Javier Milei: Deus, mercado e sexo tântrico

A posse de Javier Milei como presidente da Argentina está marcada para 10 de dezembro

Católico, anarcocapitalista, polémico, desbragado, populista. Javier Milei é o novo presidente da Argentina e promete abalar as instituições do país.

“Viva la libertad, carajo” (“Viva a liberdade, c…”), gritou três vezes bem alto Javier Milei no final do seu discurso de consagração como vencedor das eleições presidenciais na Argentina. Foi o apogeu de 13 minutos em que replicou perante uma multidão de apoiantes todas as suas ideias políticas libertárias, anarcocapitalistas, ultraliberais, antissistema. Um ideário que prevê Estado mínimo e liberdade total ao mercado privado. “E viva Deus”, concluiu o futuro chefe de Estado, o mais à direita de sempre na história democrática do país.

No dia seguinte à vitória, Milei reconfirmou que não voltará atrás nos seus princípios e anunciou que vai privatizar empresas públicas e até o banco central, onde estagiou no início da vida profissional, substituindo a moeda nacional pelo dólar americano. Dizem os mais próximos que ele é assim mesmo: obstinado e desafiador, um elefante no meio da sala disposto a partir tudo à sua volta para que nada fique na mesma.

Óculos na ponta do nariz, gravata torta e larga, longas e grossas suíças, cabelo preto desgrenhado que confessa nunca pentear e lhe dá um ar que lembra o britânico e também controverso Boris Johnson, Javier Milei, 53 anos, entrou para a política apenas em 2021, quando foi eleito deputado ao Congresso nas listas do partido que fundou, o Liberdade Avança. Granjeara notoriedade com os programas de rádio “Cátedra livre” e “Demolindo mitos”, nos quais não poupava críticas demolidoras aos atores políticos argentinos, muitas vezes utilizando uma linguagem desbragada e insultuosa.

Nascido no bairro de Palermo, em Buenos Aires, filho de Norberto, um motorista de autocarro, e de Alícia, uma dona de casa, Milei cortou relações com os pais, que considera “mortos” para ele. Justificou publicamente que não perdoa ter sido vítima de maus-tratos físicos e psicológicos durante a infância e adolescência. Com a irmã, Karina, mantém uma relação umbilical e trata-a, num misto de carinho e admiração, por “Chefe”. Foi ela o seu braço-direito durante a campanha presidencial.

Guarda-redes do clube Chacarita Juniors até aos 19 anos, largou o futebol para se dedicar aos estudos. Formou-se em Economia pela Universidade de Belgrano e completou dois mestrados na área. Destacou-se depois como professor na Universidade de Buenos Aires – está no Guinness com a aula online mais vista de sempre: 10 mil pessoas – e trabalhou para empresas de investimentos e para o banco HSBC.

A vida pessoal de Milei é um paradoxo. Apesar de se dizer defensor da família tradicional, não é casado e admitiu ter tido casos com várias mulheres, inclusive em simultâneo durante sessões carnais em grupo. Diz-se adepto do sexo tântrico – num conhecido programa de televisão deu autênticas lições sobre tal filosofia e garantiu que consegue estar sem ejacular durante três meses.

A postura em relação à religião é, igualmente, muito própria. “Sou católico e ajoelho-me todos os dias perante um judeu”, escreveu um dia na rede social X, ex-Twitter, plataforma que o ajudou a ganhar popularidade junto das massas. É contra o aborto, mas não se opõe à união entre pessoas do mesmo género. Do Papa Francisco, seu compatriota, não tem opinião simpática. Apelidou-o de “burro, ignorante, nefasto e esquerdista” e também o acusou de atuar na base de “um modelo baseado no ódio, na inveja e no ressentimento”.

Javier Milei conseguiu 55,6% dos votos nas eleições do último domingo. Os números oficiais dizem que 14,4 milhões de argentinos o preferiram ao peronista (centro-esquerda) e ministro da Economia, Sérgio Massa, que não foi além dos 44,3%. Segundo analistas locais, o voto massivo dos jovens e dos desiludidos com a política foi a chave para a ascensão de um homem que em poucos anos conseguiu galvanizar um eleitorado a braços com graves problemas económicos e uma galopante taxa de inflação. Alguém que encanta muitos e assusta outros tantos, mas a quem foi dada carta-branca para gerir um país em dificuldades.

Javier Gerardo Milei
Cargo:
presidente da Argentina
Nascimento: 22/10/1970 (53 anos)
Nacionalidade: Argentina