Como integrar um animal na família

Em primeiro lugar, é necessário que todos estejam preparados e disponíveis para receber um animal de estimação

Não há fórmulas perfeitas. Cada bicho é um bicho. A idade, a raça e o tamanho importam. Respeitar a natureza, estabelecer limites ou ter paciência são regras a ter em conta.

As cadelas estão em maioria lá em casa e as adaptações foram acontecendo de forma natural. Sem sobressaltos, com alegrias pelo meio. Há quase oito anos, Tiago Careto, ator e bailarino, ficou com Mukas, filha de uma cadela de raça Jack Russell de uma grande amiga. Três anos e meio depois, Mukas foi mãe e o ator ficou com mais uma cadela, Nuba, agora com quatro anos. “Em 2016, o Bernardo entrou na minha vida e, com ele, veio a Ziva, uma cadela de raça Beagle que hoje tem cinco anos.” Mukas adotou Ziva como filha, Nuba viu em Ziva uma irmã mais velha, e a integração correu às mil maravilhas.

As cadelas dão sinal quando querem ir à rua, logo que todos acordam. “Muitas vezes, chegamos a ir de pijama e com remelas nos olhos, mas faz parte. Basicamente, são elas que mandam cá em casa”, diz Tiago Careto. Depois da rua, a primeira refeição do dia, sempre que possível uma ida ao parque ou à praia para estimular a interação com outros cães. Higiene diária, cuidados veterinários, banhos, muita água disponível, fazem parte das rotinas. E três camas espalhadas pela casa: uma no quarto com colchão de berço com capa protetora e mil mantas e almofadas com fronhas, outra na sala que é um almofadão com cobertores, mais uma no escritório, e ainda o sofá à disposição.

Quando Bernardo (à direita) entrou na vida de Tiago, também foi necessário integrar os animais de estimação. “Correu às mil maravilhas”, diz Tiago. (Foto: DR)

“Para nós, os animais são membros da família. Elas todos os dias dão-nos tudo, todo o amor, todo o carinho, são companheiras para a vida toda. A felicidade com que nos recebem quando chegamos a casa é revitalizante, elas têm capacidade de nos fazer esquecer qualquer tipo de problema que possa ter acontecido ao longo do dia”, garante. “No fundo, são as nossas filhas, iremos tratar e cuidar delas até ao último dia. São elas que nos ensinam todos os dias que o amor é mesmo o mais importante.”

Joana Almeida, que trabalha na área de seguros, Samir e os dois filhos (Mateus, com quase dois anos, e Maria, com quatro meses) vivem num apartamento no Restelo com três cães e uma gata. Os animais chegaram primeiro do que os bebés, acompanharam as gravidezes de Joana e antes da chegada dos recém-nascidos cheiraram roupas e fraldas. A família foi aumentando e a adaptação entre humanos e animais foi tranquila. Hoje, o pequeno Mateus já passeia a cadela mais velha pela trela.

“É super tranquilo, não complicamos e não criamos obstáculos, tanto às crianças como aos animais”, adianta Joana Almeida. “É tudo mais fácil se descomplicarmos. Cada um está à sua maneira, dentro de certos limites, e não criamos barreiras.” É importante não ter um cão instável numa casa com crianças, mas “tudo se treina.”

Antes da vida de casal, Joana Almeida teve uma experiência de não-adaptação entre dois cães. Uma cadela buldogue inglesa “muito possessiva” que fazia a vida negra a um boxer. “Não dava, tive de separá-los e arranjar uma solução para a cadela”, recorda. Conseguiu uma nova família para a buldogue depois de um casting rigoroso.

Joana Dias da Silva, estudante de Biologia, e família (pai, mãe, irmã e irmão) têm dois cães, duas gatas e um dragão barbudo. A gata Chica foi o primeiro animal a chegar e não dá muita conversa aos restantes animais de casa. O cão Occy foi adotado depois de ter sido abandonado e, ao início, a integração foi complexa. Occy não queria ficar sozinho. “Para qualquer animal é preciso paciência e estar bem informado sobre a alimentação. Se não estamos habituados não sabemos o que come. Depois, depende se é ou não adotado, se sofreu traumas.”

Joana Dias da Silva (ao centro) com a família e quatro dos seus cinco animais. “É diferente chegar a casa e ter aquela energia deles que passa para nós”. (Foto: Rui Oliveira/Global Imagens)

Os animais são bem-vindos, são família na casa de Joana, mas é preciso atenção aos conflitos entre animais. Quando Occy chegou, havia um outro cão na família, que já morreu. “Foi um pouco difícil, dois machos, um adulto e outro na adolescência. Estávamos sempre atentos, para não se pegarem, para se habituarem à presença um do outro. De uma fase de luta passaram para uma fase em que se ignoravam.”

Depois disso, Occy teve treino especializado para não estranhar mais uma companhia que entretanto chegou chamada Kira, uma dogue de Bordéus. A gata Chiba não é esquisita e dorme em cima do terrário do dragão, que é fêmea e chama-se Sachimi. Animais são sinónimo de alegria, companhia, amor. “É diferente chegar a casa e ter aquela energia deles que passa para nós. A nossa disposição muda com a deles e a deles muda com a nossa.”

