As crianças e os seus dentes. Escovas, pastas, rotinas

Há aspetos a ter em consideração, procedimentos a fazer, cuidados a não esquecer

A higiene oral dos mais pequenos exige atenção desde o nascimento. Tem a sua arte e os seus cuidados. Limpezas, consultas, práticas. Não é apenas uma questão estética da imagem, é sobretudo funcional do mastigar e fonética do falar. E com isso não se brinca.

É uma responsabilidade, uma enorme responsabilidade, entre tantas tarefas diárias. Cuidar dos dentes dos bebés e das crianças exige muita atenção e bastante cuidado. De todos os lados. Não se pode facilitar nesta questão porque os dentes não são um pormenor na vida de miúdos e graúdos. Desde cedo, muito cedo. Até porque os dentes de leite formam-se ainda na barriga da mãe e rompem as gengivas antes do primeiro ano de vida.

Comecemos pelo princípio, portanto. “Todos os dentes temporários estão formados ao nascimento. O normal é o bebé ter 20 dentes de leite que geralmente nascem a partir dos seis meses de idade”, explica João Espírito Santo, dentista, especialista em cirurgia oral. Pode ser mais cedo, pode ser mais tarde, varia muito. Pode ser um processo simples, sem complicações, ou mais complexo que causa desconforto. Cada caso é um caso. “Os dentes de leite têm vários papéis importantes desde estéticos (autoestima), funcionais (mastigação), fonéticos, além do papel imediato têm um papel importante de manter o espaço para o dente permanente”, acrescenta o dentista da Medical Art Center no Porto.

Aos três anos, a criança deverá ter os 20 dentes de leite à mostra. Os permanentes começam a nascer por volta dos seis anos, aos 14, mais ano menos ano, a maioria desses dentes devem ter terminado a erupção. “A exceção são os dentes do siso, que tendem a surgir entre os 17 e os 21 anos de idade”, adianta Mariana Seabra, especialista em odontopediatria. Os adultos têm 32 dentes, em regra, incluindo os dentes do siso, caso os tenham.

Os dentes têm uma vertente estética e uma componente funcional. Tratar deles desde cedo é essencial. Mariana Seabra deixa um aviso importante. “Como o esmalte é fino, os dentes de leite têm maior probabilidade de serem afetados por cáries e erosão se forem expostos a muito açúcar ou bebidas ácidas.”

A higiene oral tem de começar logo que os dentes nasçam. Não há outra forma. A escova e a quantidade de pasta merecem atenção, assim como a frequência da lavagem. Escova macia, escovagem regular como rotina matinal e noturna, pasta com flúor. “O importante será a quantidade de pasta que é colocada na escova. Inicialmente o equivalente a um bago de arroz, depois dos três anos uma quantidade do tamanho de uma ervilha ou equivalente à unha do dedo mindinho da criança”, indica João Espírito Santo.

“Uma escova de dentes manual usada corretamente é tão eficaz quanto uma escova elétrica”, reconhece Mariana Seabra, odontopediatra no Medical Art Center no Porto

À medida que a criança cresce, incentiva-se a sua própria escovagem. De qualquer forma, até aos sete anos, é essencial supervisionar a limpeza dos dentes. E mais um dado. “Uma escova de dentes manual usada corretamente é tão eficaz quanto uma escova elétrica”, garante Mariana Seabra, que também está na Medical Art Center no Porto.

Cáries, infeções, extrações

A primeira consulta num odontopediatra, médico especialista no atendimento a bebés, crianças, adolescentes, deve acontecer antes dos 12 meses, logo que os primeiros dentes rompam a gengiva. Depois, é necessário colocar na agenda consultas ao dentista de forma regular. Até aos 18 anos, o intervalo entre consultas deve ser anual. Não menos do que isso.

Há aspetos a ter em consideração, procedimentos a fazer, cuidados a não esquecer. Mariana Seabra avança com vários: “Nunca deixe o seu bebé ou criança com biberão/copo na boca por longos períodos de tempo. Nunca mergulhe a chupeta em bebidas doces e não ‘limpe’ as chupetas dos seus bebés colocando-as na própria boca”. “Evite a ingestão, antes de ir para a cama, de leite e de alimentos líquidos açucarados”, sublinha. E quando o bebé tiver idade suficiente para beber qualquer outra coisa que não leite, a melhor bebida é água.

João Espírito Santo acrescenta mais conselhos. Depois de um ano de idade, não comer ou beber, exceto água, antes de ir para a cama. “Não coloque outras bebidas além do leite no biberão do seu bebé, nem adicione qualquer coisa, como açúcar ou mel.” Incentivar a escovar os dentes pelo menos duas vezes ao dia quando tiverem idade para isso. “Os dentes devem ser escovados antes de ir para a cama, para que a última coisa na boca seja pasta de dentes com flúor”, afirma.

A higiene oral dá trabalho. A preguiça de lavar os dentes todos os dias, várias vezes ao dia, durante toda a vida. O que está dentro da boca não ocupa espaço nas preocupações do dia a dia. Mas devia. E atenção, muita atenção. “A cárie dentária ainda é uma das doenças mais prevalentes em crianças”, revela João Espírito Santo. A cárie, ao contrário do que se possa pensar, diagnostica-se muito antes do dente surgir com uma cavidade. “Muitas vezes, é possível reverter lesões de cárie de mancha branca através de medidas conservadoras”, avança o especialista em cirurgia oral.

“Os dentes devem ser escovados antes de ir para a cama, para que a última coisa na boca seja pasta de dentes com flúor”, explica João Espírito Santo, dentista, especialista em cirurgia oral

Uma cárie é tramada. São as dores, é o mal-estar, o inchaço, por vezes. É tudo o que advém daí. Não conseguir comer, não conseguir sossegar. Mariana Seabra é clara neste ponto. “Se não for tratada, a cárie pode ocasionar dor e infeção, o que pode prejudicar a alimentação, reduzindo a ingestão de alimentos, causar irritabilidade e distúrbios do sono.” A fase aguda da infeção não é para brincadeiras. Por isso, tudo fazer para que os dentes não cheguem a esse estado. “Os cuidados preventivos devem incluir aconselhamento sobre o uso de pasta dentífrica com flúor, aconselhamento dietético adequado, aplicação de selantes de fissuras e instruções de higiene oral”, especifica a odontopediatra.

Tirar dentes não é bom, sobretudo dentes permanentes, não restauráveis. As desvantagens ficam à vista. “A extração prematura de molares decíduos pode resultar na perda de espaço para a erupção dos dentes permanentes”, diz João Espírito Santo. E mais. “A perda precoce dos dentes incisivos também pode afetar negativamente a aparência da criança e diminuir a sua autoestima”, repara Mariana Seabra. Daí a importância de consultas preventivas, em vez de curativas, e o acompanhamento regular da higiene dos mais pequenos. Por isso, os cuidados desde cedo, muito cedo, para que os dentes durem uma vida.