que têm uma eficácia idêntica à dos medicamentos, mas muito menos efeitos adversos. Afirma que está tudo confirmado cientificamente e que o segredo é saber escolher as mais adaptadas a cada pessoa. O naturopata João Beles releva os benefícios para a saúde de um regresso à natureza.
Nesta altura do ano, somos inundados com publicidade a produtos que prometem perdas de peso milagrosas, mas quase sempre ineficazes. Acabou de publicar um livro – Plantas Que Emagrecem , uma edição Lua de Papel– e diz que aquelas podem ser a chave para se atingir o peso desejado. Qual é o seu segredo?
_ O meu livro pretende informar sobre o uso e contributo das plantas medicinais para a perda de peso, acabando precisamente com a ideia das plantas da moda. É que uma planta que pode ser benéfica e surtir efeito numa pessoa, pode ser desajustada e ineficaz se usada noutra. Depende das características de cada um.
Pode dar um exemplo?
_ Olhe, as cetonas de framboesa. Estão agora muito em voga e são um suplemento muito eficaz. Mas a verdade é não têm o mesmo efeito em todas as pessoas. Os tratamentos de emagrecimento com plantas medicinais devem ser individualizados, adaptados às características de cada um. Na origem do excesso de peso, além dos erros alimentares e do estilo de vida, podem estar alterações da tiroide, hormonais, emocionais, entre outras. Embora o livro se destine ao grande público e contenha informação generalista, penso que permite que cada pessoa identifique o seu perfil e as plantas medicinais mais adaptadas. Têm características diferentes. Umas são termogénicas (queimam gorduras), outras relaxam o sistema nervoso, outras diminuem o apetite. Também há as que regulam a glicemia, a tiroide, as que ajudam a dormir, etc. Podem ser usadas isoladamente – o chá verde é sempre benéfico para a eliminação de gordura – ou combinadas. Por exemplo, grifónia (que reduz o apetite), com guaraná (um tónico) e café verde (termogénico) é uma associação que tem grade eficácia na perda de peso.
Mas é preciso identificar as causas que estão na origem do excesso de peso?
_ Sim. Se o excesso de peso estiver ligado a questões emocionais, a grifónia pode ser muito eficaz pois tem efeito na redução do apetite e no aumento da saciedade mas também melhora os transtornos emocionais, nomeadamente depressão, insónia, ataques de pânico e crises compulsivas que levam ao consumo de alimentos. Isto sucede por efeito dos seus constituintes fitoquímicos, nomeadamente o 5-Hidroxitriptofano, um aminoácido muito conhecido, que aumenta a produção de serotonina e de outros neurotransmissores importantes para o equilíbrio do humor.
Como é que se sabe quais as plantas medicinais mais indicadas para cada pessoa?
_ Através da história clínica do paciente. As queixas, os sintomas, a história familiar e outras informações obtidas na consulta são fundamentais.
Mas se os naturopatas não podem pedir simples análises ao sangue, como é que sabem se a pessoa que têm à frente tem os valores de glicose, colesterol e triglicéridos altos? Qual é o valor dos meios auxiliares de diagnóstico para as terapêuticas não convencionais?
_ São fundamentais. Esperamos, num futuro muito próximo, poder vir a prescrever análises clínicas e até outros exames de diagnóstico usados na medicina convencional. Por enquanto, os pacientes pedem aos médicos de família ou fazem por conta própria, por exemplo numa farmácia. Também há seguradoras que comparticipam as nossas consultas e, em breve, uma das maiores do mercado vai permitir que os seus segurados tenham a liberdade de escolher entre um médico convencional ou um especialista em medicinas naturais.
A naturopatia também é bem sucedida no tratamento da obesidade?
_ Geralmente a obesidade tem associada uma série de outros sintomas e doenças, incluindo a diabetes tipo 2. E aí nós temos vantagens relativamente à medicina convencional porque, através do uso combinado de várias plantas medicinais, podemos controlar a pressão arterial alta, a glicose e o colesterol e sem os efeitos adversos que resultam dos medicamentos de síntese química. Intervimos nesses fatores, na regulação do apetite, nas alterações emocionais ou hormonais e os pacientes perdem gordura e volume e ganham saúde e vitalidade
E na alimentação e estilos de vida, os naturopatas não mudam nada?
_Também damos alguns conselhos – sobretudo redução de carnes vermelhas, laticínios e hidratos de carbono simples e falamos da importância da atividade física regular. Mas o naturopata não é nutricionista nem dietista. Nós alcançamos resultados através do uso de plantas medicinais.
As plantas medicinais podem ser consumidas em infusão ou é preciso recorrer a suplementos alimentares?
_ As infusões são ótimas e podem ter efeitos terapêuticos, mas para alcançar resultados, por exemplo, em 90 dias, é difícil fazer as infusões com as combinações de plantas necessárias e depois a pessoa levá–las para o trabalho ou para os sítios onde se desloca. Por isso, receito suplementos alimentares em comprimidos, ampolas ou xaropes. Assim, temos a garantia de que os constituintes ativos estão presentes na quantidade certa para produzir efeitos terapêuticos e, para os pacientes, é mais fácil cumprirem o tratamento.
Qual é a vantagem das plantas medicinais comparativamente a uso de medicamentos inibidores de apetite, diuréticos e outros usados no tratamento médico da obesidade?
