José Manuel Bolieiro, o “santo” que adora andar de mota

José Manuel Bolieiro é presidente do Governo Regional dos Açores

Cresceu sem televisão, nunca levanta a voz e galgou terreno político até chegar à liderança do Governo dos Açores. Lidera uma gerigonça assente em finos fios de entendimento.

Diz quem acompanha de perto o percurso pessoal e político de José Manuel Bolieiro, que o próprio seria o último dos últimos a imaginar-se presidente dos Açores. “Não por falta de qualidades políticas, que as tem bastantes, mas pelo seu caráter. Alguém que detesta dar nas vistas e prefere a discrição ao aparato”, conforme comenta um amigo de longa data. Foi este homem de “conduta cordata” que agora se rebelou contra o PSD, seu partido de sempre, e criticou Luís Montenegro por negociar com o PS uma revisão constitucional sem que nela seja aprofundada a questão das autonomias regionais.

Nascido pobre num lugar da freguesia da Povoação, ilha de São Miguel, em 1965, ainda hoje é lá tratado por Zezinho. Cresceu sem saber o que era ver televisão porque não a havia por aquelas terras onde a agricultura era o principal ganha-pão das famílias. Adorava a escola e sonhou alto, quis ser advogado. Bom aluno, foi com naturalidade que entrou para o curso de Direito da Universidade de Coimbra. Conheceu Portugal Continental, sempre com o objetivo de regressar aos Açores assim terminada a licenciatura.

A carreira de advogado foi curta. Em 1989, integrou o gabinete do subsecretário de Estado regional da Comunicação Social, Joaquim Machado, e começou a chamar a atenção de Mota Amaral, então líder açoriano, “por quem nunca escondeu admiração política e pessoal”, que o chamou cinco anos depois para responsável máximo pelos assuntos jurídicos do Executivo. Estava lançada uma carreira política que ele próprio nunca quis encarar como tal. “Começou a envolver-se mais no PSD, sem grandes ambições”, rebobina outro amigo.

Deputado à Assembleia Legislativa dos Açores durante mais de uma década, entre 1998 e 2009, chegou a líder parlamentar e destacou-se. Simultaneamente presidiu à Assembleia Municipal da Povoação. Em 2012, assumiu a presidência da Câmara de Ponta Delgada, cargo que exerceu até tomar posse como presidente do Governo Regional dos Açores.

“O José Manuel é um santo. Pacífico e calmo no dia a dia, não gosta de confusões e não as provoca. Contudo, quando tem que enfrentar turbulências, enfrenta-as de frente e com firmeza, centrando-se na procura rápida de soluções e consensos”, acrescenta um companheiro político de longa data. É essa “paciência infinita” que o leva a gerir com pinças uma coligação governamental a quem agoiraram vida curta. Nas eleições regionais de outubro de 2020, o PS venceu em percentagem mas o conjunto dos partidos de Direita (PSD, CDS, Chega, PPM e Iniciativa Liberal) conseguiu a maioria dos deputados. Bolieiro fez o impensável e pela primeira vez na história das autonomias construiu uma geringonça que permitiu o regresso do PSD à liderança dos Açores, que não era social-democrata desde 1996. “Se tal gerigonça ainda existe, muito se deve a ele. Por razões de pragmatismo político e graças a golpes de rins que não teriam sido possíveis com outra pessoa de perfil diferente. Ninguém além dele teria conseguido manter de pé uma coligação tão frágil e instável”, admite quem com ele priva de perto. Viu, entretanto, Chega e Iniciativa Liberal afastarem-se, mesmo assim manteve de pé um Governo que parecia só poder ruir. “Aguenta tudo e consegue encontrar capacidade de sobrevivência a cada ataque, preparando-se para o seguinte com mais força”, dizem.

A apertada agenda e a situação delicada do Executivo não deixaram para trás uma paixão de sempre. “Quando quer paz e deseja estar apenas consigo próprio, pega na mota e vai dar longos passeios sozinho. É a forma que encontra para se libertar da pressão”, revela outro velho companheiro. Divorciado e com duas filhas, de 25 e 23 anos, gosta de livros de filosofia e de teoria política. E não diz não a um bom convívio. “Preza bastante aqueles que lhe são próximos. Não é entusiasta de grandes almoços ou jantares, mas participa com agrado”, adiantam amigos.

Chegou a ser cronista em vários jornais açorianos, mas a política absorveu-lhe o (pouco) tempo que lhe restava para a escrita. E para quase tudo. Só não lhe roubou a reserva no tom e a assertividade nas tomadas de decisão.

José Manuel Cabral Dias Bolieiro
Cargo:
presidente do Governo Regional dos Açores
Nascimento: 23/06/1965 (58 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Povoação)