Sarah Ferguson: “O Mundo continua a amar a princesa Diana”

Numa viagem ao nosso país para promover o novo romance, a duquesa de York passou por Melides e visitou uma das filhas, Eugenie, que está no Alentejo a apoiar o marido na construção de um empreendimento. Conversa com a antiga “princesa rebelde” de Inglaterra, hoje patrocinadora de causas humanitárias, que desarma qualquer um com o desassombramento de uma comum mortal.

A longa escadaria do palácio do século XIX que conduz a uma sala decorada com mobília da realeza é digna de uma princesa, ou melhor, de uma ex-princesa, e percebe-se a escolha da “entourage” de Sarah Ferguson, que alojou a duquesa de York nesta unidade hoteleira de cinco estrelas, a cinco minutos a pé do rio Tejo, em Lisboa. Mas as semelhanças com a monarquia tradicional, rígida, austera e conservadora acabam aí. A ex-mulher de André, duque de York, surge bem-disposta, descontraída, com umas sapatilhas rasas e práticas, para uma conversa a propósito do lançamento do novo livro, “Onde me leva o coração”, um best-seller do jornal “The Sunday Times”. O calor que se faz sentir na sala leva-a a sugerir um local mais fresco para a conversa com a nossa reportagem. A duquesa toma a iniciativa de levar as cadeiras e a pequena mesa para outro sítio: “Tu pegas numa, eu pego noutra, ‘let’s go!’”, diz.

Gelo quebrado, faltava ainda um pormenor de desassombramento que a marcara nos últimos 40 anos (ver caixa) e que pode ter dado algumas dores de cabeça à rainha Isabel II de Inglaterra: para garantir que a entrevista fica gravada sem falhas, aquela que foi, em tempos, a melhor amiga e confidente da princesa Diana de Gales, pede para pousar o telemóvel que vai captar o som no seu colo. A partir daqui o desafio será não só fazer as perguntas que interessam aos leitores mas, também, perceber se o aparelho está a gravar sem tornar uma antiga princesa desconfortável…

Além do livro, que, no nome original, se chama “Her heart for a compass”, um romance histórico editado em Portugal pela Penguin Random House, Sarah Ferguson veio também ao nosso país para passar alguns dias com a filha mais nova, Eugenie, 32 anos, com o neto, August, de um ano e meio, e com o genro, o empresário Jack Brooksbank, 36 anos, que está em Melides, no litoral alentejano, a trabalhar num novo projeto imobiliário.

A conversa começa exatamente pelas saudades da filha, irmã de Beatrice, 33 anos, que se divide entre Portugal e o Reino Unido. “Tenho sempre muitas saudades dela e, quando isso acontece, limito-me a vir cá”, diz, com um sorriso no rosto. “Amo Portugal, que é muito importante para mim, porque as pessoas são tão gentis…”, acrescenta a duquesa de York, que volta a referir-se à filha mais nova. “Não é engraçado pensar que, quanto mais eles envelhecem, mais querem estar contigo? Adoro isso! Sei que a Eugenie está muito feliz cá”, garante.


As palavras elogiosas seguintes vão para os genros, Jack Brooksbank e Edoardo Mapelli Mozzi, 38 anos, marido de Beatrice. “Tenho os mais maravilhosos genros e são tão engraçados… e muito bem-parecidos.” Jack, por estes dias, é aquele que esteve mais próximo. “Ele trabalha em Melides, neste momento, e normalmente vive aqui. Em relação aos meus netos encantadores, o August tem 18 meses e a Sienna oito. E tenho duas filhas lindas, esta é uma família maravilhosa. É importante que os meninos tenham um bom pai e eles são bons homens e uns bons pais. Gosto de manter a família unida.” Quanto aos netos, Sarah Ferguson explica que as suas atenções têm de ir mais além do que o cuidado que tem com os menores. “A minha energia não é suficiente para eles. A minha energia é para ser a avó do mundo e ver o que consigo fazer para ajudar o Planeta. As minhas filhas deram-me para os filhos do mundo”, adianta.