_ Uma eficácia clínica idêntica ou superior aos medicamentos de síntese química, mas com muito menos efeitos adversos, pois estes, quando ocorrem, não têm gravidade.
Podemos tratar outras doenças com plantas medicinais?
_ Podemos tratar quase todas as doenças e complementar o tratamento de outras que devem ser tratadas pela medicina convencional.
A naturopatia também é competente para tratar doenças graves, por exemplo cancro? Se sim, qual é a abordagem?
_ A naturopatia oferece tratamentos que são complementares dos tratamentos médicos convencionais do cancro, que os doentes devem fazer. Recorremos a determinadas plantas medicinais que aumentam o efeito dos tratamentos médicos e da quimioterapia, minimizam os respetivos efeitos secundários e estimulam o sistema imunitário. Vários estudos comprovam que a terapêutica combinada – médica e naturopatia, entre outras especialidades – ajuda a reduzir as recidivas e a aumentar a sobrevida dos pacientes com vários tipos de cancro.
Tem noção de que pode estar a dar esperança onde ela já não existe?
_ Tenho o dever de informar que o recurso a plantas medicinais melhora a qualidade de vida dos doentes com cancro e reduz o número de recidivas. Os tratamentos são complementares aos da medicina convencional. Já fui convidado como orador para um congresso da Associação Oncológica do Algarve para falar sobre o uso na naturopatia em oncologia e fui escutado com muito interesse.
E doenças autoimunes? A naturopatia também ajuda a tratar?
_ Sigo alguns doentes com artrite reumatoide e doença de Crohn, entre outras, mas neste campo a nossa abordagem também é complementar da medicina convencional. Queremos que os doentes continuem a ser seguidos pelos reumatologistas e gastrenterologistas, até porque precisamos de informação sobre a doença e a forma como está a evoluir, que só é dada por análises e exames imagiológicos e outros muito específicos e que só podem ser prescritos por médicos. Mas posso afirmar que temos pacientes que não respondiam aos tratamentos convencionais, que podem ter efeitos adversos muito severos, e que através de tratamentos específicos da naturopatia viram os sintomas reduzidos e a qualidade de vida aumentada. Tudo sem efeitos secundários. Aliás, nalguns casos a doença poderá mesmo ter entrado em remissão.
Tanto quanto sei, não há confirmação científica do que está a dizer…
_ Tudo o que afirmo está sustentado cientificamente e pode ser comprovado na PubMed, a maior base de dados de artigos médicos e científicos do mundo.
Uma das críticas feitas às medicinas naturais é precisamente a falta de sustentação científica. Quais são, afinal, as bases científicas da naturopatia?
_ O primeiro livro que publiquei [A Natureza Cura a Natureza, Edições Mahatma] resultou de uma pesquisa que fiz durante mais de dez anos e que me levou à consulta de milhares de estudos científicos, validados, sobre o uso, os efeitos e os benefícios de centenas de plantas medicinais. Nesse livro cito, em concreto, 1250 estudos. Todos podem ser consultados. Alguns foram publicados em revistas científicas como a Lancet ou o JAMA (Journal of the American Medical Association).
Nesse livro diz que podemos aumentar a esperança de vida entre dez a vinte anos se fizermos as escolhas certas. Que escolhas são essas?
_Vários estudos publicados em revistas como o JAMAou o Annals of Epidemiologydemonstraram que as pessoas que beberam sete chávenas de chá verde por dia durante seis anos (o equivalente uma/duas gramas em comprimidos) reduziram a incidência de vários tipos de cancro e a mortalidade cardiovascular. E estas são as principais causas de morte em Portugal. Beber chá verde todos os dias só trás vantagens e aumenta a longevidade. Este é um exemplo, há outros.
Há algum medicamento de síntese química a que não hesitaria em recorrer?
_Aos antibióticos, em caso de infeção, e a alguns analgésicos. E não hesito em ir para um hospital perante um caso de emergência, seja um enfarte, um AVC, uma apendicite, etc. A naturopatia é muito eficaz na prevenção da doença e no tratamento de doenças crónicas. Nas situações agudas e nalgumas doenças muito graves, a medicina convencional é mais eficaz e isto está muito bem definido.
As medicinas naturais são reconhecidas pelo Estado português desde 2003, mas só foram regulamentadas em 2013 (Lei n.º 71/2013, de 2 de setembro). O que é que falta para naturopatas, homeopatas, osteopatas, quiropráticos, fitoterapeutas, acupuntores e especialistas em medicina tradicional chinesa terem cédula profissional? É que os consumidores continuam sem conseguir distinguir os profissionais dos impostores…
_A lei foi aprovada por unanimidade e permitirá o exercício das medicinas naturais nos sectores privado e público. Neste momento, o que sei é que a Administração Central do Sistema de Saúde, um organismo do Ministério da Saúde, está a analisar o curriculum e a qualificação dos profissionais para atribuição da cédula profissional. Alguns profissionais terão de fazer formação ou requalificação, mas a maioria só precisa do reconhecimento oficial. Porque a formação, o conhecimento e o reconhecimento dos pacientes, esses, já o têm.
QUEM É JOÃO BELES?
Naturopata, autor de artigos e livros sobre as bases científicas da medicina natural, professor no Instituto de Medicina Tradicional, em Lisboa. Acumula a atividade docente com a prática clínica, dá conferências e workshopse mantém colaboração regular em revistas e na televisão.