Cláudia Pinto e a filha de seis anos têm seis cães, dois coelhos, um ganso, uma galinha, além de outros cães que vão adotando temporariamente como família de acolhimento. Cláudia, arquiteta, nasceu e cresceu num meio rural com a casa cheia de animais. As adaptações já fazem parte das rotinas. Quando os animais chegam, conta, “recebem uma terapia de mimo e ficam dentro de casa.” É uma questão de perceber personalidades e fazer com que tudo corra bem. Para isso, é fundamental transmitir confiança e segurança aos bichos. “Quanto mais atenção, melhor”, assegura. “Os animais dão calma, equilíbrio, transmitem uma grande serenidade. Os cães não são conflituosos, não são problemáticos.”

Na casa de Cláudia Pinto e da filha há espaço para seis cães, dois coelhos, um ganso e uma galinha. (Foto: Maria João Gala/Global Imagens)

Olhos, unhas, dentes, viagens

Integrar significa trabalho. Em primeiro lugar, é necessário que todos estejam preparados e disponíveis para receber um animal de estimação e o que isso implica em termos de espaço, tempo e dinheiro. É preciso também respeitar a natureza canina de um cão e a natureza felina de um gato. Aceitar que um cão ladra, baba-se, larga pelo, lambe caras, e que um gato gosta de sítios altos para controlar o que se passa, caça tudo o que se mexe, arranha várias superfícies, nem sempre quer mimo, ronrona.

“Tentar humanizá-los é contraproducente e pode até ser perigoso, mesmo que a intenção seja a melhor e surja como resultado do enorme amor que temos pelos animais”, realça Joana Pereira, médica veterinária do departamento de comunicação científica da Royal Canin Ibéria, empresa do setor de alimentação de animais domésticos. “Há necessidades diferentes, consoante as espécies, raças, estilos de vida e também sensibilidades diferentes. Esquemas adaptados e que façam sentido para cada animal, e para cada família, são sempre a opção mais correta e racional”, acrescenta.

Um veterinário por perto é aconselhável para a saúde e bem-estar do animal. “A questão de uma correta socialização também é essencial a uma vida plena e feliz, tanto em cães como em gatos. E depois há os cuidados de higiene diária, com o pelo, os dentes, os olhos, as unhas, as formas de os transportar em viagens”, sublinha a veterinária.

As primeiras experiências num novo lar são determinantes e têm impacto. Os animais devem participar ativamente no dia-a-dia da família e deve-se, desde o início, estabelecer limites e hierarquias. “No processo de integração é fundamental que o primeiro contacto com o novo espaço seja feito de forma tranquila e sem muito ruído. Se já existe outro animal de estimação em casa, há que apresentá-los pouco a pouco, sem forçar o contacto.

No caso dos cães, e uma vez que estes se podem tornar territoriais, é importante apresentá-los num lugar neutro, fora de casa”, diz Rodrigo Abreu, engenheiro zootécnico, responsável pelo canal profissional da Royal Canin Portugal, que está em permanente contacto com treinadores e criadores de animais. É uma espécie de conselheiro. “No caso de ter crianças em casa, é importante preparar o primeiro momento de encontro com o animal de estimação. Além disso, é fundamental que desde início se ensine às crianças a responsabilidade que implica cuidar de um animal de estimação.”

Educar um cão e um gato não é a mesma coisa. “O comportamento de um gato é diferente do de um cão, assim como a sua forma de comunicar. Os gatos, por exemplo, gostam mais de explorar. Independentemente do tipo de educação ou treino, a recompensa deverá ser sempre positiva, podendo ser feita através de alimentos ou com brinquedos”, adianta Rodrigo Abreu. Na verdade, todos os cuidados importam para um lar harmonioso com todo o género de animais de estimação.

Joana Almeida (à direita), Samir e os filhos Mateus e Maria vivem num apartamento no Restelo com três cães e uma gata. (Foto: Orlando Almeida/Global Imagens)

Dicas:

– Tratar da logística. Bebebouro, cama, comedouro, brinquedos, coleira, uma caixa transportadora ou cinto de segurança (no caso do cão), caixa de areia (para gatos).

– Facilitar a chegada. Reservar uma área tranquila da casa para os primeiros dias, para atenuar o stresse da mudança. Passar o máximo de tempo possível com os animais para uma melhor adaptação. Explorar a nova casa em conjunto.

– Mão firme. Estabelecer regras ajuda a que o animal se sinta mais seguro e menos ansioso.

– Evitar acidentes. Janelas e varandas com redes, tirar produtos perigosos, como detergentes tóxicos ou fios elétricos, do caminho dos animais-

– Reservar áreas. Estabelecer quatro zonas na casa: zona da comida, zona da caixa de areia o mais distante possível da área das refeições (para os gatos), zona de brincar onde não haja objetos frágeis, zona de descanso (a mais tranquila).

– Impor rotinas. Refeições três vezes por dia pelo menos até aos seis meses de idade, duas vezes por dia depois disso, respeitando horários e doses recomendadas. É importante travar a ânsia de comer de alguns animais.

– Cuidados veterinários. O quanto antes para o primeiro check-up. Uma vez por mês nos primeiros meses de vida, depois pelo menos uma vez por ano, e duas vezes na idade geriátrica. Colocar chip de identificação (nos cães), vacinar, desparasitar.

– Alimentação. Dieta específica para cada animal de modo a proporcionar os nutrientes vitais para um crescimento saudável. Idade, tamanho, raça, saúde, são fatores importantes nesta área.

– Horários fixos. No caso dos cães, sobretudo para passear e dormir-

– Exercício físico. Para os cães, pelo menos dois passeios por dia. Brincar com gatos que não saem de casa para evitar a tendência para a obesidade.