A faceta filantropa
“Fergie”, como é conhecida em todo o Mundo, refere-se às inúmeras causas sociais que abraça em simultâneo. “A minha avó sempre me disse que ‘quando te sentires mal contigo própria tens de dar alguma coisa aos outros’. Então, em 1991, fui à Polónia e havia lá problemas em matérias como a saúde e as crianças estavam a sofrer, porque não tinham medicamentos”, recorda, sem esconder a emoção. “Decidi começar com a minha Fundação para ser a voz de suspiros quase silenciosos e estou a fazê-lo desde então, nomeadamente na educação, a angariar fundos para construir escolas ou melhorar outras.” Um projeto ambicioso que se vai estender a Portugal nos próximos meses. “Uma das iniciativas que estou a fazer em Portugal é dar uma percentagem das receitas do meu novo romance a um sítio que ainda vou encontrar. Estou a pensar em procurar uma escola ou um local em dificuldades para podermos reabilitar e fazer uma biblioteca, ter bons instrumentos, para que as crianças, quando chegam lá, possam sentir o abraço de serem ouvidas. E tenho a certeza que a ‘Lady Margareth’, do meu novo livro, adoraria fazê-lo.”

Com a guerra na Ucrânia, Sarah Ferguson admite que o seu trabalho humanitário “pode ser mais importante e visível agora”. “Está toda a gente focada na Ucrânia, e muito bem, mas há dois meses estive na Albânia com os refugiados. E uma das coisas que quero fazer é construir um projeto chamado ‘plan in a box’: se fores uma criança refugiada sabes que podes ir ali, é um local com uma tenda e um sítio com um espaço de leitura e brinquedos, é uma área fantástica.”

A forte relação com Diana
Por sugestão da assessoria da duquesa de York só assuntos como Harry e Meghan, duques de Sussex, e o ex-marido André foram “desaconselhados” na entrevista a Sarah Ferguson. Os motivos são simples: os primeiros deixaram de ser membros seniores da família real britânica desde que foram viver para a Califórnia, nos Estados Unidos – onde chegaram a acusar um membro da família de racismo devido ao tom de pele do filho, Archie -, e André não se livra do escândalo depois de ter sido acusado de abuso sexual quando a alegada vítima, hoje com 38 anos, era menor. O caso terá acontecido numa das casas dos “predadores sexuais” Jeffrey Epstein e Ghislaine Maxwell.

Relativamente à amizade com Diana de Gales e Isabel II, a duquesa falou com prazer e muito saudosismo. “Eu e a Diana… éramos as melhores amigas, imagine, desde os nossos 14 anos. Desde crianças, sabia? Amava-a e amo-a. Havia tempos em que ela amava tanto as pessoas, que não se amava o suficiente. Ela nunca acreditaria como tanta gente sente, ainda hoje, a falta dela”, assegura Sarah Ferguson. “O Mundo continua a amar a princesa Diana”. As saudades da princesa são muitas, mas a duquesa de York garante que a memória da melhor amiga está bem guardada. “Não sinto falta dela, porque ela está sempre comigo.”

Quanto à rainha Isabel II, de quem foi nora, a duquesa tem as palavras mais elogiosas… e institucionais: “O recente Jubileu foi uma hipótese para as pessoas celebrarem a rainha. Ela é o maior ícone que conheci em toda a minha vida”. E exemplifica: “Ela é tão humilde, gentil e comprometida com o seu dever. Ela nunca pára, nunca desiste e somos muito felizes por a ter connosco”.

As semelhanças entre a ficção e a realidade
Finalmente, o livro. Alvo de críticas elogiosas, “Onde me leva o coração” conta a história de “Lady Margareth”, que, em 1865, decide escapar dos grilhões que a fazem ser uma mulher aprisionada numa sociedade habituada à submissão do sexo feminino. “Margareth” acaba por fugir de um casamento forçado e é afastada do luxo e do conforto da vida na alta sociedade. Viaja para a Irlanda e para os Estados Unidos e, quando regressa a Inglaterra, procura o amor e a liberdade que sempre sentiu merecer. “O livro? Bem, acho que questionamos quem está a escrever o livro da nossa vida e se temos de nos conformar de alguma maneira. Se tivermos a gentileza, as boas intenções e boa integridade, certamente podemos viver a nossa vida sem estarmos agrilhoados”, considera. “Portanto, o livro é sobre uma ruiva que está a tentar conformar-se com um casamento ali perto de 1870, até, subitamente, querer ser livre e seguir o seu coração.”

