Jorge Manuel Lopes

Paul Simon faz contas à vida


Crítica musical, por Jorge Manuel Lopes.

 

A discografia de Paul Simon sempre foi de periodicidade incerta e o avançar dos anos torna cada novo lançamento num possível gesto final. Assim sucede, e com especial propriedade, perante “Seven psalms” (Owl/Sony), que chega nos 81 anos de vida deste cantor e compositor americano, ator singular e versátil da história da música popular. Um álbum concebido como uma peça contínua, dividida em sete capítulos, com alusões ao “Livro de salmos”, de cânticos e poemas, comum à Tanakh hebraica e à Bíblia cristã.

“Seven psalms” é um disco maioritariamente de guitarra acústica e paisagens etéreas e sintéticas aplicadas como sonoplastia, em doses curtas e sábias e certeiras. Um registo íntimo mas não encerrado sobre si, de um autor que alinha pensamentos e dúvidas em voz alta. Há espanto, humor, um gesto de entrega à vez ansioso, interrogativo e conformado face ao que virá, ou não virá, com a partida deste planeta.

Ao longo do álbum, “The Lord”, o capítulo de abertura, reaparece por duas vezes, parcelar, com ajustes sónicos, os seus versos uma reafirmação do núcleo temático desta obra: “The Lord is my engineer/ The Lord is the earth I ride on/ The Lord is the face in the atmosphere/ The path I slip and slide on”. Pelo meio, “My professional opinion” gera sorrisos no ouvinte numa moldura blues-folk. A voz de Paul Simon, ainda delicada mas sulcada pelo tempo, junta-se à da sua mulher, Edie Brickell, em “The sacred harp”, canção delicada, diáfana, de novo a certeira sonoplastia eletrónica.

As palavras soam sábias, tudo é explanado sem entropia. Paul Simon faz contas à vida em “Seven psalms”, sem ansiedade evidente, pensando em voz alta sobre o mistério do grande desconhecido que há de enfrentar. Sem arrependimentos notórios, mas com muitas dúvidas. “Wait”, o último capítulo, de novo com Edie Brickell, mistura surpresa e pungência, dissipação num dia de primavera. “It’s time to come home/ Amen”, rezam os derradeiros versos.