Ironicamente, Sarah Ferguson tem um caminho com algumas semelhanças. “Segui, de alguma forma, esse caminho, sou da Escócia e da Irlanda e viajei para os Estados Unidos, onde escrevi livros para crianças e fiz o meu trabalho filantrópico. Mais tarde regressei a Inglaterra”, desfia. “Este livro é ficção, é sobre os meus antepassados que são ruivos e a razão por que encontrei a ‘Lady Margareth’ foi que escreveram tanto sobre os seus irmãos, mas nada sobre ela. Ela é tão forte e uma mulher tão corajosa.” Na trama, a personagem principal segue o coração, assim como a antiga princesa. “Sempre segui o meu coração. Mas muitas pessoas disseram: ‘és uma mulher tão inteligente, porque cometeste esse erro tão ridículo?’ ou ‘foste pela estrada errada’. Perguntei: ‘como é que vocês sabem que fui pela estrada errada se nunca tentaram?’ Sempre me dei bem e, mais importante, ainda estou aqui, não estou?”. Há 15 anos a autora decidiu que queria escrever um romance e já vai no terceiro livro pensado. “O próximo vai ser lançado a 28 de fevereiro. Está escrito”, revela. Para já, “Onde me leva o coração” foi best-seller do “The Sunday Times”. “Não estava nada à espera, sou confiante, mas não esperava”, confessa, à despedida.


O romance é dedicado às duas filhas, Beatrice e Eugenie, que, pode ler-se numa nota, “têm toda a força e coragem da ‘Lady Margareth’ e muito mais, e que não esperaram até aos 61 anos para seguirem os seus corações e viverem à sua maneira”. Mesa e cadeiras colocadas no lugar, conversa gravada no colo da duquesa de York, Sarah Ferguson volta a mostrar que é genuína ao distribuir lápis de Windsor – com direito a coroa real em cima – e dedicatórias. O nome mais difícil de pronunciar é mesmo “Gerardo” (Santos, o repórter fotográfico). Damos uma dica. “É como o ator Gerard Butler”. Sarah Ferguson não perde pela demora: “Ah, o escocês, já podiam ter dito!”.

Uma “princesa rebelde”

Se Diana de Gales foi “a princesa do povo”, Sara Ferguson, a amiga de todas as horas – com altos e baixos, escreve a imprensa britânica -, foi a “princesa rebelde”. Duquesa de York, ex-nora de Isabel II, rainha de Inglaterra, autora de memórias e livros infantis, parceira da Children in Crisis – organização sem fins lucrativos que visa melhorar a vida de crianças e mulheres de origens desfavorecidas -, vive em Windsor com os seus nove cães Norfolk terrier. A vida mantém-se agitada com as diversas causas sociais que abraça, mas muito longe dos loucos anos 1980 e 1990. “Fergie” casou-se com o príncipe André, terceiro filho da rainha Isabel II e do príncipe Filipe, duque de Edimburgo, a 23 de julho de 1986, na Abadia de Westminster, em Londres. Do casamento resultaram duas filhas, Beatrice e Eugenie. Sarah Ferguson começou a sofrer depois das gravidezes e o aumento de peso valeu-lhe severas críticas dos tabloides britânicos. Em agosto de 1992 o casamento acabou, depois de terem sido publicadas fotografias de “Fergie” em “topless” ao lado de John Bryan, um financeiro americano. O caso valeu-lhe o estatuto de “princesa rebelde”. Quatro anos depois da separação, divorciaram-se oficialmente e Sarah perdeu o estatuto de Sua Alteza Real, embora continue a pertencer à família real e a participar em algumas cerimónias oficiais. Em junho, a duquesa de York assistiu, pela televisão, às celebrações dos 70 anos de reinado da rainha Isabel II e não conteve a emoção ao ver as duas filhas no pequeno ecrã: “Estava a ver a televisão e disse para mim: ‘Muito bem, meninas, estão a sorrir’. Lá estavam a Beatrice, de azul, e a Eugenie, de laranja. Lindas”, resumiu, citada pela imprensa britânica, sem esconder a alegria: “Fiquei tão entusiasmada que, ao vê-las, gritei mesmo para a televisão”.